Ômicron, Delta, Gama, BQ.1, BE.9, BA.1: o aparecimento de variantes e subvariantes é uma das fases do enfrentamento à pandemia de covid-19. Todas são mutações do vírus original, o Sars-CoV-2, descoberto em Wuhan, na China, em 2019. Essas mudanças ocorrem porque o vírus precisa se adaptar para sobreviver e continuar o seu "objetivo", que é infectar pessoas, explicam especialistas ouvidos por GZH. Por isso, não há um limite para mutações do vírus, nem para o surgimento de novas linhagens.
No momento, a subvariante BQ.1, originada da Ômicron, é a que mais preocupa as autoridades sanitárias do Rio Grande do Sul, e é considerada a responsável pela disparada no número de casos positivos de covid-19 em novembro.
O 15º relatório técnico sobre a circulação de variantes do Sars-CoV-2 no Brasil, do Projeto Corona-Ômica-BR, foram identificadas 46 linhagens no Rio Grande do Sul, com prevalência das sublinhagens da Ômicron. O mesmo levantamento indica ainda a presença de seis variantes no Brasil, com a Ômicron como mais representativa: 91,33% dos casos analisados, acompanhada pela Gama com 4,64%, e Delta, com 2,75%.
Os dados do relatório foram obtidos por meio do Gisaid, uma iniciativa científica global que disponibiliza acesso aberto a dados genômicos dos vírus influenza e do coronavírus. A análise foi feita entre 13 de setembro e 13 de novembro.
Segundo Francine Hehn de Oliveira, coordenadora médica da Patologia, Genética e Biologia Molecular do Hospital Moinhos de Vento, o processo observado é normal: o Sars-CoV-2 tende a mudar quanto mais se espalha, e, quando isso ocorre, ele pode alterar a estrutura inicial, e se tornar uma variante. E esse processo segue até chegar às subvariantes.
— Qualquer agente capaz de deixar uma pessoa doente precisa se adaptar para sobreviver, porque desenvolvemos antivirais, antibióticos, vacinas, para tratar essas infecções. Por isso, a única maneira de uma bactéria, um fungo ou vírus sobreviver é se adaptando ao meio. Quando falamos de vírus, a adaptação dele significa uma nova variante — explica.
Segundo Francine, essas pequenas adaptações ocorrem porque o vírus busca outras formas de seguir com o próprio "objetivo", que é infectar pessoas. Essas mutações podem ocorrer para aumentar a velocidade de transmissão ou deixar mais eficaz o modo de contágio. Não há um limite de subvariantes na busca pela sobrevivência, explica a médica do Moinhos de Vento: o vírus pode mudar inúmeras vezes, sumir por certo período e mesmo retornar a circular caso a população esteja desprotegida.
— Existem infecções que desapareceram e voltaram várias vezes. Agora estamos de novo com um cenário do sarampo, também voltou a ter casos de pólio. Isso acontece por causa da não vacinação, que é um problema enorme porque causa o retorno de doenças que foram erradicadas — comenta.
Segundo Fernando Spilki, virologista e pró-reitor de Pesquisa, Pós-graduação e Extensão da Universidade Feevale, o surgimento de variantes e subvariantes está relacionado ao número de pessoas infectadas. Ou seja, quanto maior a circulação do vírus em um grupo, há mais possibilidade de ocorrer mudanças a cada contágio, para seguir, assim, a cadeia de transmissão entre as pessoas.
— As mutações são processos que ocorrem ao acaso. É como se estivéssemos jogando dados. Se eu jogar o dado uma vez, tenho uma chance em seis de aparecer o número três. Se eu ficar jogando esse dado milhares de vezes, o número três vai aparecer muitas vezes. Quando tiver muitas pessoas infectadas, teremos mais chances de ter a formação de mutações — explica.
O aparecimento de novas linhagens traz ao debate a eficácia da vacina. Existe possibilidade de que o vírus mude ao ponto de deixar obsoletos os imunizantes disponíveis hoje? Ou, ainda: alguma das subvariantes que circulam neste momento são capazes de "fugir" dos imunizantes? Spilki diz que a resposta para as duas questões é negativa, e que está distante uma conjuntura na qual as vacinas se tornem ineficazes contra a covid-19.
— Não vemos no horizonte a possibilidade de o vírus evoluir ao ponto de um escape total das vacinas no que tange a proteção clínica. As vacinas continuam protegendo apesar de o vírus ser diferente daquilo que tínhamos no passado, quando as primeiras vacinas foram feitas — afirma.
Entenda a diferença entre variante, subvariante e linhagem, segundo o Instituto Butantan:
1. O que é uma variante?
Os vírus são partículas constituídas de material genético, que pode ser DNA ou RNA, envolvidas em uma cápsula de proteína. Ele tende a mutar-se quanto mais se espalha, e, quando isso ocorre, pode mudar a estrutura inicial e se tornar uma variante. No caso da covid-19, as variantes são mutações do Sars-CoV-2, o vírus original.
2. O que é uma linhagem?
Quando a variante começa a se propagar por mais territórios, infectando mais pessoas em diferentes regiões ou países, ela se torna uma linhagem. Em outras palavras, ela é uma variante que teve sucesso ao se espalhar em uma grande quantidade de pessoas. É o caso das variantes Alfa (B.1.1.7), Beta (B.1.351), Gama (P.1), Delta (B.1.617.2) e Ômicron (B.1.1.529), pois conseguiram se disseminar para vários continentes.
Toda linhagem é uma variante, mas nem toda variante chega a se tornar uma linhagem. Isso porque, por mais que seja uma mutação, ela pode ser incapaz de se propagar de forma eficiente e rapidamente desaparece, o que a inviabiliza como uma linhagem.
3. O que é sublinhagem (ou subvariante)?
À medida que ocorrem mutações do vírus, nem sempre o material genético se altera de forma significativa. É a partir daí que surgem as sublinhagens, variantes muito semelhantes às linhagens às quais pertencem. Uma forma fácil de detectar sublinhagens é perceber que a nomenclatura sofreu ramificações. Por exemplo, algumas das sublinhagens já detectadas da Ômicron são BA.1, BA.1.1, BA.2 e BA.3.
4. O que é variante recombinante?
Quando há uma mistura ou recombinação de material genético de duas ou mais linhagens ocorre uma variante recombinante. Para que isso aconteça, é necessário que uma pessoa contraia pelo menos duas linhagens ao mesmo tempo e que o evento de recombinação ocorra. Exemplo disso é a XG, uma recombinante das linhagens BA.1 e BA.2 da Ômicron.