O Rio Grande do Sul tem pelo menos 25 casos de covid-19 confirmados com a cepa recombinante XQ, segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Na quinta-feira (2), a entidade confirmou que o Estado é o primeiro onde há transmissão local desse vírus. O coronavírus XQ é uma mistura do genoma de duas linhagens da variante Ômicron: BA.1 e BA.2. Neste momento, inclusive, a sublinhagem BA.2 é a predominante em circulação no Rio Grande do Sul.
Os casos com a cepa XQ no Estado foram identificados em diferentes cidades, entre os meses de março e maio. Em março, foram detectados dois casos, que representaram 0,3% dos 324 genomas sequenciados. Em abril, foram oito casos de XQ, correspondendo a 8% dos 98 sequenciamentos. Em maio, 15, representando 7% dos 109 casos analisados.
Detectada no Brasil em novembro de 2021, a Ômicron responde por quase 100% dos casos no país, com predomínio das linhagens BA.1 e BA.2 e suas sublinhagens. A cepa XQ já havia sido detectada em situações isoladas em Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais. A XQ já foi detectada mundialmente, em especial no Reino Unido.
Coordenador da Rede Corona-Ômica BR-MCTI, o virologista Fernando Spilki, que também é professor na Universidade Feevale, explicou a GZH como fica a situação no Estado com a BA.2 predominando nos casos e a confirmação de transmissão local da XQ.
A BA.2 é mais contagiosa? Qual a diferença dela para as outras?
A BA.2 esteve associada com surtos, especialmente, de rebote ao final do surto de Ômicron, principalmente, nos países nórdicos e no Reino Unido, ainda no final da primeira grande fase do surto de Ômicron (início do ano). Lá, ela realizou um número de infecções importantes e se conferiu uma transmissibilidade mais alta do que de Ômicron. Mas sempre temos que ter uma ressalva: esta transmissibilidade pode ter sido muito ajudada por algo que aconteceu lá, e que aconteceu aqui mais tardiamente: a retirada de toda e qualquer barreira para transmissão do vírus e a flexibilização total, que incluiu o fim do uso de máscara em locais fechados. Ela (BA.2) tem este potencial e estamos vendo isso se repetir aqui.
Sobre a XQ, o que se sabe sobre ela?
Este achado que foi consolidado com os dados da Fiocruz e da CEVs, e que já tínhamos observado para a região do Vale dos Sinos e da Serra na semana anterior, nos chama a atenção que durante o mês de maio esta linhagem recombinante de BA.1. 1 e BA.2 esteja aparecendo tanto. Usualmente, as recombinantes são dignas de nota, mas em número mais baixo. Aqui no Estado, não. Estamos com número de casos bastante apreciável e é algo que temos que ficar alertas. Além de BA.2 ter transmissibilidade alta, a XQ está aparecendo. E aparecendo num cenário onde a BA.2 está circulando. Então, precisamos ficar atentos de como ela está conseguindo fazer um número de casos importantes. Precisamos saber se ela não tem a ver com esta alta nos casos.
O que esta situação - BA.2 dominante no RS e surgimento da XQ - significa para a pandemia no Estado?
Já era esperado (que a alta nos casos pudesse ocorrer). Tanto que, muitas vezes, profissionais da saúde e da pesquisa foram contrários à retirada de máscara em local fechado porque isso passou para a população a ideia de que havia uma liberação completa e extrema e que não teríamos mais problemas. As ondas continuam acontecendo em outros países e estamos expostos. Como não temos mais nenhum anteparo, mesmo na presença de variante BA.2 e de suspeita de XQ com alta transmissibilidade, ficamos muitos expostos a enxergar variações importantes no número (de novos casos) ao longo das próximas semanas. É preocupante. O movimento iniciou em meados de abril e notamos este domínio da BA.2 e o surgimento da XQ durante o mês de maio. Isso pode prenunciar que teremos uma onda que vai subindo e que vamos encontrar mais casos nas próximas semanas. Seria importante tomarmos medidas, mesmo que brandas, como a readoção de máscaras para toda a população em locais fechados para evitar a transmissão.
Há chance de aumentar de forma rápida o número de casos?
Por enquanto, estamos vendo um aumento importante nas últimas semanas nos números de casos. Hoje, temos uma dificuldade de enxergar o número real de casos porque as estratégias de diagnóstico, desde o esforço, que caiu muito, até as próprias formas de diagnóstico, não permitem que tenhamos um quadro adequado do sistema. E estamos vendo, além de uma dinamização do número de casos, ainda que em números mais discretos, uma tendência continuada nas internações e em nível de UTI.
As duas são variantes mais severas, capazes de inchar o sistema de saúde?
Por enquanto, não temos notícia de aumento de severidade. Mantem-se no ambiente de um quadro clínico que é muito mais brando, especialmente em indivíduos vacinados - que está dentro deste grande roll da variante Ômicron. Mas já existem outras variantes circulando no Brasil, especialmente em São Paulo, como o núcleo de BA.4 e BA.5, para as quais já existem desconfiança de uma severidade mais aumentada no quadro clínico, especialmente quando pega pessoas com quadro vacinal incompleto.
As vacinas ajudarão a conter casos mais graves das variantes BA.2 e XQ?
O ciclo vacinal completo auxilia e diminuiu a severidade dos quadros. Tem pouco impacto na transmissão. E este é o nosso problema porque estamos vendo que o retorno para a terceira dose, principalmente entre os jovens, não está ocorrendo. Estamos tendo problema no retorno das crianças para a segunda dose. Já se fala em dificuldade para estender depois a quarta dose — que já deveríamos chamar de reforço anual — para os adultos mais jovens.