A Justiça aceitou a denúncia por homicídio sobre a mulher suspeita de aplicar silicone industrial em uma jovem em Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo. A vítima, a transexual Melani Aguiar, 20 anos, morreu no fim de agosto, após complicações decorrentes do efeito do produto de uso proibido no corpo humano. Com isso, Marcella de Sales, moradora de Caxias do Sul, na Serra, vira ré.
Segundo a denúncia apresentada pela Promotoria no fim do mês de outubro, Marcella teria viajado até o Vale do Rio Pardo para fazer a aplicação em Melani. A jovem morreu quatro dias depois, em 31 de agosto, após ficar hospitalizada. A investigação da Polícia Civil revelou um esquema para aplicação de silicone industrial em mulheres em diversos municípios do Rio Grande do Sul. Quando ouvida durante a investigação, Marcella confessou que foi a responsável por aplicar o produto na vítima. Como se trata de ré primária e colaborou com a apuração, a polícia não solicitou sua prisão. GZH tenta contato com a defesa da denunciada.
Para o promotor de Justiça Flávio Eduardo de Lima Passos, a denunciada assumiu o risco de matar a vítima ao realizar o procedimento que produziu as lesões. Ela não foi denunciada por exercício ilegal da medicina, crime pelo qual havia sido indiciada pela Polícia Civil.
A apuração da polícia descobriu que Melani viajou de Santa Maria, na Região Central, onde vivia com a família para fazer a aplicação em Santa Cruz do Sul. Em 27 de agosto, foi hospitalizada após passar mal durante aplicação de silicone industrial — de uso proibido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no corpo humano por conta dos riscos. Este produto, usado, por exemplo, na área mecânica e em construções, quando aplicado no corpo pode causar lesões e até o óbito. Foi o que aconteceu com a jovem.
Melani teve uma síndrome séptica, que é a disfunção de múltiplos órgãos. O silicone, como é líquido, acabou se espalhando por todo o corpo dela. No telefone da jovem, os agentes encontraram imagens do silicone industrial adquirido pela internet e entregue em Caxias do Sul. Com mandado de busca, os policiais seguiram para a casa da, na época, investigada de Caxias do Sul, onde encontraram seringas e agulhas usadas para aplicação.
Em depoimento à polícia, a mulher admitiu ter realizado o procedimento. Contou que no mês de agosto teria viajado a Santa Cruz do Sul para fazer a aplicação em outra pessoa. Foi quando ela e Melani se encontraram e combinaram que a colocação do silicone industrial aconteceria dias depois. A jovem já havia feito procedimento anterior com a mesma mulher, segundo a polícia, e queria fazer uma nova nos glúteos. O valor acertado entre as duas foi de R$ 2 mil.
Provas
Melani pagou pelo procedimento, realizado no quarto de uma casa onde ela costumava se hospedar em Santa Cruz do Sul. No celular da vítima, os policiais ainda encontraram fotografias tiradas durante a aplicação, por volta de 20h30min do dia 27 de agosto. No celular da investigada, a polícia encontrou imagens da aplicação realizada em Melani. Quando a vítima passou mal, a responsável pelo procedimento abandonou o local e retornou para a Serra — ela confessou isso também em depoimento.
A proprietária da residência foi quem chamou o socorro e informou a família da vítima. Quando ouvida pela polícia, ela disse que sabia do procedimento, mas que não teve envolvimento na negociação e que não concordava com a aplicação. Melani foi hospitalizada e permaneceu internada até o dia 31 de agosto, quando faleceu.
Entenda
O produto
A Anvisa proíbe o uso de silicone industrial em procedimentos estéticos. O produto tem como finalidade a limpeza de carros e peças de avião, impermeabilização de azulejos, vedação de vidros, entre outras utilidades, e não deve ser utilizado no corpo. O produto não é esterilizado e nem preparado para o uso humano.
Os riscos
Quando aplicado no corpo, pode causar lesões gravíssimas na vítima, e até a morte. Algumas lesões podem não acontecer na hora, mas anos depois. Esses procedimentos, em geral, são realizados sem nenhuma higiene ou exame prévio. O produto é injetado diretamente no corpo com agulhas e seringas.
É crime
A Anvisa alerta que a aplicação ilegal do silicone industrial no corpo humano é considerada crime contra a saúde pública previsto no Código Penal - exercício ilegal da medicina, curandeirismo e lesão corporal.
E se já aplicou?
A orientação para quem aplicou silicone industrial no próprio corpo é procurar um médico, mesmo que ainda não tenha sentido qualquer sintoma. Somente um especialista poderá avaliar a gravidade de cada caso.
Denúncia
Caso suspeite do uso de produtos utilizados de maneira incorreta, é possível entrar em contato com a Anvisa por meio da Ouvidoria (www.gov.br/anvisa/pt-br). Também é possível denunciar os casos diretamente à Polícia Civil (181 _ Disque-Denúncia)
Fonte: Anvisa e Polícia Civil do RS