O governo do Estado de São Paulo já se organiza para oferecer um novo ciclo de imunização contra o coronavírus a partir do ano que vem. De acordo com o governador João Doria, a revacinação começa em 17 de janeiro de 2022, quando se completa um ano do início da campanha no Brasil.
Em entrevista nesta sexta-feira (23) à Rádio Gaúcha, Doria disse que a farmacêutica chinesa Sinovac, responsável pela CoronaVac, produzida no país pelo Instituto Butantan, já decidiu que novas doses da vacina deverão ser administradas passados 12 meses da primeira aplicação. Não se sabe, no entanto, se será aplicada uma terceira dose ou se o esquema vacinal precisará ser refeito a cada ano. A assessoria de imprensa do governador reforçou, por telefone, que a revacinação confirmada para o ano que vem em São Paulo consistirá, inicialmente, em apenas uma terceira dose aplicada em quem tomou CoronaVac neste ano.
Infectologistas consultados por GZH afirmam que ainda não está comprovada a exigência de tomar a vacina contra o coronavírus anualmente. Segundo a infectologista Raquel Stucchi, professora da Unicamp e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), dados apontam uma diminuição da proteção conferida pelos imunizantes ao longo do tempo, o que pode indicar a necessidade de reforço.
— Temos estudos que mostram que a proteção realmente parece diminuir com o passar dos meses. A minha impressão é que, sim, precisaremos de revacinação contra a covid-19, talvez no prazo de um ano ou pouco menos. Teremos, ao longo deste semestre, dados da literatura científica que possam certificar essa necessidade ou não — diz ela.
Segundo o infectologista Paulo Ernesto Gewehr Filho, do Hospital Moinhos de Vento, há dúvidas que precisam ser respondidas antes de se afirmar se as vacinas contra a covid-19 devem ser aplicadas anualmente. A primeira é saber se elas continuam funcionando após seis meses ou 12 meses. A segunda é se os imunizantes utilizados neste momento terão efeito contra as novas variantes em circulação.
São questionamentos feitos com base no que já se aprendeu com a vacina contra a gripe.
— Se a gente for comparar com a vacina da gripe, da qual já temos décadas de estudos, aprendemos que a proteção diminui de uma forma importante após seis meses em algumas pessoas, e que, de um ano para outro, ela fica desatualizada. Ou seja, os vírus da influenza mudam de um ano para outro. Por causa disso, às vezes, é necessário mudar a vacina para que ela proteja contra as novas variantes. Se imagina que isso aconteça com a covid-19, mas não está definido ainda — observa o médico.
Em alguns países, grupos prioritários tomarão uma terceira dose. O Reino Unido, por exemplo, vai aplicar o reforço em imunodeprimidos, pessoas que moram em lares geriátricos, adultos acima de 70 anos, adultos com doenças crônicas e profissionais da área da saúde que trabalham no atendimento a pacientes com covid-19. Em outro momento, a terceira injeção será destinada a adultos acima de 50 anos, pessoas de 16 a 49 anos do grupo de risco e pessoas próximas a quem tem imunodepressão.
Para Gewehr Filho, o anúncio da terceira dose feito pelo governo de São Paulo é precipitado, já que nada está comprovado. Mais importante seria abranger as pessoas que ainda não se vacinaram.
— Discutir uma terceira dose quando muitas pessoas sequer tomaram a primeira? Deveríamos trabalhar para que todos fizessem primeira e segunda dose. A prioridade é vacinar todos os que podem receber a vacina e, em paralelo, acompanhar os estudos que avaliam a necessidade de terceira dose — diz.
Na opinião de Stucchi, a preocupação em pensar em doses extras, caso a ciência ateste a necessidade de reforçar a imunização, demonstra organização dos gestores:
— Acho importante a preocupação em já se programar para a necessidade de uma revacinação. Isso para que a gente não fique, no começo do ano que vem, como ficamos neste ano, correndo, tentando comprar vacinas. Claro, devemos aguardar dados científicos que demonstrem essa necessidade, mas, pelo menos, já estamos pensando nisso.
Em nota, o Ministério da Saúde informou que ainda não há um plano para revacinar a população no ano que vem, isso porque faltam evidências da necessidade de doses extras contra a covid-19. Também frisou que a recomendação é que Estados e municípios sigam o que é definido pela Câmara Técnica Assessora em Imunização e Doenças Transmissíveis e pelo Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 (PNO).