Desde o início da manhã desta segunda-feira (13), familiares do militar reformado José Wilson da Silva, 89 anos, são ouvidos pela equipe da 1ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Porto Alegre. O presidente da Associação dos Ex-Presos e Perseguidos Políticos do Rio Grande do Sul e ex-vereador da Capital foi morto com dois tiros na madrugada da última sexta-feira (10) dentro de casa, no bairro Partenon.
Os depoimentos de parentes, testemunhas e outras pessoas próximas são considerados essenciais para entender o que está por trás do assassinato do histórico militante de esquerda. Inicialmente, a Polícia Civil chegou a cogitar que ele pudesse ter sido vítima de latrocínio (roubo com morte), no entanto, nenhum objeto de valor foi subtraído de dentro da casa localizada na Rua Paissandu. A residência possui pelo menos dois altos portões de ferro visíveis do lado externo, e uma concertina que circunda todo o pátio.
Segundo a apuração realizada até o momento, os criminosos não chegaram a arrombar nenhum dos portões para ingressar na moradia. A forma como os criminosos conseguiram acesso à casa é um dos pontos que será esclarecido pela investigação. Na sala da moradia, Wilson foi atingido por dois disparos: um no abdômen e outro nas costas.
Depois do crime, os bandidos escaparam da casa, mas ainda não se sabe como fugiram, se estavam em algum veículo. A polícia afirma que o ex-militar tinha arma em casa, mas no momento em que foi morto estava somente com um facão na mão. Não há registro de ameaças contra a vítima.
Relatos
Por volta das 9h, duas filhas de Wilson chegaram à 1ª DHPP, que também fica no bairro Partenon. O depoimento de uma delas se estendeu até o início da tarde. Por volta das 13h30min, a outra começou a ser ouvida pela delegada Isadora Galian, que apura o caso. Ao longo das oitivas das duas, um terceiro filho – morador do Rio de Janeiro – também esteve na Polícia Civil.
A polícia pretende ouvir ainda a cuidadora, que residia com Wilson e que estava na casa no momento do crime. A mulher contou na sexta-feira que estava dormindo, quando ouviu barulhos na porta da moradia e que a vítima foi conferir o que estava acontecendo, levando um facão.
Na sequência, ela teria ouvido os dois disparos que atingiram o ex-exilado. A polícia diz que a mulher atualmente era companheira do idoso, embora familiares afirmem que ela era funcionária contratada porque ele precisava receber medicação e não podia mais morar sozinho.
— A informação que temos, e que estamos depurando, é de que ela era uma cuidadora da vítima, mas que a partir de certo momento passou a ter o relacionamento dele. Foi cuidadora e atualmente era companheira dele — afirma o delegado Eibert Moreira Neto, diretor da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHHP).
Um vigia da rua onde aconteceu o crime também chegou à delegacia no início da tarde para ser ouvido pelos policiais. Além dele, um chaveiro – que teria trocado as chaves da residência da vítima há poucas semanas – prestará depoimento. Sobre a motivação do crime, a polícia diz que todas as hipóteses ainda são apuradas.
A vítima
Wilson, que era militante ativo do Partido Comunista do Brasil (PC do B), deveria ter completado 90 anos nesta segunda-feira. A família pretendia realizar uma comemoração no próximo sábado para marcar a passagem das nove décadas. Em sua casa, no bairro Partenon, recebia visitas regulares de uma das filhas, que auxiliava o pai com os compromissos da Associação dos Ex-Presos e Perseguidos Políticos do RS.
Capitão reformado do Exército e, quando jovem, ganhou o apelido de Tenente Vermelho por suas tendências de esquerda. Era homem de confiança do ex-governador gaúcho Leonel Brizola e foi com ele para o exílio, no Uruguai. Se elegeu vereador em Porto Alegre, pelo PTB, em 1963. Em abril de 1964, após o golpe militar, teve seus direitos políticos cassados. Só voltou ao Brasil com a anistia aos presos políticos, em 1979.
Atualmente, era também presidente da Associação de Defesa dos Direitos e Pró-Anistia dos Atingidos por Atos Institucionais, e liderança reconhecida nacionalmente, sempre presente nas atividades em defesa da Anistia. O PCdoB emitiu nota onde lamenta a perda, e afirma que “o seu exemplo frutificará nas nossas lutas e vitórias contra toda forma de opressão e exploração.” A mesma manifestação diz que o partido cobrará das autoridades policiais e judiciárias o mais rápido esclarecimento do crime.
O corpo do ex-militar foi velado em Porto Alegre e sepultado no sábado (11) em Mostardas, no sul do Estado.