Identificar se uma pessoa sofre de transtorno de pânico passa por uma pergunta fundamental: o medo é relacionado a um cenário específico ou ao temor de passar pelo próprio ataque?
– Pergunto para o paciente: "Teu medo é de que o avião caia ou de que tu tenha um ataque ali dentro, que não consiga sair?". A própria definição do pânico indica um surto abrupto de intenso medo e desconforto. Ou seja, é espontâneo, acontece do nada. É clássico o caso de quem acorda com pânico à noite, sem que haja qualquer estressor por perto – aponta o psiquiatra e diretor da APRS Cristiano Belem da Silva.
Um diagnóstico precoce é importante para evitar que o transtorno piore. Sofrer de síndrome do pânico sem procurar um tratamento geralmente não significa que algum outro quadro vai se desenvolver a partir desse mal, mesmo no caso de outras doenças psíquicas, como a depressão. Mas o próprio transtorno vai afetar o paciente de maneira mais grave.
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– Sem tratamento, tende a aumentar o nível de gravidade do quadro. Deixa de ser leve e vai para moderado, grave. E, quanto mais severo, maiores as restrições e as perdas, até chegar a um ponto em que o paciente possa não conseguir mais sair do quarto – afirma o diretor-tesoureiro da ABP, Antônio Geraldo da Silva.
O problema, porém, tem cura. Quando identificado, costuma ser tratado com uma associação de psicoterapia e medicamentos, que incluem antidepressivos e ansiolíticos, responsáveis por causar um efeito tranquilizante que pode evitar o medo de ataques e controlar possíveis novas crises.
– O antidepressivo vai agir a curto, médio e longo prazos. Seria como um antibiótico para uma pessoa em estado gripal. A curtíssimo prazo, o que vai "baixar a febre" é o ansiolítico – diz o psiquiatra Abelardo Ciulla.
O tempo de tratamento varia muito de caso a caso – vai de alguns meses a vários anos. Em qualquer caso, é fundamental manter o processo rumo à cura pelo período definido com o psiquiatra: um tratamento interrompido antes do fim pode significar o retorno da doença com intensidade ainda maior.
Psiquiatras alertam ainda que o uso de substâncias consideradas estimulantes, como derivados de cafeína, nicotina e álcool, deve ser evitado para esses pacientes. Faz parte do tratamento também a recomendação de mudança no estilo de vida, priorizando boa alimentação e a realização de exercícios físicos com frequência. Outra indicação é fazer atividades de lazer, que ajudem a não pensar nos efeitos de um possível ataque de pânico, assim como ações de relaxamento, incluindo massagens e meditação.
A importância do outro
O transtorno do pânico é uma doença de reflexos principalmente individuais, mas em que as pessoas afetadas buscam muito o apoio de outros para sentir uma atenuação dos efeitos – e também para ter uma voz amiga que diga acreditar que aquele medo é real.
Profissionais relatam que é frequente, muito mais do que em outros transtornos de ansiedade, que pacientes com sinais de síndrome do pânico entrem acompanhados no consultório. O objetivo, além da ajuda representada pelo companheirismo, é também contar com alguém que possa atestar ter visto os efeitos de uma crise. Não porque o médico vá desconfiar, mas porque a pessoa afetada sente que não pode provar seus medos.
– Quem tem pânico raramente vai sozinho ao psiquiatra. E é até recomendável levar alguém. Ainda que isso não vá evitar as consequências de uma crise, traz mais segurança ao paciente – destaca o diretor científico da APRS, Cristiano Tschiedel Belem da Silva.
– Geralmente, esses pacientes vão acompanhados porque se sentem muito isolados. Com uma pessoa próxima ao seu lado, ele se sente até mais confiante para relatar os problemas – completa Abelardo Ciulla.
Essa proximidade também serve como contraponto aos efeitos do transtorno, que deixam a pessoa muito isolada, sozinha com seus medos. É sozinho que alguém tem medo de uma crise de pânico, é sozinho que esse alguém imagina que vai ser afetado pelo transtorno.
Um mal pouco pesquisado
Apesar de dados divulgados em fevereiro pela Organização Mundial da Saúde (OMS) mostrarem que o Brasil é o país com a maior taxa de pessoas com transtornos de ansiedade no mundo – e o quinto em casos de depressão –, há poucas pesquisas abordando o caso específico do transtorno de pânico. Como há uma série de outras doenças associadas à ansiedade, e muitas delas são relacionadas a fobias claramente reconhecíveis, a síndrome acaba sendo pouco identificada.
Um estudo feito com a população norte-americana no início dos anos 2000 apontou que aproximadamente 3,5% dos cidadãos sofriam com os efeitos do transtorno de pânico. Em todo o mundo, as mais atingidas seriam as mulheres, em uma proporção de duas para um, e os afetados teriam principalmente entre 20 e 30 anos. Estima-se que cerca de 4% da população brasileira tenha registrado ataques de pânico ao longo da vida, com aproximadamente 1% do total desenvolvendo o transtorno.
Nos Estados Unidos, o National Comorbidity Survey (NCS) Replication, com uma amostra representativa dos norte-americanos, estimou que 23% dessa população preencheu critérios para ao menos um ataque de pânico isolado ao longo da vida.
Até pouco tempo atrás, o problema era também muito associado à agorafobia (o medo angustiante de lugares públicos e grandes espaços descobertos), mas diretrizes médicas recentes passaram a separar as duas síndromes, já que o pânico nem sempre está relacionado à vontade de ficar em casa, com a pessoa atingida temendo qualquer situação que possa acontecer lá fora.