Um dos celulares de Diênifer Padia, 26 anos, foi fundamental para a que Polícia Civil chegasse aos mandantes do triplo homicídio com integrantes da mesma família em Passo Fundo, há pouco mais de um mês. Após asfixiar Diênifer, o cunhado Alessandro dos Santos, 34 anos, e a sobrinha Kétlyn Padia dos Santos, 15 anos, na noite de 19 de maio, os criminosos fugiram com os aparelhos de duas das vítimas, mas esqueceram o segundo smartphone que a jovem usava para negociar produtos que anunciava nas redes sociais. O descuido dos assassinos levou os investigadores ao caminho que desvendaria o crime.
No aparelho de Diênifer, a polícia encontrou diálogos de um perfil falso do Facebook que fingia interesse em comprar produtos que ela anunciava nas redes sociais. Em depoimento, a mulher de ex-policial militar Luciano Costa dos Santos – preso preventivamente por suspeita de contratar os dois homens que mataram a família – admitiu que utilizou o perfil falso para comprar um celular da jovem. Também disse à polícia que foi até a casa dela para ver detalhes da residência e quantos cômodos tinha. Pelo mesmo perfil falso foi negociada uma estante. Dessa vez, quem se escondia atrás do pseudônimo eram os dois homens que executariam as mortes. Chegaram a ir duas vezes até a casa dela para verificar o móvel. Na terceira visita, mataram Diênifer, o cunhado e a sobrinha.
— O mesmo perfil que negociou o celular, também negociou estante. O perfil fake pode ser usado por várias pessoas. A dupla que executou o crime, para se aproximar da casa vitima, negociou uma estante com ela. Foram várias vezes ver a estante. Não quiseram levar porque precisavam de ferramentas para desmontar. Na última vez, mataram a família e nem levaram a estante — afirma a delegada Daniela Minetto.
A Polícia Civil não divulga os nomes dos envolvidos, mas GaúchaZH apurou que Eleandro Roso, 42 anos, é um dos suspeitos de ser o mandante do crime. Preso preventivamente no sábado, em Casca, Roso é dono de uma propriedade de suinocultura no pequeno município do Norte onde Diênifer trabalhou por três anos. É, portanto, ex-chefe e também pai da sua filha mais nova. Roso e Diênifer tiveram um relacionamento extraconjugal que só veio à tona após o nascimento da criança. O ex-policial militar Luciano Costa dos Santos também está preso por suspeita de ter contratado os dois homens que executam a família.
A esposa de Roso, Fernanda Rizzotto, 41 anos e o cunhado dele, Claudiomir Rizzotto, 52 anos, estão com prisão preventiva decretada, não foram encontrados no dia do cumprimento dos mandados e são considerados foragidos.
— Primeiro, a mulher (Fernanda) descobre traição e começa ameaçar Diênifer de morte. Depois que ela é demitida, ainda há manutenção do relacionamento dela com Eleandro. E Diênifer não parou de pedir coisas, pediu a casa, pediu cartão de crédito e, ao final, pediu auxilio para montar a loja.
A dupla que executou o crime, para se aproximar da casa vitima, negociou uma estante com ela. Foram várias vezes ver a estante. Não quiseram levar porque precisavam de ferramentas para desmontar. Na última vez, mataram a família e nem levaram a estante.
DANIELA MINETTO
Delegada de Passo Fundo
Desde que chegou em Passo Fundo, Diênifer estava empenhada em montar uma loja de confecção de roupas. Já havia comprado as peças e tinha os manequins. A investigação apurou que Diênifer era o único alvo. Santos e Kétlyn foram mortos pois estavam na cena do crime.
— Mataram como queima de arquivo, para não ter testemunha. Eles previram que pudesse ter mais gente em casa, já sabiam devido ao levantamento da mulher do ex-PM. Eles foram preparados para matar quem tivesse que matar — conta a delegada.
Complexidade da investigação
Na noite das mortes, os criminosos usavam máscaras e boné. A dupla sumiu praticamente sem deixar pistas. Quase nenhum rastro foi filmado por câmeras de segurança. Nos primeiros dias de investigação, a polícia não descartava nenhuma possibilidade. Apenas nas últimas semanas foi fechando o cerco e chegando ao nome dos supostos envolvidos:
— A complexidade já se dava porque são muitas pessoas envolvidas. E o crime de mando em si é muito complexo. Ou tu chega no mandante ou no executor. Há um contratante e um contratado. Precisamos de várias diligências que exigiram autorização judicial — conta a delegada.
Um passo fundamental foi dado com a prisão do ex-PM em 19 de junho. Até então, a polícia não sabia a relação de Costa com os ex-patrões de Diênifer. O elo era Claudiomir Rizzotto, irmão de Fernanda, que foi chefe do ex-PM em um posto de combustível de Passo Fundo. Fernanda, segundo a delegada, contatou o irmão para encontrar alguém que pudesse eliminar a jovem. Costa, conforme a polícia, é então contratado para matar Diênifer. De acordo com a investigação, foi o ex-PM que mandou os executores do crime até a casa da vítima. A polícia apurou que a família estaria oferecendo de R$ 25 mil e R$ 30 mil para quem tirasse a vida da jovem.
— Por ser um casal rural, as pessoas não pensam que eles teriam vínculo com esse crime. Mas o cunhado do suspeito achou o ex-PM, alguém que teria capacidade de fazer. Foi algo que vinha sendo planejado desde fevereiro. Eles se encontraram mais de 10 vezes para falar sobre isso.
Na casa do ex-PM, além de drogas e armas ilegais, foram apreendidos R$ 17,5 mil em dinheiro. Em depoimento, Costa confirma a proposta, mas diz que não aceitou. A polícia afirma que tem provas contundentes do envolvimento do ex-PM que indicam a negociação com os executores. Em uma delas, Costa afirmaria que eles deveriam usar um perfil falso para contatar Diênifer.
— Dentro do inquérito, temos depoimentos de dois indivíduos que foram procurados pelo ex-PM para fazer o serviço e não aceitaram. Ambos vieram de forma espontânea nos dar essa informação. Também recebemos mais de cinco denúncias anônimas, todas narrando o envolvimento do ex-PM— afirma a delegada.
A polícia ainda trabalha para chegar no nome dos dois homens que asfixiaram os três integrantes da família Padia dos Santos. Segundo Daniela, todos os envolvidos serão indiciados por homicídio com quatro qualificadores: pagamento de recompensa, asfixia, emboscada e homicídio contra mulher em razão da condição de sexo feminino.
Contrapontos
Responsável pela defesa de Eleandro Roso, o advogado Rodrigo Salomão afirma que a prisão do seu cliente é injusta e que ele não teve nenhuma participação no crime: "É algo que logo será esclarecido. É absurdo. Logo teremos novidades para a elucidação dos fatos. Ele é inocente."
À frente da defesa do ex-policial militar Luciano Costa dos Santos, o advogado Flavio Algarve diz que foi procurado apenas na semana passada e que aguarda ter acesso ao inquérito para examinar os indícios apontados. Ressalta que o cliente foi preso no dia 19 em flagrante por porte ilegal de armas e, na semana passada, teve prisão preventiva decretada por suspeita de envolvimento triplo no homicídio.