No Brasil, cerca de 930 bebês nascem prematuros diariamente. O número equivale a seis nascimentos antes das 37 semanas de gestação a cada 10 minutos. Os dados do Ministério da Saúde impulsionam o Novembro Roxo, campanha internacional de sensibilização para a prematuridade, que tem como objetivo conscientizar sobre as causas e consequências dessa condição.
A escolha do mês está relacionada ao Dia Mundial da Prematuridade, celebrado desde 2008 em 17 de novembro. Já a cor roxa, de acordo com a Associação Brasileira de Pais e Familiares de Bebês Prematuros (ONG Prematuridade.com), representa sensibilidade e individualidade — características que seriam peculiares às crianças nascidas antes da hora.
Mesmo acontecendo com certa frequência, partos prematuros ainda geram uma série de dúvidas quanto a, por exemplo, possíveis complicações e cuidados necessários durante e após a internação na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal. Como foi o caso da Hellena da Silva Smaniotto, que na quinta-feira (18) teve alta do Hospital Conceição, onde esteve internada durante 10 meses, desde o seu nascimento. Porém, no que seria a etapa final da hospitalização, a pequena contraiu covid-19 e desenvolveu um quadro grave. Por isso, a reportagem conversou com especialistas e listou 10 fatos que você precisa saber sobre a prematuridade. Confira:
1) Definição de prematuridade
Uma gestação completa varia entre 37 e 42 semanas. Assim, todo bebê que nasce antes de completar as 37 semanas é considerado prematuro. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), crianças nessa condição podem ser divididas entre três subcategorias, que são definidas conforme a idade gestacional.
Prematuros extremos são aqueles que nascem antes das 28 semanas. Geralmente, eles correm mais risco de vida do que os bebês que veem ao mundo algum tempo depois, pois têm a saúde muito frágil. A subcategoria intermediária é composta pelos muito prematuros, nascidos entre 28 e 32 semanas. Já os prematuros moderados a tardios são os que nascem de 34 até 37 semanas.
2) Brasil é o 10º país com maior número de casos
Dados da OMS mostram que, todos os anos, cerca de 15 milhões de bebês nascem antes das 37 semanas completas de gestação no mundo. Além disso, as complicações decorrentes do parto prematuro são apontadas como a principal causa de morte em crianças menores de cinco anos em todo o mundo.
No Brasil, são em torno de 340 mil nascimentos prematuros anualmente — o que representa 11,7% de todos os partos, segundo o Ministério da Saúde. Esses números fazem com que o país ocupe a 10ª posição entre as nações onde são registrados mais casos. Já no Rio Grande do Sul, de acordo com a Secretaria Estadual de Saúde, a porcentagem de partos prematuros em 2020 foi de 12,1%.
3) Principais causas estão ligadas a patologias maternas
O médico Maurício Obal Colvero, coordenador da UTI Neonatal do Hospital Santa Clara, da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, e professor adjunto do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), explica que a prematuridade pode ser causada por fatores maternos e fetais. Entre os principais fatores de risco relacionados à mãe, estão: hipertensão arterial, diabetes e infecções urinárias e intrauterinas. Multiparidade e malformações fetais também podem ser causas de nascimento prematuro.
Além disso, a pré-eclâmpsia, que é uma complicação grave da gravidez, tem uma associação muito importante com os nascimentos antes das 37 semanas, salienta a professora e chefe da Neonatologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) Rita de Cássia dos Santos Silveira:
— Essa doença pode gerar uma série de problemas, como pressão alta durante a gestação e alterações hepáticas e urinárias, que ocasionam a perda de proteína pela urina. Trata-se de uma doença hipertensiva específica da gravidez, que tem origem na gestação e pode levar à eclâmpsia, gerando até crise convulsiva na mãe.
4) Pré-natal adequado é a principal forma de prevenção
Diante dos fatores de risco, os especialistas salientam a importância do pré-natal. Rita de Cássia afirma que, se a mulher tem um bom acompanhamento médico durante a gravidez, é possível evitar algumas situações que podem ocasionar um parto prematuro:
— É importante que o obstetra identifique esses problemas e controle a pressão da mãe, por exemplo.
Colvero acrescenta que o uso de medicações e a realização de alguns procedimentos médicos também podem reduzir o risco de prematuridade.
5) Nem todo prematuro precisa de cuidados especiais
O que define quais cuidados um bebê prematuro precisa receber é o seu grau de imaturidade. Crianças que nascem com 36 semanas, por exemplo, não deixam de ser prematuras, mas podem não necessitar de internação na UTI Neonatal, tendo, inclusive, alta do hospital junto com a mãe.
— Esses bebês serão menores, vão precisar de aleitamento materno para ajudar no neurodesenvolvimento, mas é uma situação bem mais tranquila. Eles podem não ter complicação nenhuma e uma sobrevida com qualidade igual a qualquer criança nascida no tempo certo — enfatiza Rita de Cássia, a chefe da Neonatologia do HCPA.
Por outro lado, há os prematuros muito pequenos, que podem ficar de dois a três meses internados na UTI Neonatal. Esses, que nascem entre 22 e 32 semanas e têm menos de 1,5 quilo, costumam ter maior risco de desenvolver problemas futuros, até mesmo na vida adulta.
