A suspensão dos testes da CoronaVac pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) leva a uma corrida de pesquisadores para evitar a perda da primeira dose aplicada em voluntários. Já com prazos apertados, a vacina tem intervalo ideal de duas a três semanas entre a primeira e segunda dose, e os dois dias sem trabalho levaram ao temor de desperdício de parte dos testes.
O chefe do setor de infectologia do Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica do RS (PUCRS) e líder do estudo em Porto Alegre, Fabiano Ramos, disse ao Gaúcha+, nesta quarta-feira (11), que será necessário readequar o processo do centro de pesquisa.
— Como a gente está trabalhando num limite, com um número muito grande de pessoas circulando no centro de pesquisas, agora a gente tem que readequar e chamar essas pessoas novamente em outra data para que não se perca. Algumas pessoas podem estar no prazo final para receber a segunda dose e podem ter um atraso — alertou.
Ouça a entrevista completa:
O líder do estudo explicou que a suspensão, derrubada nesta quarta-feira, não irá colocar em risco o estudo. Para Ramos, a expectativa é de que será possível normalizar a situação até sexta-feira (13) sem que nenhuma dose se perca e "com certa tranquilidade".
Ainda para o líder da pesquisa, a interrupção e a eventual interferência política "geram transtornos", mas ele diz "querer acreditar" que isso não tenha ocorrido e que a Anvisa tenha precisado, de fato, de mais informações sobre o evento adverso ocorrido com um dos voluntários.
A interrupção, na segunda-feira (9), ocorreu por causa da ocorrência de um evento adverso grave em um dos voluntários. Segundo fontes da pesquisa, o evento foi a morte de um homem de 32 anos, com suicídio como causa provável, e que não teria nenhuma relação com o imunizante.
A suspensão provocou um mal-estar entre a agência federal e o governo de São Paulo, comandado por João Doria (PSDB), adversário político do presidente Jair Bolsonaro. O Instituto Butantan, parceiro da chinesa Sinovac na pesquisa, reclamou da postura da Anvisa de decidir pela suspensão sem esperar esclarecimentos adicionais dos pesquisadores e levantou a hipótese de interferência política na agência, principalmente após Bolsonaro comemorar a pausa dos testes, atribuindo, sem nenhuma evidência, "morte, invalidez e anomalias" à vacina chinesa e dizendo que ganhou de Doria "mais uma vez".
O estudo no RS
Segundo Ramos, o estudo no São Lucas tinha previsão de 850 participantes, mas já possui mais de 1,1 mil. As inscrições ainda estão abertas. Podem se voluntariar profissionais da saúde que estão ligados ao combate à covid-19.
O teste também ocorre na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), onde as imunizações (ou a aplicação de placebo) foram retomadas na tarde desta quarta, após terem ficado suspensas durante a vigência da decisão da Anvisa.
Na UFPel, já foram vacinados (ou receberam placebo) cerca de 300 voluntários. A meta é aplicar as doses em 800 profissionais da saúde que atuam no combate à covid-19 na região sul do Estado. Não há uma data prevista para o término dos estudos. No Brasil, são cerca de 13 mil voluntários.
Sobre efeitos colaterais, conforme o médico Fabiano Ramos, apenas 15% de 8 mil voluntários que tiveram aplicação da vacina apresentaram sintomas colaterais. Os efeitos teriam sido leves, como dor no local da aplicação.