Uma série de ameaças vindas das redes sociais acabou antecipando as férias de 360 alunos da Escola Estadual de Ensino Fundamental Erico Verissimo, no bairro Jardim Carvalho, zona leste de Porto Alegre. A suspeita é de que criminosos que dominam o tráfico de drogas na região tenham enviado mensagens com as ameaças há mais de uma semana.
Primeiro, apareceram comentários em postagens e recados privados na página da escola no Facebook. Depois, atacaram o perfil da diretora da instituição de ensino.
— Me ameaçaram. Se não fechasse o colégio, iria morrer. Conteúdo bem agressivo — conta a responsável pelo colégio, que teve o nome preservado pela reportagem de GaúchaZH.
Segundo a professora, as intimidações partiram de dois perfis diferentes. O segundo foi criado após o primeiro ser excluído. A direção imaginou, em um primeiro momento, que poderia se tratar de um aluno ou ex-aluno com raiva da escola, o que acabou sendo descartado com a intensificação e a gravidade das ameaças.
A reportagem teve acesso às mensagens. Em algumas delas, é dado aviso de que a instituição de ensino seria invadida caso as atividades não fossem suspensas. Em outra, há ameaças de morte: "Vou matar quem for amanhã", intimida.
A postagem é seguida pela imagem de um revólver calibre 38 e um alerta: "Está dado o recado".
As ameaças também começaram a pipocar nos perfis de pais de alunos, que ficaram assustados:
“Avise os amigos, moradores, família e quem estiver lá que se eu ver alguém na porta do colégio vai morrer. Não estou brincando”.
Ameaças incessantes foram motivo para cancelar atividades
As mensagens ainda acrescentam que estudantes da escola pertenceriam à facção rival da que domina a área. Em outra, a diretora é ofendida.
"Não estão acreditando. Vou invadir o colégio. Acham que estou brincando, não é? Sou de verdade e tenho uma 34 carregada e preparada para atirar."
Os dias se passaram e as ameaças não pararam. Na terça-feira, uma delas foi considerada como a gota d'água:
"Anuncia na página que não vai ter aula, para ninguém se ferir no tiroteio. Pode ser hoje ou amanhã. Meu perfil não é falso. Então presta atenção: se abrir o colégio tu morre".
A professora está na direção desde janeiro deste ano, após a aposentadoria de sua antecessora. Devido à situação, ela pensa em pedir transferência para outra instituição.
Autor de mensagens será identificado
Na segunda-feira, a diretora procurou a 15ª Delegacia de Polícia e registrou ocorrência, relatando as ameaças. Conforme o titular da DP, delegado Daniel Ordahi, os investigadores vão apurar a autoria das mensagens.
— As pessoas acham que podem criar perfis falsos e se esconder neles. Porém, podemos inclusive chegar ao endereço de onde partiram essas mensagens. Isso já foi feito outras vezes — conta o delegado.
Por envolver trabalho minucioso, não está descartado que se passe a investigação para a Delegacia de Crimes Informáticos, que dispõe de equipamentos e recursos específicos. Por enquanto, o caso segue com a 15ª DP.
O comandante do 20º Batalhão de Polícia Militar (BPM), tenente-coronel Fernando Gralha Nunes, garante que o policiamento foi reforçado no bairro. Por volta das 10h40min desta quarta-feira (11), a reportagem esteve no local e avistou duas viaturas na frente da escola.
— A escola estava fechada. Pedi à guarnição para fazer a entrada e saída dos alunos — explica o comandante.
A intenção dos PMs era permanecer 30 minutos no entorno da instituição e partir para outros pontos de cobertura do batalhão. Conforme o oficial, a situação do local era analisada nesta quarta-feira (11) para verificar a necessidade de direcionamento do efetivo para as proximidades da instituição. Nunes observa que a disputa entre facções rivais na área está “estabilizada” na região.
Há dois anos, arrombamentos e tiroteios
Em 2016, a escola foi assunto recorrente de reportagens. Em junho daquele ano, a instituição foi invadida e vandalizada, com cadeiras, eletrônicos e armários. Pacotes de comida, reservados para a merenda, foram despejados pelo chão; latas de tinta, espalhadas pelas paredes. Até mesmo um extintor foi acionado e o pó ficou espalhado entre corredores e na superfície de mesas e cadeiras.
Ao menos seis alunos foram apontados por participação no vandalismo. Na época, os garotos, com idades entre 13 e 16 anos, estudavam no 8º e 9º anos do Ensino Fundamental. A polícia identificou os atos infracionais de depredação e furto. Segundo a Polícia Civil, o motivo do vandalismo teria sido vingança. Eles teriam recebido advertência da direção por invadirem a escola em ocasiões anteriores.
Pelo menos 30 das 40 salas da escola foram destruídas. Hasteada na parede mais alta da escola, a bandeira de Porto Alegre foi rabiscada com um símbolo já desenhado anteriormente por alunos nas mesas de aula. “É tudo nosso” dizia o recado deixado na lousa da diretora. Na época, a escola estendeu as férias, e o retorno às atividades começou 15 dias depois do previsto para que os estragos fossem consertados.
Naquele ano, aulas foram suspensas por causa de tiroteios pelo menos quatro vezes. Conforme a atual diretora, em 2018 a escola não sofreu nenhuma situação de invasão ou vandalismo.
Contraponto
O que diz a Secretaria de Educação
Com a antecipação das férias, do dia 19 para o dia 11, os alunos perderam seis dias de aulas. Conforme a diretora, a recuperação dessas disciplinas deve ocorrer no próximo semestre, que se inicia em 30 de julho. A antecipação foi autorizada pela Secretaria Estadual de Educação (Seduc) e, segundo a órgão, foi justificada pelo “registro de violência no entorno” e devido à situação de vulnerabilidade em que ficaram alunos e servidores. A diretora reforçou que comunicou a BM logo após as ameaças de invasão ao colégio. Houve reforço no policiamento perto da instituição.