As secretarias municipais de Saúde do Rio Grande do Sul temem que a demora no recebimento de insumos para a produção de imunizantes contra a covid-19 dos dois principais fornecedores brasileiros leve a um “apagão” temporário da campanha de vacinação no Estado. O principal risco é de que o prazo para aplicação da segunda dose, que já sofre atrasos, fique ainda mais comprometido.
Até esta sexta-feira (14), havia 1,5 milhão de gaúchos à espera da dose complementar de todas as opções de imunizantes disponíveis — dos quais 157 mil pessoas já perderam o prazo para completar o esquema vacinal com a CoronaVac, e não há estoque disponível mesmo contando as remessas recebidas entre quinta-feira (13) e esta sexta.
O Instituto Butantan, que fabrica a CoronaVac, e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), responsável pela vacina de Oxford/AstraZeneca, anunciaram paralisações na linha de produção devido à falta do chamado Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA), matéria-prima dos produtos destinados a combater o coronavírus.
— Essa dificuldade preocupa muito em razão de um possível "apagão" na produção das vacinas, principalmente no caso da CoronaVac. Há informações não oficiais de que o instituto entregaria mais um lote no final de semana, mas não eliminaria o déficit da segunda dose que temos nos municípios — afirma o presidente do Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Estado (Cosems/RS), Maicon Lemos.
Mesmo contabilizadas as 190 mil doses de CoronaVac que chegaram entre a noite de quinta e a manhã desta sexta, ainda restariam 157.730 mil pessoas com a dose de reforço em atraso no Rio Grande do Sul, conforme a Secretaria Estadual da Saúde (SES).
O governador paulista João Doria anunciou, na manhã desta sexta, a entrega de um último lote de 1,1 milhão de doses do produto do Butantan, feitas com os insumos remanescentes. Se couber ao Rio Grande do Sul a fatia aproximada de 6% que costuma ser enviada pelo Ministério da Saúde a cada desembarque, isso resultaria em 66 mil aplicações — apenas 42% da demanda em atraso para concluir o esquema vacinal.
Segundo Lemos, que também atua como secretário no município de Canoas, há uma “janela” entre a eventual chegada da matéria-prima e a liberação de novos lotes do imunizante que amplia as dificuldades:
— O que nos preocupa é que, mesmo quando chegar o IFA, a produção da vacina não ocorre de um dia para o outro, e estamos com o relógio correndo para aplicar as segundas doses.
O sinal de alerta é muito maior em relação à CoronaVac, em comparação à AstraZeneca, pelo alto número de pessoas com atraso na dose complementar, por não haver qualquer previsão de chegada do IFA e pelo fato de o imunizante chinês ter prazo mais curto para aplicação entre as duas injeções (28 dias, contra três meses da vacina de Oxford).
Segundo a assessoria de comunicação da Fiocruz, a fundação conseguiu liberar novos lotes de insumo, com previsão de chegada nos dias 22 e 29 deste mês. Assim, mesmo que a fabricação seja interrompida por alguns dias a partir da semana que vem, como anunciado, há uma expectativa de retomada em breve sem grande comprometimento do cronograma de entregas. Como o uso desse produto começou no final de janeiro no Estado, as primeiras aplicações de reforço já tiveram início — ainda sem relatos de falta de frascos para completar a imunização.
— Por orientação do Ministério da Saúde, estamos garantindo as segundas doses da AstraZeneca. Nesta semana, recebemos um lote significativo que ficou para as segundas doses — observa Lemos.
Pedidos de entrevista feitos nesta sexta por GZH à SES para avaliar a situação do Estado não foram atendidos, segundo a assessoria de imprensa da pasta, por “questões de agenda”.
A situação de cada vacina
CoronaVac
Até a tarde desta sexta, havia 546 mil pessoas que já haviam tomado a primeira dose mas ainda não haviam recebido a segunda. Dessas, já contando duas remessas enviadas até a manhã desta sexta, somando 190 mil doses, 157,7 mil pessoas ficariam em atraso (mais de 28 dias desde a aplicação inicial).
O Butantan liberou um lote remanescente de 1,1 milhão de doses também nesta sexta, que poderia resultar em algo próximo a 66 mil doses para o Estado. O governo paulista reafirmou que não tem mais insumos para produção nem tem data certa para a chegada de 10 mil litros de IFA retidos na China, capazes de gerar 18 milhões de doses — das quais cerca de 1 milhão poderiam caber ao RS, pela média de entregas anteriores.
AstraZeneca
Como a vacinação começou em 25 de janeiro e o imunizante tem prazo de três meses para aplicação, por enquanto apenas 75,4 mil pessoas já tomaram a segunda dose de um total de um milhão que receberam a primeira. Na quinta (13) foram distribuídas mais 135 mil vacinas no Estado exclusivamente para segunda dose (ainda de um lote anterior), e mais 237.250 unidades chegaram nesse mesmo dia. Elas ficarão armazenadas para garantir futuras doses de reforço.
Por meio da assessoria de comunicação, a Fiocruz informou a GZH que, com a liberação de IFA prevista para os dias 22 e 29, “a Fiocruz segue (...) com o cronograma planejado semanal de entregas. Com as duas novas remessas de maio, as entregas semanais de aproximadamente 5 milhões de doses seguem garantidas até o final de junho”.