Descontrole de impulsos e porte ilegal de uma pistola 9 milímetros são elementos levantados por especialistas para analisar o assassinato de uma família em uma discussão de trânsito na zona sul de Porto Alegre. Para psicólogos e psiquiatras consultados por GaúchaZH, essa combinação funesta está por trás da briga suscitada por um arranhão na lataria de um carro que custou a vida de três pessoas na tarde de domingo (26).
Especialistas sugerem que o atirador Dionatha Bitencourt Vidaletti, 24 anos, irrompeu em raiva e, sem habilidade para controlar seus instintos, cometeu o crime brutal. Por isso, levantam a possibilidade de ele sofrer de distúrbio psiquiátrico, como transtorno de explosividade intermitente.
– Pessoas que sofrem desse quadro tendem a reagir de maneira desproporcional aos fatos – resume o psiquiatra Diogo Lara, ex-professor da PUCRS e UFRGS.
Lara não descarta outras hipóteses. Entre elas, eventual uso de drogas, que tendem a aumentar a agressividade ou a diminuir freios, e o caráter psicótico, um transtorno de personalidade que caracteriza uma pessoa sem sentimento de remorso. Por ora, não há indícios de consumo de tóxicos no caso nem avaliação técnica sobre o perfil psicológico do atirador.
Para a psiquiatra forense Vivian Peres Day, membro da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre, personalidades violentas não costumam se revelar em um episódio isolado. Segundo ela, oferecem indícios de suas suscetibilidades em hábitos e costumes. Vivian ainda alerta para a atitude letal do criminoso, que disparou na cabeça e no pescoço das vítimas, sem dar chance de defesa.
– Me parece alguém que já tinha uma tendência de agressividade muito forte, que teve um momento de extrema disrupção de violência e que tinha uma arma na mão. Nesses casos, melhor não ter uma arma por perto. Ninguém tem uma sem imaginar que um dia possa matar alguém – analisa Vivan.
De acordo com a Polícia Civil, Dionatha não tem registro de armas em seu nome. Pela lei brasileira, é necessário passar por um exame psicológico para obter o registro de atirador. Trata-se de um teste realizado por profissionais cadastrados na Polícia Federal, que levam em conta o histórico de transtornos na família, eventuais episódios de agressão e o uso de substâncias psicoativas.
– Esses exames costumam indicar a predisposição para episódios como esse, evitando o acesso dessas pessoas a armas de fogo – diz a psicóloga Flávia Wagner, do Instituto de Psicologia da UFRGS.
Psicóloga clínica, Geisa Felippi avalia que ele agiu em um momento de impulso, sem premeditar o crime:
– Vemos exemplos de mortes que acontecem nos Estados Unidos, de crianças e adolescentes que entram na escola atirando. Nesses casos, há um plano. Não foi o que aconteceu. Houve um gatilho motivado pelo carro batido.
Os analistas ainda inserem o caso de violência na cultura armamentista em ascensão no país. Já são numerosos os crimes desse tipo. No ano passado, 39 pessoas morreram assassinadas em brigas de trânsito no Brasil, sendo 23 delas por arma de fogo, segundo levantamento do Fantástico, da TV Globo.
– Hoje, há um aspecto cultural que está validando e legitimando o uso de arma como recurso de defesa. Não era exatamente esse o contexto, mas a pessoa que está usando a arma se sente poderosa – diagnostica Lara.