Atualização: em 17 de novembro de 2020, a Polícia Civil informou que o entregador confessou ter mentido sobre o caso. Ele admitiu que não foi perseguido pelo Voyage e que se acidentou sozinho. O jovem, que passou a ser investigado pela falsa versão, alega que passava por problemas financeiros.
Um jovem de 21 anos acredita ter sido mais uma vítima do condutor de um Voyage branco, que vem perseguindo ciclistas em Porto Alegre. O entregador conta que na última quinta-feira (17) seguia pela Rua José do Patrocínio, no bairro Cidade Baixa, quando foi atacado. O rapaz tombou no chão, ferindo o pé esquerdo, após frear bruscamente e a bicicleta rodopiar. Este teria sido o primeiro caso com lesão relatado até o momento. Pelo menos outras 10 vítimas já procuraram a polícia.
Já era noite, quando o jovem — que pediu para ter o nome preservado na reportagem — saiu para entregar o pedido. Está acostumado a trabalhar cerca de 12 horas por dia, até as 21h. Naquela quinta-feira, no entanto, os chamados estavam escassos, por isso decidiu permanecer até mais tarde. Por volta das 22h30min, seguia pela José do Patrocínio, nas proximidades do cruzamento com a Avenida Venâncio Aires. Percebeu que havia um veículo branco parado no sinal e seguiu.
— O sinal estava fechado para ele. Ele arrancou, bateu pneu e veio na minha direção. Vi que ele ia vir, sou ciclista, ando todo dia, sei como é o trânsito. Coloquei os dois pés no chão e apertei os freios. Ele veio na minha direção. A minha bicicleta deu um mortal e senti que bati no carro dele. Dei o mortal e caí no chão com tudo. Meio desnorteado. Não consegui ver a placa, mas era um Voyage branco. Ele cantou pneu duas vezes. Uma para me acertar e outra para fugir. É o mesmo modelo, é o mesmo carro — relata o entregador.
Caído no chão, com o pé esquerdo ferido, o jovem foi acudido por outros entregadores. No momento diz que não percebeu a gravidade do ferimento e ainda conseguiu fazer a entrega do pedido. A bicicleta ficou com as rodas e o guidão danificados. Nos dias seguintes, o jovem ainda tentou trabalhar, mas no domingo (20) não conseguiu mais, em razão dos estragos na bicicleta e da dor no tornozelo.
— Trabalho todo dia, abaixo de chuva, tentando juntar um dinheiro. Preciso trabalhar, não posso parar. Mas ontem (domingo) à tarde não aguentei mais de dor, não conseguia ficar mais nem em pé. Um amigo meu buscou a bicicleta para tentar arrumar, está toda torta. Mas o pior é que esse maníaco poderia ter me matado. Podia nem estar aqui falando contigo — reclama o rapaz que trabalha fazendo entregas para aplicativo há sete meses.
O entregador diz que pretende registrar ocorrência na Polícia Civil ainda nesta segunda-feira (21). Além dele, pelo menos outros 10 ciclistas registraram perseguições e ameaças de um condutor com um Voyage branco. O episódio desta quinta-feira seria o segundo após a repercussão do caso.
Polícia afirma que condutor está identificado
Segundo o delegado Marco Antonio Duarte de Souza, da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), o condutor do veículo foi identificado, mas a polícia aguarda o retorno de medidas cautelares solicitadas ao Judiciário na metade do mês passado para poder adotar providências em relação ao caso.
— Identificamos o autor dos fatos e temos provas robustas da autoria. Não só deste fato, como dos demais. Solicitamos providências ao Judiciário. Estamos no aguardo. Os pedidos foram feitos antes deste último fato porque entendíamos que havia risco de reiteração dessa pessoa. Infelizmente, não tivemos provimento ágil que pudesse evitar isso — afirmou o delegado.
Assim como as outras vítimas, o entregador também deverá ser ouvido. O condutor, segundo a polícia, pode ser responsabilizado por tentativa de lesão corporal ou tentativa de homicídio.
GZH solicitou esclarecimento sobre o caso ao Tribunal de Justiça e aguarda retorno.
O caso
Os registros que chegaram à polícia são de casos que aconteceram entre novembro de 2019 e setembro deste ano. A maior parte deles foi na Avenida Edvaldo Pereira Paiva, a Beira-Rio, na orla do Guaíba. Mas já havia sido registrado um caso na Cidade Baixa. Os ciclistas relatam que o motorista se aproxima em alta velocidade, obrigando que saiam da frente, para não serem atropelados. Em um dos casos, um jovem contou que o condutor chegou a descer do veículo com uma chave inglesa na mão.