As 500 mil vidas que chegaram ao fim por causa da covid-19 no país foram lembradas e homenageadas na noite desta terça-feira (22), em Porto Alegre. De dentro de sacos de papel com areia, as chamas de 500 velas iluminaram o Parque de Redenção, por volta das 18h, e foram acompanhadas por dezenas de manifestantes, familiares de vítimas e por quem transitava pelo parque. No último sábado (19), o Brasil ultrapassou a marca de 500 mil mortes em decorrência da doença, e o Rio Grande do Sul registra, até esta terça, 30.605 óbitos.
— É um ato de solidariedade com os mortos e com famílias enlutadas, muitas das quais não puderam se despedir, por não haver sequer velório ou enterro decente. Esse momento é de memória e de justiça, para lembrarmos de todo o descaso e irresponsabilidade que gerou o descontrole da pandemia e essas mortes — afirma Gustavo Bernardes, presidente da Associação de Vítimas e Familiares da Covid-19 (Avico), uma das entidades organizadoras do ato.
Diante do Monumento ao Expedicionário, cerca de 50 nomes de vítimas foram declamados pelos participantes, como os de Nereu e Maristela Knauth, casal morto pela doença em março deste ano. Ao ouvir os nomes da família, Daniela Knauth entoou “o meu pai”, “a minha mãe”, de forma que os presentes soubessem do tamanho da sua perda.
Nereu faleceu aos 80 anos, onze dias antes da esposa. A filha cuidou deles no hospital durante um período, mas teve de se afastar quando também foi contaminada pelo vírus. Por causa disso, não estava ao lado deles quando partiram.
— O mais difícil é não poder ter estado com eles quando tudo aconteceu. Me causa muita revolta, pois eles não teriam morrido se tivessem sido vacinados. O pai morreu um dia antes de poder receber a vacina. A minha vida foi destruída em questão de um mês — conta Daniela Knauth, que segurava um cartaz em homenagem a todas as vítimas.
Já a garota de 10 anos Eloísa Hoff recebia o conforto dos braços da mãe, Caroline Hoff, enquanto chorava pelo pai. Aos 47 anos, Henrique Hoff morreu em uma UTI de Porto Alegre no mês de abril. Diante das velas acesas, a dupla também lembrou a vida de Santa Marley, avó da menina.
— Foi meu companheiro por 22 anos, um pai incrível e um professor apaixonado pelo que fazia. O sentimento é de indignação por uma morte que poderia ter sido evitada, como a da minha mãe — diz Caroline Hoff.
A ação também abrangeu reivindicações por vacinação em massa, alimento para a população e retomada do auxílio emergencial no valor de R$ 600. Também manifestaram indignação por crimes contra a vida de pessoas negras e indígenas no país e entoaram gritos de “Fora Bolsonaro”.
A ação foi organizada por familiares de vitimas, movimentos sociais e por entidades religiosas, entre elas o Fórum Inter-religioso e Ecumênico do RS, a Fundação Luterana de Diaconia (FLD), o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic) e o Conselho Estadual do Povo de Terreiro do Estado do RS.
— Todas as diferentes crenças que estão aqui hoje são afirmadoras da vida. É um ato que chama atenção para a negligência de um governo que tem provocado muito sofrimento às pessoas — afirma a pastora luterana Cibele Kuss, que conduziu a cerimônia.