Uma obra que exalta a bravura dos profissionais da saúde e o poder da ciência, ao mesmo tempo homenageando quem sucumbiu à doença provocada pela pior pandemia em um século, será inaugurada pela Associação Médica do Rio Grande do Sul (Amrigs) nesta quinta-feira (16), às 19h.
O Memorial da Gratidão, concebido pelo cirurgião plástico e escultor Paulo Favalli e composto por três grandes placas de bronze, está localizado no saguão de entrada do prédio e é mais um dos marcos da celebração dos 70 anos da entidade, completados em outubro. O Quarteto de Cordas do Theatro São Pedro fará uma apresentação, com a presença de familiares de médicos mortos pela covid-19 presentes na plateia. A participação na cerimônia será restrita a convidados.
No total, a obra tem 7,5 metros de comprimento, 2,65 metros de altura e 1,4 metro de profundidade — trata-se de um grande retângulo na parede, do piso ao teto. Cada placa de bronze pesa 180 quilos. Elas representam A Morte, A Ciência e A Cura.
Presidente da Amrigs, Gerson Junqueira Jr., cirurgião do aparelho digestivo, explica o significado de cada um dos componentes: a primeira placa simboliza o caos da pandemia, os óbitos de amigos, familiares e colegas, trabalhando ou não na linha de frente; a segunda, a descoberta do coronavírus e o âmbito do avanço das pesquisas, com o progressivo melhor entendimento da infecção e de como tratar os casos e a chegada das vacinas; e a terceira, a cura, com um profissional de saúde tirando a máscara, um paciente extubado (desconectado do respirador) e outro na posição prona (deitado de bruços, para melhora da respiração).
— O memorial tem a intenção de prestar homenagem, primeiramente, a todos os médicos e profissionais da saúde que, ao longo desses 22 meses, trabalharam e dedicaram sua vida à atuação frente à covid-19, mas, principalmente, àqueles que morreram. Essa pandemia mudou muito as nossas vidas, de forma marcante. Perdi colegas e amigos. A grande mensagem que queremos deixar é que a ciência é o centro de tudo, além de uma reflexão sobre o que se passou — diz Junqueira.
Em levantamento realizado junto a instituições de classe, a Amrigs chegou ao número de quase 60 médicos gaúchos mortos em decorrência de complicações da covid-19. Não há menção de nomes, uma vez que se pretende que o Memorial da Gratidão seja atemporal e que a pandemia ainda não terminou. O objetivo é que a iniciativa simbolize a medicina e demais especialidades da área da saúde do Estado como um todo.
— Os meses iniciais do ano passado foram de muita angústia. Não sabíamos o que viria, quando viria e como impactaria nossa vida. Teve um momento pior, que foi março deste ano, mas aí já sabíamos lidar com a covid-19. Essa é a grande diferença. Tínhamos receio da quantidade de pacientes, mas sabíamos lidar com a doença, o que usar, o que não usar. Dois momentos difíceis e transformadores — completa o presidente da Amrigs.
Adyr Eduardo Virmond Faria, 56 anos, cirurgião pediátrico, estará presente na solenidade desta quinta-feira. Seu pai, o pediatra Adyr Cancello Faria, não resistiu à covid-19 e faleceu em março, aos 85 anos. O filho relembra o aprendizado da troca de papéis que experimentou na época da internação hospitalar do pai, quando era o parente responsável por repassar as notícias dos médicos da UTI ao restante da família.
— É uma situação supercomplicada. Eu podia vê-lo, mas não podia entrar no boxe (pelo risco de contaminação). A angústia maior era aquela coisa do dia a dia, hora a hora. Ficava muito ansioso na hora de falar com o médico. Ali eu era o familiar de um paciente. É um aprendizado para minha vida de médico também — recorda o cirurgião.
Faria descreve o pai como um profissional superativo, divertido e alegre, reconhecido na cidade pelo trabalho no consultório e no Hospital de Pronto Socorro, onde atuou por mais de três décadas.
— Não tinha hora para ele. Era dos antigos, ia à casa dos pacientes. Exemplo de humanidade. Meu ídolo — define o filho.
A Amrigs não divulga o valor investido no Memorial da Gratidão. Entre os patrocinadores, estão Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina, Câmara Municipal de Porto Alegre, Claro, Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), Farmácias São João, Governo do Estado do Rio Grande do Sul, Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), Unicred e Unimed Porto Alegre.