Com a liberação de uso de outras vacinas contra a covid-19 no Brasil – primeiro Oxford e CoronaVac, depois Pfizer –, naturalmente começou a crescer a expectativa em voluntários da vacina da Janssen no país pela chamada abertura de cegamento: saber se o participante tomou placebo ou a dose do imunizante. A aprovação de uso emergencial da vacina por pelo menos uma agência reguladora, no caso a dos Estados Unidos, no final de fevereiro, foi o primeiro passo que levou a farmacêutica a começar a chamar os voluntários para esta etapa da pesquisa.
A minha ansiedade cresceu quando comecei a ver alguns conhecidos que também eram voluntários, no Hospital de Clínicas ou no Conceição, serem chamados na primeira semana de março. Então, por whatsapp, a secretaria do estudo entrou em contato comigo e agendou para 17 de março o meu “dia da verdade”.
Naquela quarta-feira eu certamente sairia com um presente de aniversário (celebrado no dia 19): já estar vacinada desde 20 de novembro ou apta a receber a dose naquele dia – os participantes são informados desde o início do estudo que seriam imunizados em momento a ser definido pelo patrocinador. Poderia ser apenas no fim do estudo, daqui um ano e meio, mas diante de um momento tão preocupante no mundo todo, algumas prerrogativas permitem que a empresa adiante este processo.
Para participantes da minha idade, 41 anos, sem comorbidades, mas cada vez mais assustados com o cenário brasileiro, este era um momento de ouro. As últimas perspectivas levam a crer que outra pessoa nestas mesmas condições seja vacinada apenas em 2022.
Na recepção, brincam comigo se eu já tenho algum palpite. Eu tinha o meu, por causa das reações que apresentei: um pouco de febre, calafrio, dor no corpo, enfim, uma espécie de princípio de gripe que durou 24 horas. Em uma sala, uma médica me mostra tudo com muita transparência: meu número de participante, escolhido aleatoriamente no princípio de tudo, é a grande chave do segredo. É ele quem permite o estudo ser duplo-cego: nem eu nem nenhum pesquisador sabia o que estava na ampola que foi destinada a mim naquele 20 de novembro. Este número continha, em arquivo fechado, a informação de ouro.
Ela entra no sistema, coloca o número, clica no botão “unblinding” (“quebra de ocultamento” seria uma tradução) e voilà: já estou vacinada há quatro meses.
Isso encerra minha participação no estudo? Não mesmo. Apesar de já se saber que a vacina da Janssen, agora já com entrada de pedido para uso emergencial no Brasil, tem 66% de eficácia para casos leves da doença, e 85% para casos moderados e graves, ainda existem lacunas a serem preenchidas. Uma delas é saber por quanto tempo quem a toma mantém a imunidade. E por isso seguimos sendo acompanhados com eventuais exames e outros procedimentos até o final de 2022.
Também não se sabe ainda o quanto esta e muitas de outras vacinas contra a covid-19 são capazes não apenas de impedir que a pessoa vacinada fique doente, mas impedir que seja um transmissor do vírus. Por isso mesmo é que precisamos continuar mantendo todos os cuidados enquanto não vermos boa parte (cerca de 70%) da população imunizada.