Aguardado para qualificar o combate à covid-19, o paxlovid ainda não tem data para ser disponibilizado à população no Sistema Único de Saúde (SUS). Especialistas ouvidos pela reportagem definem o medicamento como um importante aliado na redução de casos graves da doença, o que, por consequência, evita hospitalizações e mortes.
Quando do anúncio da incorporação do medicamento ao SUS, feito no último dia 6, o Ministério da Saúde (MS) estipulou prazo de 180 dias para disponibilizar a tecnologia na rede pública.
A Secretaria Estadual de Saúde (SES) do Rio Grande do Sul diz não participar do processo neste momento e que a implementação será responsabilidade da chamada pactuação tripartite, que envolve MS, Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems).
De acordo com Guilherme Ribas, presidente do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do Rio Grande do Sul (Cosems-RS), entidade ligada ao Conasems, sabe-se apenas que o medicamento está em fase de aquisição. Ribas afirma que os envolvidos no trabalho devem dialogar nos próximos dias para tratar da logística da implementação.
— Precisamos saber quais os critérios de distribuição, o quantitativo para cada Estado, qual área técnica será responsável pelo armazenamento e distribuição. Isso será avaliado e normatizado nesses 180 dias — explica.
O Paxlovid foi desenvolvido pela Pfizer. Em nota à reportagem, a empresa norte-americana diz não comentar negociações em andamento e que o medicamento não está disponível no Brasil neste momento. Quando estiver, acrescenta o material, a "forma de dispensação dependerá das tratativas em curso com o Ministério da Saúde".
O que é o paxlovid?
É um medicamento de uso oral composto pelos antivirais nirmatrelvir e ritonavir. O nirmatrelvir é uma molécula inibidora de uma enzima do Sars-CoV-2 e impede que o vírus se prolifere. O ritonavir inibe a ação de uma enzima que degrada o nirmatrelvir. Assim, colabora para que o nirmatrelvir fique por mais tempo na corrente sanguínea, fato que potencializa a ação.
Ele é indicado para pacientes com a doença nos estágios de leve a moderado, não hospitalizados, que têm risco de complicações e não usam oxigênio suplementar.
De acordo com o MS, no Brasil, o paxlovid será ofertado apenas para pacientes adultos imunocomprometidos (indivíduos com resposta imunitária pouco eficiente a infecções ou doenças) ou com idade igual ou superior a 65 anos. O tratamento será iniciado em casos de teste positivo para covid-19 e em até cinco dias depois do início dos sintomas.
Treinamento de profissionais
O médico infectologista André Luiz Machado, do Hospital Nossa Senhora da Conceição (HNSC) de Porto Alegre, assegura que o paxlovid é um medicamento seguro e que a tecnologia mudará a forma como a doença é tratada em todo o mundo.
— É um divisor de águas. Ele modifica a evolução da doença, vai impactar de forma positiva no número de internações hospitalares e de óbitos — opina.
Por ser de uso oral, acrescenta o infectologista, o medicamento pode ser administrado antes que o indivíduo progrida para formas mais graves; por característica, deixa mais ágil o processo e é de fácil alcance à população. André Luiz Machado entende que os profissionais da área da saúde têm de ser treinados para a utilização do medicamento enquanto o paxlovid não chega às farmácias do SUS.
— Ele é de fácil posologia, mas algumas interações medicamentosas podem ocorrer. Então, é importante que o treinamento seja realizado para que possamos ter uma estratégia de tratamento adequada. Isso precisa ser avaliado com cuidado — conclui.
Participação do RS na pesquisa internacional
Um estudo sobre o paxlovid conduzido pela Pfizer em diversos países indicou que o medicamento ajuda a reduzir em 89% a evolução de pacientes para estágios graves da doença. A mesma pesquisa, de 2021, recrutou cinco voluntários no Rio Grande do Sul. O infectologista Eduardo Sprinz chefiou o trabalho no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), no segundo semestre do ano passado.
De acordo com o médico, os resultados mostraram redução de cerca de 90% das chances de o paciente evoluir para as formas mais graves da doença com o uso da medicação. Nenhum participante da pesquisa morreu, conforme Sprinz.
No início, os responsáveis pela pesquisa queriam três mil voluntários. No entanto, os resultados intermediários do teste clínico foram considerados tão bons que o laboratório americano interrompeu o recrutamento. Por isso, o estudo foi feito com 1.361 pessoas.
De acordo com a Pfizer, participaram da pesquisa adultos sintomáticos, não hospitalizados, com diagnóstico laboratorial confirmado de infecção por Sars-CoV-2 e que estavam até o quinto dia após o início dos sintomas.
O infectologista define os resultados da pesquisa como "espetacular" e que, se o tivéssemos desde o início da pandemia, somado às vacinas, cerca de 600 mil mortes poderiam ter sido evitadas no Brasil.
— Não temos por que temer essa infecção se tivermos vacinação para todos e substâncias ativas contra a covid. Certamente (as mortes) seriam reduzidas em pelo menos 90% — conclui.