É com tranquilidade que Aldrin Barcella Romagna, o Vadio, telefona de sua cela na Penitenciária Modulada de Charqueadas. O criminoso pede satisfação sobre negócios do tráfico, cobra obediência de seus subordinados e ainda interfere em questões do cotidiano do complexo residencial Umbu II, em Alvorada, formado por 900 apartamentos.
Em uma das conversas gravadas, Aldrin faz contato com um parceiro em meio a uma reunião de condomínio. Questiona se algum subordinado está armado no local e manda que o armamento seja guardado. O criminoso que mantinha a arma à vista dos moradores justifica ter agido assim porque não o estavam levando a sério.
Ouça o diálogo:
Em outro diálogo, ele cobra conduta forte, inclusive com uso de violência, por parte de um comparsa. Explica ao subordinado que pode agir sem consultá-lo, afinal, "são uma facção, uma família", e que depois é só explicar:
— Dei umas facada nele, dei tiro, arranquei um dente porque ele falou isso, isso e isso.
Ouça o diálogo:
As conversas captadas por meio da interceptação de 125 linhas de suspeitos revelaram a dinâmica do grupo, que atua não só no tráfico de drogas, mas em assaltos, roubos de veículos e, principalmente, obtém lucro com a venda de apartamentos dos quais famílias pobres são expulsas. A quadrilha foi alvo de operação, nesta quarta-feira (16), que reuniu 850 policiais para o cumprimento de 279 ordens judiciais.
Há diversos diálogos com negociações de imóveis por valores entre R$ 4 mil e R$ 6 mil — os apartamentos tomados pelo crime custam oficialmente, segundo a polícia, em torno de R$ 80 mil. O dinheiro obtido no ramo imobiliários serve para reabastecer a quadrilha com a compra de armamento e entorpecentes. Esses locais também são usados para esconder drogas e armas e para dar guarida a pessoas ligadas à facção.
Ouça os diálogos:
A investigação identificou que o grupo atua com núcleos separados por áreas. Há a liderança, o segundo escalão e núcleo financeiro — no qual atuam a mulher de Aldrin e outros familiares —, os responsáveis pelo controle de cinco pontos de tráfico, os que trabalham na telentrega da droga, os olheiros que fazem campanas (observam, especialmente, a movimentação da polícia), os que emprestam contas para o dinheiro ser lavado, os que fazem a coação a desafetos ou a quem não queira obedecer as regras, e os que atuam em assaltos e executando homicídios.
Um dos assassinatos atribuídos ao grupo é o de uma moradora do Umbu II que contraiu dívidas por ser usuária de drogas. Como recado a mau pagadores, além de ser morta, ela teve o corpo queimado ao lado do residencial. O apartamento dela foi vendido pelos criminosos.
Outro diálogo mostra que um motorista particular liga para um criminoso para pedir permissão para transportar para fora do complexo um morador que havia sido surrado por membros da facção.
A polícia identificou que roubos atribuídos ao grupo não são feitos só em Alvorada, mas também zona norte de Porto Alegre, principalmente nos bairros Rubem Berta e Sarandi, e nos municípios de Gravataí e Viamão.
Contraponto
A advogada que defende Aldrin, Tatiana Vizzotto Borsa, afirmou que não pode se manifestar porque não teve acesso à investigação.