"Aula da vida". Esta deve ser a matéria a ser ensinada aos alunos do Instituto Estadual de Educação Assis Chateaubriand, em Charqueadas, após o trauma que o ataque à instituição deixou, na última quarta-feira (21). Os cerca de 700 estudantes serão recebidos a partir das 7h30min de segunda-feira (26), em um dia de acolhimento.
A escola prepara atividades que possam fazer os alunos expressarem o que sentem, tentando deixá-los seguros para retomar as aulas depois da quebra abrupta da rotina que o incidente causou - além dos três alunos feridos a golpes de machadinha, outras três pessoas procuraram atendimento médico. O início do dia deve ser marcado por um culto ecumênico. Para isso, a direção procurou pessoas da comunidade ligadas a várias correntes religiosas.
— A gente está organizando para agradecer por não ter sido pior. Vamos pedir proteção para nossa escola e fazer o que chamamos de aula da vida — diz a supervisora, Selma Brenner.
Além do culto, a escola quer ouvir os alunos. A ideia é deixar que todos expressem o que estão sentindo para vencer o momento difícil. Psicólogos estarão no pátio da escola para os atendimentos. Cerca de 15 profissionais se ofereceram voluntariamente para o trabalho. Outros dez serão enviados pela secretarias municipal e estadual de educação. O Conselho Regional de Psicologia se colocou à disposição, e um pesquisador do Núcleo de Estudos sobre Intervenções a Desastres e Catástrofes da PUCRS também ofereceu ajuda .
— Eles (alunos) querem muito falar neste momento. Vamos deixar eles falarem, se expressarem, esgotarem esse sentimento — prossegue Selma.
A escola deve estender varais com mensagens afirmativas de confiança para o recomeço. Ainda haverá espaços para que eles escrevam e pendurem suas anotações sobre o que estão pensando. Faixas serão espalhadas pela escola, acompanhadas de balões brancos. Alunos de outras escolas públicas de Charqueadas também preparam cartas para mandar aos colegas.
Eles (alunos) querem muito falar neste momento. Vamos deixar eles falarem, se expressarem, esgotarem esse sentimento
SELMA BRENNER
Supervisora da escola Assis Chateaubriand, de Charqueadas
A direção deve pedir para que os alunos troquem de salas e a de número 10, onde o atentado ocorreu, deve receber estudantes mais velhos. O espaço já foi limpo e alguns estudantes pegaram seus pertences. No dia do ataque, após o susto, a turma deixou o local correndo e os materiais de aula - cadernos, mochilas, estojos - ficaram para trás.
Por fim, a direção ainda quer que os alunos usem peças especiais do uniforme feitas no início deste ano. As camisetas foram confeccionadas após um outro episódio de violência. Em novembro de 2018, quase em frente à escola, um jovem de 17 anos foi assassinado. Nelas, constam frases em defesa da educação, como "mais respeito, menos violência".
A Polícia Civil também deve enviar novamente o projeto "Papo de Responsa" para falar sobre violência e bullying. A Comissão Interna de Prevenção a Acidentes e Violência Escolar (CIPAVE) da Secretaria Estadual de Educação (Seduc) atua na escola desde o incidente, para orientar a direção e as decisões a serem tomadas. A Brigada Militar reforçou o policiamento.
O atentado
A escola foi invadida por volta das 13h30min de quarta-feira (21). Um adolescente de 17 anos atacou alunos com uma machadinha. Três alunos, entre 12 e 14 anos, foram feridos e receberam atendimento no Hospital de Charqueadas, sem maior gravidade. Outras três meninas chegaram em estado de choque e receberam cuidados psicológicos. O ataque foi interrompido quando um professor reagiu e desarmou o agressor, que fugiu correndo.
Horas depois, o adolescente foi encontrado. Apreendido na Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase), na Capital, o autor do ataque estudou no colégio entre 2013 e 2014. Pelas suas fichas escolares, a diretora informou que ele era silencioso e tinha notas ruins, mas “nada que chamasse tanto a atenção”. O agressor não chegou a completar o Ensino Fundamental – atualmente, estudava em uma instituição do EJA na cidade.
Em depoimento à Polícia Civil, contou que sofria bullying dos colegas em 2015 e que se inspirou no massacre de Suzano — onde 10 pessoas morreram, incluindo os dois atiradores. O autor do crime contou ainda que planejou toda a ação sozinho.