Todas as vezes nas quais a família de Jonathan Martins de Almeida recebia uma informação sobre o possível paradeiro dele, as esperanças se renovavam. Foi assim ao longo dos últimos quatros anos, nos quais os parentes lidaram com o drama do desaparecimento. De tempos em tempos, eram informados de que Naco, como ele era chamado por ser o caçula, poderia estar em um hospital, morando na rua ou até mesmo em outro Estado.
No dia 12 de novembro deste ano, a localização de uma ossada humana na casa onde ele vivia em Arroio do Sal, no Litoral Norte, reforçou a suspeita de que ele não sumiu por vontade própria. A polícia acredita que Jonathan tenha sido assassinado pela então companheira, que está presa. A defesa de Leda Natalina Alves, 59 anos, afirma que ela pretende confessar o crime. O atual marido dela também está detido, por suspeita de ter auxiliado a ocultar o corpo — a mulher alega que agiu sozinha.
Em Uruguaiana, na Fronteira Oeste, onde Jonathan cresceu, a família espera há quatro anos por uma resposta. Ele é o caçula de sete irmãos, por isso era chamado de Naco ou Naquinho. Agora, os parentes acreditam estar perto de um desfecho. Aguardam o resultado da perícia, que irá confrontar o material genético coletado da ossada, com o DNA da mãe de Jonathan, para saber se realmente são os restos mortais dele. A análise ainda não tem prazo para ser concluída, mas os irmãos esperam poder sepultá-lo na cidade natal.
— Foi um choque, um golpe. Não paramos um instante. Ele morava longe, mas ligava para minha mãe todo dia. Nunca ficou sem fazer contato. Estava sempre presente, no grupo da família. Era meu amigo, meu confidente. Era trabalhador. Um rapaz alegre, brincalhão, amoroso, carinhoso com irmãos, sobrinhos, com a minha mãe — descreve uma irmã de 43 anos, que preferiu não ser identificada.
Ela conta que Jonathan deixou a Fronteira Oeste há cerca de 10 anos, após iniciar um relacionamento com Leda em Caxias do Sul, na Serra. Durante uma viagem para trabalhar com o pai, ele teria conhecido a mulher, que residia na cidade. Decidiu então se mudar para lá e viver com ela. Nesta época, Jonathan trabalhava com o pai em obras, como pedreiro. O casal posteriormente se mudou para a praia de Arroio do Sal, a cerca de 180 quilômetros de Caxias.
No Litoral Norte, ele acabou se empregando em uma empresa de vigilância, onde atuava na instalação de alarmes e monitoramento de residências. A irmã diz que Jonathan era próximo dos sobrinhos, e prometia levar um dos filhos dela para morar com ele na praia. Mas nenhum plano se concretizou. Em dezembro de 2016, aos 33 anos, o irmão deixou de fazer contato — ele teria completado 37 em junho de 2020.
O desaparecimento
A família começou a estranhar a falta de Jonathan quando as mensagens dele cessaram no grupo da família. Ele era um dos que mais movimentava o WhatsApp familiar. Enviava vídeos tocando violão e cantando, contava piadas, fazia brincadeiras com os parentes. Em 18 de dezembro de 2016, às 18h30min, enviou a mensagem, onde escreveu “oi mana”. Depois disso, o grupo silenciou.
Entre os familiares, a falta de contato dele começou a causar estranheza. Os irmãos enviavam mensagens, ligavam e ele não respondia. Foi quando fizeram contato com Leda. A família diz que a mulher contou que Jonathan havia ido embora. Relatou que ele reuniu as melhoras roupas em uma mala, disse que estava indo para Capão da Canoa, e que só retornaria em março. Com detalhes, Leda ainda teria contado ter visto o companheiro embarcar em um Celta verde, que aguardava por ele na esquina da casa.
