Policial civil há quase quatro décadas, delegado desde os anos 1990, Moacir Fermino Bernardo, 67 anos, jamais teve em mãos um crime de tamanha repercussão como o do esquartejamento de crianças argentinas em ritual satânico, divulgado em detalhes nesta segunda-feira (8). O policial identificou sete por duplo homicídio nas mortes que teriam acontecido em ritual satânico.
Titular da 2ª Delegacia da Polícia Civil de Novo Hamburgo, que apura crimes na região do bairro Canudos, Fermino ficará no caso até quarta-feira, quando retornará das férias o delegado Rogério Bággio, titular da Delegacia de Homicídios da cidade. Nos poucos dias à frente da investigação, Fermino, que é evangélico, fez afirmações que geraram alvoroço, sobretudo nesta segunda, ao dizer que desvendou o crime por "revelação de Deus".
Quem trabalha com Fermino tratou de amenizar a declaração, justificando que foi uma maneira de evitar detalhes de como solucionou o caso.
— Ele conversou com pessoas que frequentam a mesma igreja que ele. E, no entender dele, foi uma mensagem divina — afirmou Rosalino Seara, delegado regional da Polícia Civil no Vale do Sinos.
— O delegado Fermino interpretou como mensagem de outra dimensão o fato de ser procurado pelas pessoas que contaram como funcionaria um ritual satânico. Não se trata de profecia. Não acredito nisso, mas respeito quem acredita — acrescentou o diretor do Departamento de Polícia Metropolitana, delegado Fábio Motta Lopes.
Apesar da polêmica, o diretor garante que o trabalho policial não se baseia em questões sobrenaturais, e sim em provas reais.
— Isso não prejudica o inquérito. Existem dois corpos das vítimas e uma testemunha-chave que diz ter participado do ritual. Se não tivesse esses indícios, o Judiciário não decretaria as prisões preventivas — assegura Lopes.
—Conheço o Fermino. Disse isso para valorizar a fé dele —opina um antigo policial, que pediu anonimato.
Fermino se tornou evangélico há cerca de três anos, ao conhecer um pastor que tem relações com políticos do Vale do Sinos. Na década passada, o delegado concorreu a vereador, mas não teve sucesso. Foi candidato em São Leopoldo, em 2004, pelo PDT, e em 2008, pelo PMDB. Em 2016, seu nome chegou a ser cogitado para concorrer a vice-prefeito em Novo Hamburgo, mas ele não levou a ideia em frente.
Isso não prejudica o inquérito. Existem dois corpos das vítimas, e uma testemunha-chave que diz ter participado do ritual. Se não tivesse esses indícios, o Judiciário não decretaria as prisões preventivas.
FÁBIO MOTTA LOPES
Diretor do Departamento de Polícia Metropolitana
Natural de Porto Alegre, apaixonado por futebol — é torcedor fervoroso do Inter e foi um modesto meia-esquerda em jogos de várzea —, Fermino começou na Polícia Civil como inspetor. Considerado trabalhador, destemido e linha de frente, foi chefe de investigações e de cartórios de delegacias de Novo Hamburgo. Graduou-se em Direito e foi aprovado em concurso para delegado.
Delegado cursa doutorado em Direito
Atuou em repartições do Interior, como em Rio Grande, na zona sul do Estado. Em novembro de 1998, conduziu as investigações sobre um latrocínio na praia do Cassino, que resultou na morte dos professores universitários Vitor Hugo Vitola, 51 anos, Dacila Vitola, 49, e da empregada do casal, Maria Julieta da Silva, 38. Nove pessoas foram indiciadas pelos crimes e levadas a julgamento, mas sete restaram absolvidas pela Justiça por insuficiência de provas.
De volta ao Vale do Sinos, Fermino entrou na faculdade de Jornalismo. Parou na metade do curso. Trabalhou em delegacias de São Leopoldo e Novo Hamburgo, elucidando crimes do cotidiano. Atualmente, é professor universitário de disciplinas de ensino a distância e cursa doutorado em Direito por meio de uma faculdade de Buenos Aires (Argentina).
A amigos, Fermino disse que, quando deixar a polícia, pretende se dedicar à igreja, pregando a religião em viagens pela América Latina. Zero Hora procurou Fermino nesta tarde, mas ele não atendeu às chamadas pelo celular. Na Delegacia Regional, ZH foi informada de que ele não falaria mais à imprensa para finalizar diligências antes de entregar o caso ao titular da Delegacia de Homicídios.