Carne de animais que chegavam mortos a frigoríficos de Parobé e Taquara, no Vale do Paranhana, estava sendo vendidas a açougues, mercados e abasteciam até restaurantes da região. A Justiça determinou a interdição de três desses abatedouros a pedido da Delegacia de Combate ao Abigeato e Crimes Rurais, que deflagrou operação nesta terça-feira (12). Ninguém foi preso.
Foram cumpridos 15 mandados de busca e apreensão em casas de suspeitos, estabelecimentos comerciais que compravam a carne e em outros frigoríficos da região. Em Parobé, fiscais agropecuários apreenderam carne congelada que teria sido vendida a um restaurante pela mulher considerada a líder do esquema, Nilva Garcia Lucas.
Numa escuta telefônica realizada com autorização judicial, ela conversa com o dono do restaurante, José Henrique Oliveira, que encomenda "guisado de gado morto". No celular dele, apreendido pela polícia, o número da mulher foi salvo como a "Tia do guisado".
A mulher, que também é investigada por suspeita de comprar gado roubado, encaminhava as rezes aos frigoríficos interditados, que seriam contratados para prestar o serviço. Depois, realizaria a distribuição.
— Isso, inclusive com absoluto conhecimento de quem está comprando essa carne, colocando em padarias, fazendo salgadinhos para vender, colocando em açougues e até mesmo utilizando outros estabelecimentos, outros frigoríficos para processar essa carne —diz o delegado André Mendes.
O médico infectologista da Ulbra Cláudio Marcel Stadnik diz que há sérios riscos à saúde dos consumidores.
O consumo de carne imprópria traz diversos prejuízos à saúde, desde toxinfecções alimentares até doenças zoonóticas graves
ÂNGELA ANTUNES
Diretora da Associação dos Fiscais Agropecuários do Rio Grande do Sul (Afagro)
— Assim como a carne é rica em proteínas e muito bom alimento pra nós, seres humanos, também é muito bom alimento para as bactérias, os vírus e os protozoários. Então, imediatamente a partir do abate, a partir da morte, começa o processo de apodrecimento, diz o especialista, alertando que o risco é de doenças que vão desde problemas intestinais à complicações cerebrais.
Em um dos frigoríficos interditados em Taquara, fiscais e policiais encontraram carne sem condições de higiene e consumo. Já no apartamento de Nilva, em Portão, foi apreendido um revólver que seria furtado, o que resultaria na prisão em flagrante caso ela estivesse no local. Porém, até a noite de ontemn não havia sido localizada pelos policiais.
Diálogos
Diálogo 1
Fornecedora: Tu precisas de alguma coisa pra amanhã? A carne moída e de estrogonofe.
Cliente: Ah, não, meu amor. Não deu certo, tá? Não vai fechar negócio.
Fornecedora: Não deu?
Cliente: Não aprovei. Ela tem cheiro de sangue, não ficou legal no estrogonofe.
A suspeita da polícia é que os gados morriam no caminhão boiadeiro a caminho do frigorífico. Ou até mesmo por doenças. Em um áudio, um homem comunica a Nilva que há duas rezes mortas sendo transportadas entre Carazinho e Taquara. Ele diz que os animais estão muito inchados.
Diálogo 2
Homem: Tô apavorado. Os caras tão lá em Carazinho. Tão empenhado lá. Morreu dois bois no caminhão já lá.
Fornecedora: Meu Deus do céu.
Homem: Aproveita eles, não?
Fornecedora:Depende do jeito que tá.
Homem: Ah, tão inchado já, Nilda. Tão inchado, o alemãozinho disse.
Contrapontos
Nilva Garcia Lucas
Está sendo procurada pela polícia. GaúchaZH não a encontrou.
José Henrique Oliveira
Admitiu que comprava a carne de Nilva sem nota fiscal, mas negou saber que o guisado era de animais que chegavam mortos ao frigorífico. E que não lembra ter usado a expressão "guisado de bicho morto".