Uma avaliação sobre a covid-19 no Rio Grande do Sul em novembro mostra dois cenários opostos. O primeiro é um dado positivo: o mês terminou com o menor número de mortes por coronavírus em 2022. No período, 76 pessoas perderam a vida em razão da doença, o que representa queda de 27% na comparação com outubro.
A parte negativa do levantamento, feito por GZH nesta sexta-feira (2), envolve a quantidade de diagnósticos positivos, que quase dobrou no comparativo entre os dois meses. Especialistas ouvidos pela reportagem dizem que o avanço da BQ.1, subvariante da Ômicron, é um dos responsáveis pelo crescimento dos registros estaduais.
Além disso, redução no uso de máscaras e sentimento de “segurança” quanto ao possível fim da pandemia por parte da população são apontados como justificativas para a piora no número de casos. Por outro lado, a vacinação é vista como o motivo de o aumento de diagnósticos positivos não ser acompanhado pelo crescimento de óbitos.
Segundo dados do Ministério da Saúde, em outubro, foram reportados 11.993 casos positivos no Estado; em novembro, 22.422, o equivalente a 747 por dia. Conforme mostrado pela Secretaria Estadual da Saúde (SES), o crescimento ocorreu nas últimas quatro semanas.
Um dado mensura o comportamento da covid-19: no dia 1º de novembro, por exemplo, foram notificados 449 novos casos da doença no RS. No último dia 30, último do mês, foram contabilizados 2.525, uma diferença de 462%. A disparada interrompeu uma sequência de cinco meses consecutivos com queda nos casos positivos no RS.
O que dizem os especialistas
Para Francine Hehn de Oliveira, coordenadora médica da Patologia, Genética e Biologia Molecular do Hospital Moinhos de Vento, o aumento no número de casos de covid-19 no Estado é motivado por dois fatores. Um está relacionado à circulação da BQ.1 na população gaúcha nas últimas semanas. Segundo ela, a subvariante tem apresentado maior capacidade de contágio do que o observado nos últimos meses. Somado a isso, Francine completa, ocorre o cenário de descuidos de medidas não farmacológicas para evitar a transmissão da doença.
— Todos os lugares passaram a não exigir o uso de máscaras. Isso fez com que as pessoas circulassem sem proteção por aí, aumentando a chance de contaminação. Além disso, tem o relaxamento da população, que estava se sentindo confortável com a sensação de que a pandemia tinha terminado — diz.
Se o aumento de casos preocupa autoridades e especialistas, a profissional ressalta a efetividade das vacinas para reduzir o número de mortes no Estado. Em fevereiro, mês com mais óbitos em 2022, 1.399 pessoas perderam a vida devido à covid-19: o indicador caiu para 76 em novembro, uma redução próxima a 95%.
E essa queda foi possível mesmo com mais de 600 mil pessoas sem a segunda dose do esquema primário, mais de 3 milhões sem a terceira dose (ou primeiro reforço) e mais de 2 milhões sem a quarta dose (segundo reforço) no RS.
— A vacinação é a principal responsável pela diminuição dos óbitos, o que mais contribuiu para casos mais leves, sem necessidade de internação. Outro fator importante é que temos dois anos de experiência com pacientes com covid, sabemos tratar de forma melhor (do que no início da pandemia) os sintomas e os pacientes — explica.
Fernando Spilki, virologista e pró-reitor de Pesquisa, Pós-graduação e Extensão da Universidade Feevale, diz que costuma ter cautela na avaliação de dados recentes divulgados por autoridades sanitárias. Segundo ele, distorções nos levantamentos podem ocorrer devido a informações não incluídas nas estatísticas oficiais no momento, mas que são contabilizadas posteriormente. Ainda assim, com base no que tem observado da pandemia, ele comenta que o balanço não o surpreende.
— Esperamos um número de óbitos menor do que no passado, e que eles não acompanhem a elevação nos casos positivos neste momento, muito em virtude da vacinação —resume.
O especialista faz um histórico da evolução da pandemia: o aumento de casos no Estado ocorre em um momento anterior a datas nas quais há aglomerações, como o Natal e o Ano-Novo. Nesses períodos, lembra Spilki, o Brasil viveu surtos da doença nos dois últimos anos, com picos que continuaram até o fim do verão. No Rio Grande do Sul, por exemplo, foi fevereiro o mês com as piores estatísticas em 2022 (veja no infográfico acima).
— Não há qualquer motivo para imaginar que o número de casos não continue aumentando. Temos visto isso acontecer nas últimas três, quatro semanas. Precisamos continuar acompanhando, mas não seria a tendência (a redução no registro de casos) dentro de uma lógica esperada para as próximas semanas —completa.