Dois meses depois de um incêndio em um galpão no interior de Cruzeiro do Sul revelar um triplo homicídio no Vale do Taquari, a Polícia Civil ouviu 25 pessoas no inquérito, mas não chegou a nomes de suspeitos para o crime. Um caseiro e um casal que havia se mudado para a propriedade uma semana antes foram as vítimas.
Um projétil de pistola calibre 380 localizado na cervical da mulher – que indica tiro na nuca – convence os investigadores de que o trio foi morto na noite de 9 de julho, antes do sinistro. Para o delegado Dinarte Marshall Júnior, o fogo foi usado para apagar as provas.
As chamas destruíram um galpão de construção mista de alvenaria e de madeira. Um veículo, que estava dentro do galpão, também foi incendiado. Na semana passada, o resultado dos exames de DNA confirmou a identidade dos corpos. As vítimas são o caseiro Sinésio Inácio Ghilardi, 29 anos, que residia em uma moradia em frente ao galpão com a mulher, natural de Lajeado e conhecido na localidade de Linha São Miguel, onde o crime ocorreu, e o casal Leandro Arruda, 38 anos, e Mireila Silva dos Santos, 35 anos. Arruda também natural de Lajeado, era vendedor externo de uma padaria e a esposa, de Cachoeira do Sul, era dona de casa.
Na época do crime, as famílias reconheceram alguns pertences, como joias, que não queimaram. O casal tinha um filho de quatro anos, mas a criança não ficou ferida porque estava dormindo na casa em frente. A partir da confirmação da identidade, o Instituto-Geral de Perícias (IGP) fará a necropsia para verificar se o trio foi morto antes ou durante o incêndio.
— Quando a pessoa não está morta no momento do incêndio, vem a inalação de fumaça nos pulmões. Já observamos isso em outros casos. Essa informação terá uma grande influência nas qualificadoras do homicídio. Havendo morte antes do incêndio, incide na ocultação de cadáver — explica o delegado.
Sem avanços com relação a suspeitos, a polícia não tem data para encerrar o inquérito. De acordo com o delegado, a principal dificuldade é encontrar testemunhas que tenham presenciado a cena e aceitem falar. Como a propriedade fica em área que foi atingida pela cheia do Rio Taquari em julho, as autoridades só conseguiram chegar ao local no dia seguinte ao crime.
Outra bairreira, segundo ele, é que o triplo homicídio aconteceu no começo da noite de uma quinta-feira, quando os moradores próximos da localidade estavam ocupados com cheia.
— Não havia pessoas próximas. As chácaras têm poucos moradores e, embora tivesse vizinhos a 200 metros, todos estavam preocupados com a enchente, tirando animais. Quando se ouviu barulho, as chamas já estavam bem altas e não se achou mais ninguém — argumenta o policial.
Outro obstáculo é a falta de agentes para investigar o caso. Segundo Dinarte, a Delegacia de Polícia tem apenas um servidor para a investigação no município de 11,4 mil habitantes.
— Não é novidade ter homicídio em Cruzeiro não esclarecido. Estamos numa localidade muito próxima a Lajeado e Estrela. Em 2018, tivemos oito homicídios, seis foram esclarecidos. Ano passado, foram cinco e três ficaram sem esclarecer — diz o delegado.
Polícia tem duas hipóteses para as mortes
Até aqui, a polícia trabalha com duas linhas principais de investigação: a primeira envolve uma oferta de compra a propriedade feita antes do crime. Segundo o delegado, uma pessoa, que não foi identificada, tentou comprar outras áreas próximas:
— Alguns moradores abandonaram as casas, com medo. Parece que essa pessoa seria envolvida com tráfico de drogas. E recentemente a proprietária do terreno do sítio negou essa proposta. Mas não conseguimos confirmar que essa seria a motivação.
A segunda hipótese recai sobre Arruda, que tem antecedentes por crimes de estupro. As ocorrências foram registradas em 2011 e 2012. Em 2014, ele chegou a ser condenado por uma das acusações. No ano passado, em um terceiro registro, um parente registrou queixa contra ele, afirmando que teria abusado de uma menina da família. O procedimento ainda está em investigação. Mireila e Ghilardi não tinham antecedentes.
— Ouvimos pessoas relativas a esse fato. É uma hipótese, mas não confirmamos a motivação e nem uma ligação clara com os homicídios. Nossa limitação de recursos humanos não nos permitiu avançar — admite o investigador.
A polícia também descarta a possibilidade de envolvimento da companheira do caseiro com o caso. No momento do crime, ela não estava na propriedade. Segundo seu depoimento, estava na casa dos pais auxiliando na remoção dos móveis.
— Naquele dia houve uma enchente muito grande do Rio Taquari. Não há porque duvidar da versão dela. Não chegamos a nada que indique uma motivação — diz o delegado.