O Brasil confirmou, na semana passada, o primeiro caso da subvariante Ômicron XE do coronavírus, identificada primeiramente no Reino Unido. A novidade não gerou grande preocupação entre cientistas brasileiros, que destacam que as vacinas seguem protegendo contra casos graves.
O primeiro caso no Brasil foi identificado na semana passada, em São Paulo capital. Ao jornal O Globo, o homem, de 39 anos, afirma que, passados 40 dias da infecção, está plenamente recuperado e sem nenhuma sequela. Ele sentiu dor nas articulações, cansaço, dor de cabeça e na garganta, além de febre, mas nada grave.
A XE é uma recombinação das subvariantes da Ômicron BA.1 com a BA.2. Nasceu quando uma pessoa ficou em um ambiente no qual dois indivíduos estavam infectados por essas cepas. Os dois vírus entraram no organismo do terceiro indivíduo, se misturaram e produziram uma “filha”: a Ômicron XE.
Aparentemente, a XE é até 10% mais transmissível do que a BA.2 – que, por sua vez, já era mais transmissível do que a BA.1, um dos vírus mais transmissíveis da história. A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmou que recombinações virais são comuns, sobretudo quando o número de novos casos é grande.
Nenhuma das subvariantes que nasceram por recombinação geraram grande impacto em qualquer país – incluindo a deltacron, mistura da Delta com a Ômicron. Há ainda outras versões da Ômicron, como XA, XD, XC e XF.
Para cientistas ouvidos por GZH, a grande cobertura vacinal contra o coronavírus no Brasil e o grande número de pessoas já infectadas pela Ômicron entre janeiro e fevereiro devem promover proteção contra a XE. A subvariante é similar às variantes “mãe”, a BA.1 e BA.2, contra as quais as vacinas funcionam.
— A XE tem parte do genoma da BA.1 e a maior parte, da BA.2. Não há nenhuma grande novidade em termos de virulência ou fuga de vacinas que seja diferente das cepas-mãe. Minha preocupação é se nossa imunidade cair e precisarmos ser revacinados, e não com a variante em si. Uma nova onda dependerá mais da falha da revacinação do que da variante — diz o virologista Paulo Brandão, professor da Universidade de São Paulo (USP).
O médico e presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Alberto Chebabo, cita que pode haver algum aumento no número de casos a partir da XE, mas não é esperada explosão de infecções nem onda como as já registradas anteriormente – afinal, a XE ainda é Ômicron, e não outra variante.
— Uma nova onda como a de Ômicron ou Delta é muito pouco provável. A XE pode provocar aumentos transitórios de transmissão se for comprovado que é mais transmissível e suplantar outras variantes. Mas ela é uma subvariante da Ômicron, então quem teve infecção recentemente está protegido ou parcialmente protegido — diz Chebabo.
O primeiro caso de XE foi identificado em janeiro no Reino Unido, mas apenas 480 casos foram descritos na plataforma Gisaid, usada por cientistas do mundo inteiro, diz a virologista Paola Resende, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
A XE não está relacionada ao aumento de casos em países como Dinamarca, França e Inglaterra – e sim a BA.2, sua “mãe”. Os crescimentos são associados à queda nas restrições, sobretudo de máscaras em ambientes fechados, impulsionada por bolsões de indivíduos não vacinados.
No Brasil, a BA.2 avança bastante devagar, mostram dados da Rede Genômica Fiocruz, que ainda identificou que a Delta já foi praticamente substituída pela Ômicron em solo brasileiro.
— A XE não tem mostrado ampla expansão. Existem outras recombinantes detectadas, em geral em baixa frequência. O que estamos vendo é um aumento da BA.2 no mundo, mas com aumento singelo em nossa região. Vale destacar que a dinâmica de circulação de linhagens é diferente no mundo, a Alfa gerou explosão de casos na Europa, mas circulou por aqui sem sucesso — diz Resende.
A XE é apenas mais uma subvariante da covid, explica o virologista Fernando Spilki, da Universidade Feevale. A própria OMS classificou a XE como “variante sob monitoramento” – ou seja, vale ficar de olho, mas sem se preocupar.
— A gente não imagina que a XE deva trazer grande mudança no quadro. É uma subvariante a que estamos atentos, mas é um detalhe num mar de diversidade. Temos mais de 55 subvariantes da Ômicron — diz Spilki.
A alta cobertura vacinal deve assegurar que a XE não provoque grandes mudanças porque as vacinas estimulam uma proteção de ação rápida (por anticorpos neutralizantes) e uma defesa mais duradoura (por meio da memória celular), responsável por reduzir o risco de casos graves, explica Alexandre Zavascki, médico infectologista no Hospital de Clínicas de Porto Alegre e professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
— Podemos ter aumento de infecções pela XE, porque, mesmo que não tenha diferença em escape imunológico, ao ser mais transmissível ela é um fator a mais na equação. Mas, por causa das vacinas, não espero nova onda, e sim número maior de infecções. A proteção contra o agravamento é difícil de escapar e não depende das mutações porque é ativada por causa da imunidade celular — pontua Zavascki.