Em uma tarde de outubro, a terapeuta ocupacional Marina*, 51 anos, chegou com cerca de 15 minutos de atraso para integrar um grupo de apoio da Associação dos Amigos, Familiares e Portadores de Transtornos de Ansiedade (APORTA-RS), do qual participa semanalmente desde março do ano passado. Durante a fala dos outros colegas que se apresentavam, manteve as mãos unidas sobre o colo e prestou bastante atenção. Quando chegou a sua vez de contar quem é e como está, ela não falou baixo e nem parecia nervosa. Sequer enrubesceu.
A segurança para falar na frente da psicóloga e de outros sete pacientes foi adquirida ao longo de mais de um ano de tratamento. Antes disso, Marina era sabotada constantemente pela própria ansiedade. Quando precisava falar em público ou até expor sua opinião em reuniões de trabalho, era acometida por taquicardia, sudorese e mal-estar e sentia-se travar diante dos outros.
- Perdi diversas oportunidades de crescimento profissional porque eu acabava fugindo das situações em que precisava mostrar o meu trabalho ou contribuir para o coletivo - conta.
Quando procurou a APORTA-RS, a terapeuta ocupacional também tinha dificuldade em se relacionar com os colegas. Hoje, divide com as companheiras de trabalho duas horas semanais em aulas de dança, comportamento impensável antigamente.
A evolução de Marina também é resultado de sua dedicação a sessões de terapia individuais, exercícios físicos e ao desenvolvimento da espiritualidade. Também procura boas leituras e filmes, mas só aqueles que não a deixem muito nervosa. Cenas de violência não são bem-vindas na tela da TV do apartamento onde vive sozinha.
Há cerca de quatro anos, Marina descobriu que também sofria de claustrofobia, transtorno associado à ansiedade. Na véspera de Natal, havia ido com o ex-marido a uma lava a jato e estava dentro do carro quando a espuma tomou conta da parte externa do veículo. A escuridão e o calor a sufocaram de tal maneira que, em um impulso desesperado, ela começou a buzinar e a gritar por socorro até que a máquina fosse completamente desligada e ela, retirada do carro.
Hoje, sente-se melhor. Durante a sessão, dividiu uma vitória pessoal com o grupo: conseguiu fazer uma ressonância magnética que adiava há semanas pelo medo de enfrentar o tempo imóvel dentro do tubo. Ainda assim, precisou ser sedada para passar pelo exame.
Quando precisa enfrentar situações sociais em que tenha de falar em público, ainda permite-se não aparecer. Mas garante que está trabalhando para melhorar este aspecto.
- Estou me esforçando, tentando um pouco de cada vez. Não quero ficar mais no anonimato, como fazia antes - alegra-se.
* O nome é ficcional. A identidade foi preservada a pedido da entrevistada.
Difícil de controlar
"Perdi oportunidades de crescimento profissional", relata vítima de ansiedade
Terapeuta ocupacional conta que tinha dificuldade em se relacionar com os colegas
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