— Normalmente, indicamos a permanência em incubadora para prematuros com menos de 1,7 quilo e menores de 34 semanas. Os prematuros têm dificuldade de manter sua temperatura e perdem muito líquido devido à imaturidade da pele, e a incubadora proporciona um ambiente onde a temperatura e umidade do ar podem ser melhor controlados — pontua Maurício Obal Colvero.
6) Há diferentes complicações
Segundo os especialistas, todos os órgãos de um bebê que nasce antes das 37 semanas são imaturos. Por isso, podem sofrer com a perda do suporte da placenta e gerar complicações como: imaturidade pulmonar com necessidade de suporte respiratório, risco de hemorragia cerebral por fragilidade dos vasos, imaturidade intestinal com necessidade de nutrição parenteral (pela veia), insuficiência renal, déficit auditivo e visual. Também há risco de síndrome metabólica, que causa hipertensão, diabetes e obesidade, doença arterial coronariana, atraso do neurodesenvolvimento e, posteriormente, baixa estatura e dificuldade escolar.
7) Acompanhamento médico pós-UTI
Rita de Cássia Silveira ressalta que, após a alta da UTI Neonatal, as crianças prematuras não podem ficar sem o acompanhamento médico adequado. Isso envolve uma equipe multidisciplinar, formada por médicos de diferentes especialidades, enfermeiros e técnicos de enfermagem, fonoaudiólogos, psicólogos, nutricionistas e fisioterapeutas. Fundadora e diretora executiva da ONG Prematuridade.com, Denise Leão Suguitani destaca que algumas sequelas podem só aparecer após os primeiros meses e anos de vida.
8) Leite materno é ainda mais necessário
O médico e professor Colvero afirma que o leite materno é uma das principais ferramentas no tratamento de um prematuro. Por isso, inicia-se precocemente a administração de gotas de colostro, leite produzido na primeira fase da amamentação, na boca dos bebês. A técnica chama-se colostroterapia, que não está relacionada especificamente à nutrição, mas sim à estimulação da imunidade do prematuro, explica Denise Leão Suguitani, que também é nutricionista e atuou por anos em UTI Neonatal.
Bebês menores de 34 semanas ainda têm dificuldade para sugar, respirar e deglutir. Então, eles geralmente precisam ficar um tempo ganhando leite materno por sonda nasogástrica. As duas medidas, segundo Colvero, ajudam na redução de infecção e melhoram a tolerância da dieta pelo prematuro.
A fundadora ONG Prematuridade.com chama a atenção para outro ponto: a doação de leite materno. De acordo com a Secretaria da Saúde do RS, um litro de leite doado pode alimentar até 10 recém-nascidos por dia, pois, dependendo do peso da criança, um mililitro por mamada já é o suficiente para a nutrição. A pasta afirma que, atualmente, 10 bancos de leite compõem a Rede gaúcha de Bancos de Leite Humano — que são responsáveis por coletar, processar e distribuir o alimento a bebês prematuros e de baixo peso. A lista com os endereços pode ser conferida por meio deste link.
9) Licença-maternidade estendida
Em março deste ano, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ampliou a duração do benefício do salário-maternidade para todas as mulheres que sejam seguradas pela Previdência. A medida se aplica quando a mãe e/ou o recém-nascido precisa de internação hospitalar por mais de 14 dias em decorrência de complicações médicas relacionadas ao parto.
Assim, o salário-maternidade será pago durante todo o período de internação e por mais 120 dias (tempo padrão de licença). Para solicitar a prorrogação do salário-maternidade, a assegurada empregada deve encaminhar o requerimento diretamente ao empregador. Já trabalhadoras asseguradas sem vínculo empregatício, como autônomas e empresárias, precisam requerer o benefício pela Central 135, por meio do protocolo do serviço de "Solicitar prorrogação de Salário-Maternidade". Em caso de internação superior a 30 dias, a mãe segurada deverá solicitar sua prorrogação a cada período de 30 dias.
10) O impacto da pandemia
De acordo com Denise Leão Suguitani, fundadora da ONG Prematuridade.com, a pandemia de covid-19 teve impacto na busca por pré-natal e no comparecimento das mães em consultas de acompanhamento. Também houve uma diminuição na procura por vacinas, que são especialmente fundamentais para os bebês prematuros:
— Algumas vacinas eles fazem enquanto estão internados e outras são específicas para prematuros. Aqueles abaixo de 28 semanas, por exemplo, têm direito a receber um imunizante para a prevenção do vírus que causa bronquiolite, que para o prematuro é potencialmente fatal.
Além disso, a separação entre pais e filhos prematuros devido às medidas de prevenção contra o coronavírus é algo preocupante. Por isso, o tema mundial da campanha Novembro Roxo de 2021 é "Separação zero: aja agora! Mantenha pais e bebês prematuros juntos!". Denise relata que, no período mais crítico da pandemia, a ONG recebeu diversos relatos de mães que não puderam estar perto de seus bebês durante a internação.
— A presença dos pais é remédio para o prematuro, faz parte do processo de melhora. Os benefícios da presença, do pele a pele, da voz e do cheiro dos pais sempre vão se sobressair aos riscos — defende a nutricionista.