— Ela disse que ele não queria mais viver com ela e tinha arrumado outra pessoa. Contou que ele subiu nesse carro e foi embora. Criou uma versão, um álibi. Sempre tive uma intuição muito forte de que ele estava morto e enterrado naquela casa. Isso repeti muitas vezes, que ela havia matado meu irmão e enterrado lá — diz outra irmã, que também prefere ter a identidade preservada.
Leda também teria dito aos familiares de Jonathan que ele andava nervoso e que estaria fazendo uso de medicação antidepressiva. A família diz que cobrou dela para saber se havia feito o registro do sumiço. Em janeiro, a mulher foi até a polícia e comunicou abandono de lar. Aos parentes de Jonathan, ela alegou que na polícia não quiseram registrar o fato.
Buscas
O fato de Jonathan ter sumido sem levar a motocicleta que ele havia comprado recentemente e não ter recebido o 13º salário no emprego fizeram os familiares suspeitar ainda mais da versão da mulher. As irmãs dizem que ele adorava a motocicleta nova e que sumiu dois dias antes do pagamento. Sem notícias dele, os parentes passaram a espalhar fotos pelas redes sociais e em sites de buscas de pessoas desaparecidas.
Começaram a receber informações sobre o possível paradeiro dele. Visitaram hospitais e até necrotérios, em busca de alguma pista. Em um dos episódios, souberam que havia um homem de mesmo nome preso em São Paulo, mas acabou se descobrindo que se tratava de um homônimo. Ao longo de quatro anos, a família esteve em busca de notícias dele.
— A minha mãe chorou todos os dias. A gente pedia muito a Deus para que ele voltasse para casa. Uma vez, fomos até um hospital em Porto Alegre porque tinha um rapaz muito parecido com ele internado. Depois nos disseram que ele estava mendigando pelas ruas. O tempo todo cobrei da polícia, liguei muitas vezes, passei muita informação. Nunca desistimos. Já ela nunca ligou para a minha mãe. Nunca ligou para ninguém da família — diz a irmã.
Ciúmes
Segundo o delegado Adriano Koehler Pinto, a polícia acredita que o crime tenha sido cometido por ciúmes em razão de a mulher não aceitar o fim do relacionamento. As irmãs relatam que Leda demonstrava esse tipo de comportamento, inclusive quando eles viajavam juntos até Uruguaiana. Em um dos episódios, o casal teria ido embora antes do início de um aniversário por conta dos desentendimentos entre eles.
— Ela tinha ciúmes até da minha mãe com ele e de nós que éramos irmãs — diz a irmã.
A defesa do casal preso solicitou no início desta semana que os dois sejam ouvidos pela Polícia Civil. Leda, que está presa de forma preventiva, foi indiciada na última sexta-feira (20) por homicídio qualificado (por motivo torpe), ocultação de cadáver e por ter comunicado uma ocorrência falsa de abandono de lar. Já o atual marido dela foi indiciado por ocultação de cadáver. A polícia suspeita que ele tenha ajudado a esconder o corpo, construindo a área de serviço sob a qual estava enterrada a ossada.
A defesa
O advogado responsável pela defesa do casal, Vitor Hugo Gomes, informou que a mulher presa pretende confessar que matou o companheiro há quatro anos e que escondeu o corpo dele no pátio da casa. Gomes diz que ela já lhe detalhou como se deu o crime. Ele pretende que a mulher faça o mesmo à polícia.
O advogado diz que ela contou ter matado Jonathan durante uma discussão, com um golpe na cabeça. Conforme a defesa, ela teria batido nele com uma garrafa de cerveja de um litro.
A defesa alega que a mulher não tinha ciúme do companheiro, segundo a versão dela. Ainda de acordo com o advogado, ela diz ter cometido o crime sozinha e por legítima defesa. Ela afirma, nesta versão, que só conheceu o marido dois anos após o crime, que eles se casaram poucos meses depois, e que ele não tem relação com o caso. Da mesma forma, segundo o advogado, o marido confirma que não sabia de nada até a ossada ser descoberta na casa. O advogado quer que ele seja ouvido para relatar isso à polícia. Ainda não há data prevista para esses novos depoimentos.