O tiro efetuado pelo policial militar Alexandre Curto dos Santos, 46 anos, que atingiu pelas costas e matou o militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Elton Brum da Silva, em 2009, durante desocupação de terra em São Gabriel, na Campanha, foi entendido pelo júri desta quinta-feira (21) como uma ação em que havia intenção de matá-lo. Com isso, o PM foi condenado a 12 anos de prisão em regime fechado por homicídio qualificado. Na sentença, o juiz Orlando Faccini Neto, também decretou a perda do cargo e detenção imediata. Alexandre foi levado para o presídio da Brigada Militar.
O julgamento iniciou às 9h desta quinta-feira (21) e acabou à 0h15min desta sexta-feira (22). Após 15 horas de audiência, que ocorreu no 5º andar do Foro Central I, integrantes do MST consideraram que a decisão foi justa.
— Estamos bem aliviados. Após muitos anos, a justiça foi finalmente feita — declarou a assessoria do movimento.
Já a defesa do réu, recebeu o decreto com surpresa. Segundo o advogado de Alexandre, Jabs Paim Bandeira, eles vão recorrer da sentença.
— Foi pegos de surpresa, ele já foi preso. Além de recorrer da sentença, também vamos entrar com um pedido de habeas corpus para ele responder em liberdade. Temos até cinco dias para recorrer — garantiu.
Como foi o julgamento
A primeira testemunha a depor, por volta das 10h30min, foi Carlos Cesar D'Elia, integrante do Comitê Estadual de Combate à Tortura e membro da Procuradoria-Geral do Estado. Ele falou por cerca de uma hora e meia e disse que há inúmeros relatos de que a ação da Brigada Militar foi truculenta.
No depoimento, D'Elia salientou que em nenhum momento foi informado que a arma do então soldado havia sido trocada com a de um colega, principal tese apresentada pela defesa. Segundo ele, os incidentes que levaram à morte de Elton são inexplicáveis.
— Não houve nenhum tipo de explicação para Elton ter sido assassinado pelas costas — disse.
Em seguida, foi a vez da segunda testemunha de acusação. Patricia Lucy Machado Couto, que em 2009 pertencia à Comissão de Cidadania de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa e ouviu relatos de feridos no hospital de São Gabriel horas após o confronto. Entre eles, membros do MST dizendo terem sido obrigados a sentar em formigueiros, mas sem detalhar quem os forçou a fazer isso.
— Fui direto para o hospital e vi o corpo do Elton com um ferimento grande nas costas. Havia vários feridos com balas de borracha. Segundo eles, não houve qualquer tipo de negociação — garantiu.
Arrolado pela defesa, o coronel Paulo Roberto Mendes, ex-comandante-geral da BM, foi o último a testemunhar antes do intervalo para almoço. A sabatina se concentrou, principalmente, em elucidar as dúvidas que pairavam sobre o argumento de que houve troca de espingardas entre policiais.
O réu sustenta, desde 2009, que carregou sua arma com munições antimotim e que, por um descuido, acabou pegando a espingarda de um colega, municiada com balas letais.
— A gente sabe como uma ação dessas vai começar, mas não sabe como termina. A arma calibre 12 é a mesma para munições letais ou não letais.
A última testemunha ouvida foi Lisiane Villagrande da Fonseca, promotora de Justiça em São Gabriel. Ela estava na fazenda no momento do confronto e sempre se manifestou dizendo não ter havido excessos da polícia. Ela descreveu que havia miguelitos no caminho e se referiu ao acampamento como uma espécie de ilha rodeada por uma vala, objetos pontiagudos cravados no chão e barricadas de troncos e arames.
— A preparação militar me pareceu muito bem organizada. A atuação da BM foi profissional, mas não me refiro à morte e, sim, ao planejamento — disse.
Chegou, então, a vez do réu ser interrogado por pouco mais de uma hora. Na sua fala, Alexandre Curto dos Santos garantiu que estava distante oito a dez metros de Elton. Porém, conforme a promotoria, embasada em laudos periciais, esta distância era de três a cinco metros.
Santos, que hoje é sargento, afirma ter disparado ao ver Elton tentando derrubar seu colega de um cavalo.
— Eu fiquei imóvel, em choque quando vi que era munição letal. Me perguntava como aquela munição tinha aparecido na minha arma. É um peso que eu carrego. Até hoje me atormenta. Eu não queria ter feito aquilo — pontuou.
O promotor de Justiça Eugenio Paes Amorim disse não acreditar que as armas foram trocadas. Para ele, o disparo foi "intencional".
— Ele tinha trabalhado muitas horas. Era um ambiente de tensão. Alguma coisa passou na cabeça dele para decidir puxar o gatilho. Foi intencional — comentou.
Já o advogado de defesa Jabs Paim Bandeira garante que seu cliente não sabia que estava com a arma que pertencia ao colega.
— Queremos a absolvição. Ele não tinha consciência que poderia matar o Elton.