Em janeiro de 2021 o principal indicador de criminalidade da segurança pública revelou um aumento nos assassinatos na Serra e queda acentuada de homicídios em cidades da Região Metropolitana que sempre ocuparam o topo de ranking dos locais com mais mortes violentas no Estado. Bento Gonçalves, Caxias do Sul e Canela ficaram entre as 10 cidades gaúchas com mais assassinatos em janeiro, em posições que em igual período do ano anterior eram ocupadas por Alvorada, Viamão e Sapucaia do Sul, respectivamente. O primeiro lugar segue sendo da Capital.
Os três municípios da Serra começaram o ano com aumento expressivo dos homicídios: Bento Gonçalves saltou de zero para sete assassinatos, Canela, de zero para três e Caxias, de cinco para sete. Em todas elas, conforme a polícia, o crescimento está relacionado ao confronto entre organizações criminosas por disputas de pontos de tráfico de drogas.
Na Região Metropolitana, o cenário inverteu. As seis cidades da Grande Porto Alegre que ocupavam as principais posições entre as 10 com mais homicídios em janeiro de 2020 tiveram redução nos assassinatos no primeiro mês de 2021: Alvorada (- 40%), Viamão (-37,5%), Gravataí (-62,5%), Canoas (-66,7%), São Leopoldo (-71,4%) e Sapucaia do Sul, que teve seis mortes em janeiro do ano passado e zerou no mesmo período de 2021.
Ouvidas por GZH, Polícia Civil e Brigada Militar não acreditam que houve uma migração do crime da Região Metropolitana para a Serra, no entanto admitem que grupos criminosos que surgiram na Grande Porto Alegre estão expandindo seus negócios para cidades da Serra, como Caxias do Sul _ segunda maior do RS em números de habitantes. Trata-se de uma interiorização que não é recente, mas que agora também reflete na taxa de homicídios fora do eixo metropolitano.
— É uma região com indústria forte, economia forte, muito dinheiro circulando, maior público flutuante, poder aquisitivo e isso é palco de atração para a venda de entorpecentes. Caxias é um território promissor e fértil de venda de drogas e já vem sendo palco de muita disputa. Atualmente, a cidade tem dois grupos criminosos, um terceiro tentando entrar e um quarto tentando ligação com um dos grupos que já está lá, o que gera o conflito. Um tenta derrubar o outro — afirma o subcomandante-geral da Brigada Militar, coronel Vanius Cesar Santarosa.
O coronel afirma que em Caxias do Sul a BM tem usado a mesma fórmula para conter a violência que aplica na Região Metropolitana _ ações com inteligência, captura de integrantes de grupos criminosos e ações com auxílio dos batalhões de choque e aviação – mas ainda assim tem encontrado dificuldade em reduzir os homicídios:
— Isso tem dado resultado na grande maioria das cidades, mas em Caxias não estamos conseguindo um ponto de equilíbrio para reduzir. Ainda não conseguimos achar a fórmula exata de Caxias.
O delegado regional substituto de Caxias do Sul, Vitor Carnaúba, aponta que quatro dos sete assassinatos registrados em Bento Gonçalves em janeiro de 2021 têm vinculação com facções e o tráfico de drogas. Quatro homens foram mortos em uma única ocorrência, na noite de 6 de janeiro quando criminosos invadiram uma residência no bairro Municipal. A execução contou com três tipos de arma de fogo e a polícia tem suspeitos identificados.
— Todos os quatro mortos tinham uma ficha longa de antecedentes e três deles eram da Região Metropolitana, mas estavam morando em Bento. Não é rotina isso acontecer na cidade. Bento sempre foi um corredor de passagem e teve grandes apreensões de droga. Há um elo com a Grande Porto Alegre — avalia o policial.
Em Canela, os três assassinatos de janeiro também estão vinculados à guerra de facções de grupos criminosos que têm base fora da Serra.
Seis cidades da Grande Porto Alegre com queda nas mortes
Principal cidade da Região Metropolitana depois de Porto Alegre – e terceira maior população do RS – Canoas registrou dois homicídios em janeiro, frente a seis em igual período de 2020, queda de 66,7%. A redução confirma uma tendência de baixa registrada desde 2019 na cidade. À frente da regional de Canoas, delegado Mario Souza acredita que os números são resultado da prioridade de operações especiais com investigações mais longas, focadas em desestruturar o crime organizado, e a integração efetiva entre as polícias:
A Serra é região com indústria forte, economia forte, muito dinheiro circulando, maior público flutuante, poder aquisitivo e isso é palco de atração para a venda de entorpecentes. Caxias é um território promissor e fértil de venda de drogas e já vem sendo palco de muita disputa.
CORONEL VANIUS CESAR SANTAROSA
Subcomandante-geral da Brigada Militar
— A Polícia Civil trabalha de porta aberta para BM, IGP (Instituto-Geral de Perícias) e guardas municipais. Isso possibilita uma troca veloz de informação, sem carimbo de ofício, burocracia, com todas as forças de segurança se falando em um fluxo que passa a ser muito rápido. A prisão do dia a dia é importante, mas a pressão da lei em operações é importante, mostrando que não haverá impunidade. O tráfico de drogas se comunica muito com homicídio, temos feito combate para sufocar o tráfico em Canoas. Se o traficante não tiver sufocado, faz cobrança mais enérgica entre eles e tem mais tranquilidade e estrutura para cometer assassinatos.
Desde setembro do ano passado, as seis delegacias de homicídio da Grande Porto Alegre – instaladas em Gravataí, Novo Hamburgo, São Leopoldo, Viamão, Alvorada e Canoas – passaram a integrar a Divisão de Homicídio da Região Metropolitana. No comando do departamento, o delegado Cassiano Cabral afirma que a mudança possibilitou mais integração e agilidade na troca de informações entre as DHPPs.
A unificação das delegacias especializadas em crimes de homicídio tem, segundo Cabral, qualificado a investigação preliminar, com equipe de local de crime que atende toda a região, elaborando relatórios que são distribuídos entre as delegacias, e centralização os núcleos de inteligência.
As organizações criminosas não respeitam fronteiras e limites territoriais, atuam em todo Estado e a polícia tem de atuar da mesma forma, ampliando nossa visão e compreendendo as alianças e novas formações, e como se agrupam.
CASSIANO CABRAL
Diretor da Divisão de Homicídio da Região Metropolitana
— As organizações criminosas não respeitam fronteiras e limites territoriais, atuam em todo o Estado e a polícia tem de atuar da mesma forma, ampliando nossa visão e compreendendo as alianças e novas formações, como se agrupam. As informações estão fluindo mais, ao mesmo tempo trabalhamos muito com as inteligências das outras vinculadas, da BM e da Susepe.
O acesso às prisões, onde está recolhida a maior parte dos líderes de organizações criminosas, é uma peça importante para a interlocução das ações da polícia.
— Isso tem aumentado o número de prisões. Cerca de 90% dos líderes estão presos e de lá continuando mandando, determinando mudança de comando fora da cadeia. O que ocorre dentro do presídio repercute fora — salienta Cabral.
Mesmo com quedas de 40% e 37,5% dos assassinados em janeiro de 2021, Alvorada e Viamão ainda são, na avaliação de Cabral, as cidades mais sensíveis da Região Metropolitana e que demandam mais atenção devido ao histórico de altas taxas de homicídios e às condições socioeconômicas. Nelas, há maior efetivo nas delegacias e operações mais constantes.