Nos hospitais do século 19, muitas mulheres morriam após o parto em decorrência de infecções. Quem dava à luz em casa ou mesmo nas ruas tinha chances até maiores de sobrevivência do que em uma internação hospitalar. Na época, os pacientes eram aglomerados em camas coletivas e sem distanciamento, além de serem atendidos por médicos que não limpavam suas ferramentas ou lavavam as mãos.
Isso mudou em 1847, numa época em que ainda se defendia a teoria da geração espontânea, que dizia que pequenos animais como insetos e larvas surgiam espontaneamente, um legado dos gregos. Na época, o médico obstetra húngaro Ignaz Semmelweis decidiu incorporar uma atitude simples — a lavagem das mãos — no dia a dia do hospital em que trabalhava em Viena, na Áustria, antes mesmo da teoria microbiana dos germes se tornar consenso entre cientistas.
— Esse médico viu que, onde as puérperas estavam sendo cuidadas por parteiras que higienizavam as mãos e usavam água quente, havia menos infecção do que as cuidadas pelos médicos porque eles, às vezes, saíam de salas de necrópsia, manipulavam corpos e iam direto fazer os partos — explica a médica infectologista Caroline Deutschendorf, coordenadora da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).
Com isso, a mortalidade nos partos caiu drasticamente, e a data da medida implementada por Semmelweis, 15 de maio, foi instituída como o Dia Nacional do Controle das Infecções Hospitalares. Hoje, mais de 175 anos depois, lavar as mãos continua a ser uma das principais medidas de prevenção para todos os que passam por unidades de saúde — médicos, enfermeiros, pacientes ou visitantes.
De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), só a higiene das mãos e dos ambientes em unidades médicas está associada à redução de complicações de saúde em cerca de 40%, além de reduzir o risco de morte pela metade. Segundo o órgão, a medida é uma das intervenções com o melhor custo-benefício na saúde, por ser barata e eficaz.
Salas de cirurgia, UTIs e quartos limpos
Caroline explica que toda pessoa que interna em um hospital está sob risco de contrair uma infecção, sobretudo aqueles que recebem cateteres, sondas ou fazem cirurgias. Ou seja: incisões e cortes que deixam o interior do corpo, de algum modo, exposto. Por isso, os ambientes hospitalares — dos quartos e corredores às unidades de terapia intensiva e salas de cirurgia — passam por higienizações constantes.
— Focamos muito nesses pacientes em especial porque sabemos que eles têm mais risco e nossa principal medida, carro-chefe, até hoje, é a higiene das mãos — explica Caroline.
Fora a medida já consagrada, em quartos hospitalares, por exemplos, há outras como o distanciamento entre os leitos para deixar a convivência segura e o isolamento dos pacientes que estiverem infectados com micro-organismos ou bactérias resistentes, explica a enfermeira Ariane Monteiro, coordenadora de Enfermagem do Serviço de Controle de Infecção do Hospital São Lucas (HSL).
Reforçamos também a importância da higiene de mãos e que, se o visitante veio visitar seu familiar, ele não pode aproveitar para visitar outros. O cuidado é para aquele paciente e não para os demais.
CAROLINE DEUTSCHENDORF
COORDENADORA DA COMISSÃO DE CONTROLE DE INFECÇÃO HOSPITALAR DO HCPA
Já em unidades de tratamento intensivo (UTI), para onde vão muitos dos pacientes em situação mais delicada, a adesão à higiene das mãos é monitorada junto com o uso de dispositivos, como respiradores e acessos endovenosos, considera Ariane.
— Temos três linhas de prevenção muito fortes: infecção de corrente sanguínea, de trato urinário e de pneumonia associada à ventilação mecânica. Cada uma delas tem itens de rotina que o controle de infecção avalia, como uma espécie de auditoria — diz a enfermeira.
Em locais como salas de cirurgia, os cuidados são ainda mais rigorosos. Há controle até no fluxo do ar condicionado para evitar que partículas caiam no paciente, afirma Caroline. A exceção de partos, os visitantes não são permitidos e, em muitos casos, os pacientes tomam antibióticos para prevenir infecções bacterianas. O controle também é usado em outras alas além das salas cirúrgicas.
— Todos usam barreiras máximas de proteção: avental, gorro, máscara e luva para evitar transmissão de infecção — explica a médica do HCPA, que diz que luva e avental são esterilizados e trocados em todo procedimento para garantir que não haja transmissão de bactérias, por exemplo.
Ariane também ressalta que, no pré-operatório, tanto pacientes quanto a equipe assistencial passam por antissepsias cirúrgicas, como banhos com uma solução de clorexidina, um antibactericida e antifúngico. Há todo um cuidado no preparo da pele do paciente e também com a escovação das mãos dos profissionais de saúde, explica a enfermeira.
Visitantes também contribuem na prevenção
Além de pacientes, hospitais também recebem o fluxo de visitantes e consultas ambulatoriais. De modo geral, no caso de visitas, o ideal é evitar que haja muita gente circulando, apesar do volume ficar mais intenso, sobretudo em caso de pacientes mais graves, com família e amigos preocupados, ressalta Ariane.
— Reforçamos também a importância da higiene de mãos e que, se o visitante veio visitar seu familiar, ele não pode aproveitar para visitar outros. O cuidado é para aquele paciente e não para os demais — diz a enfermeira.
Essa lavagem das mãos pode ser feita com álcool gel ou água e sabonete. A médica alerta que, além disso, durante o inverno, há muita gente que se gripa ou resfria, não toma os cuidados e vai ao hospital, de modo que transmite doenças infectocontagiosas aos pacientes internados.
Além disso, os visitantes devem evitar oferecer lanches “de fora” aos pacientes, já que eles têm dietas específicas entregues pelos hospitais. Caroline lembra que os controles nas cozinhas dos hospitais são rigorosos, com uso de máscaras e gorros o tempo inteiro, além do apoio das equipes de higienização. Já para visitantes, se forem lanchar, o ideal é fazê-lo fora dos quartos.
Como profissionais costumam se prevenir de infecções em hospitais
- A higiene das mãos é essencial em todos os espaços pelas equipes multidisciplinares
- Equipes assistenciais de hospital costumam ser orientadas a evitarem o uso de anéis, pulseiras ou relógios que dificultem a limpeza de toda a superfície das mãos
- Em salas de cirurgia, os profissionais usam aventais e luvas sanitizadas, além de gorros e máscaras. Também é feita uma higienização especial das mãos antes dos procedimentos
- É feita a vigilância de bactérias resistentes – o controle é rigoroso e envolve notificações à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
O que visitantes de hospitais devem ter em mente para se prevenir de infecções
- Assim como para profissionais de saúde, é importante manter a higiene das mãos em todos os ambientes
- Ao ir ao hospital, o ideal é evitar grandes grupos de visitantes
- Ao visitar pacientes, é indicado evitar comer dentro do quarto ou “estender a visita” a outras pessoas internadas
- Toda pessoa que for ao hospital com sintomas gripais deve usar máscara ou evitar ir se estiver com alguma doença infecto-contagiosa