Até meados de março, o único tipo de máscara que a Indecense havia produzido era a de sono, adereço de alguns conjuntos de babydolls e pijamas produzidos pela empresa de lingeries de Guaporé, município de 25,7 mil habitantes na serra gaúcha. Tudo mudou com a chegada do novo coronavírus ao Estado.
— Começamos produzindo para a própria equipe trabalhar com mais segurança. Em seguida, soubemos que empresas da região também tinham essa carência e produzimos pra eles. Depois, vieram pedidos de ajuda de policiais, bombeiros, lares de idosos... Enfim, nunca mais paramos — conta Loivane Dal Sant, uma das sócias da empresa que hoje lidera 60 funcionários na produção de máscaras para proteção pessoal ao longo da pandemia.
A empresa está longe de ser a única focada na confecção do equipamento. Após a Organização Mundial de Saúde (OMS) avalizar o uso como estratégia contra o vírus - embora reforçando a importância do isolamento social sempre que possível -, houve um aumento repentino da demanda por máscaras, que se tornaram, além de equipamento de segurança sanitária, opção de renda para costureiras, de passatempo para o confinamento e até adereço de moda.
A proliferação das máscaras levou o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) a disponibilizar em seu site moldes e tutoriais para empresas têxteis que desejarem produzir o equipamento, tanto para as que projetam modelos destinados a profissionais de saúde - e requerem aprovação da Anvisa - quanto para os tipos domésticos, menos restritivos. Presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Valente Pimentel aposta que o uso da máscara deverá se estender além do período de pandemia.
— As máscaras serão importantes sobretudo quando houver a retomada de alguns serviços após a quarentena. Será comum você chegar à farmácia, ao supermercado, e ser atendido por funcionários mascarados. E pode ser ainda que ela se torne algo que você leve na bolsa quando estiver resfriado, o que já é comum em países da Ásia, já que o uso estará mais naturalizado na sociedade — avalia Pimentel.
Passatempo para costureiras amadoras
Enquanto a população se acostuma a ver rostos encobertos pelas ruas, a confecção das máscaras se tornou um passatempo que mistura talento e solidariedade para costureiras amadoras, como a aposentada Heloísa Mendes, de 75 anos, que mora sozinha em um condomínio no bairro Cristo Redentor, na zona norte de Porto Alegre, e tirou o pó da máquina de costura na pandemia.
— Como estou no grupo de risco e não posso sair de casa, resolvi passar o tempo fazendo máscaras para doação. O único problema é que não posso sair para comprar tecido, então os peço em troca de máscaras. Tem um lado positivo, porque elas ficam mais coloridas e diferentes. Não é aquela máscara branca que você lembra de doença e hospital — opina Heloísa, que já confeccionou cerca de 120 máscaras e agora tem os primeiros pedidos na casa das dezenas por vez.
Complemento de renda
Mais do que passatempo, a confecção de máscaras virou um complemento de renda para Antônia Gruske Medeiros, 58 anos. Costureira desde os nove anos, a primeira produção contra a covid-19 foi para proteger a filha Débora, que sofre de asma. Depois, passou a fornecer modelos coloridos e estampados para uma farmácia próxima, sempre laváveis e de dupla face, conforme recomenda o Ministério da Saúde.
— Além de uma distração, é um recurso que vem em boa hora porque não sei o que vai ser do futuro. Estou em férias coletivas até o dia 18. Depois, não sei o que vai acontecer — conta Antônia, que é técnica de fotodepilação em uma estética temporariamente fechada.
Mesmo a Indecense, em Guaporé, admite que o foco na produção de máscaras ocorreu também porque a pandemia interrompeu o fluxo de caixa da empresa, que viu os pedidos de lingerie minguarem naquela que deveria ser a melhor época do ano, às vésperas do Dia dos Namorados. Hoje, ela divide a produção de cerca de 2 mil máscaras por dia em vendas para a região e em doações a entidades.
— Quem imaginaria que os tecidos de lingerie acabariam servindo para proteger a saúde dos velhinhos? Mas que bom que podemos contribuir de alguma forma — declara Loivane, resignada.
A máscara ideal
- Em 3 de abril, a OMS recomendou o uso de máscara como um instrumento contra o novo coronavírus em momentos em que o isolamento social é inevitável, como em transportes públicos ou em idas ao supermercado;
- As máscaras de uso doméstico não seguem os mesmos parâmetros do que as de profissionais da saúde: estas devem obedecer a padrões mais rígidos da Anvisa, que regula tanto a matéria-prima quanto o produto final dos equipamentos médicos;
- Para uso doméstico, a recomendação é de que o uso do tricoline, um tipo de tecido feito de algodão leve e resistente, mas que permite a respiração, e ter sempre dupla face. A máscara pode ter diferentes modelos, mas deve sempre cobrir boca e nariz e ficar rente ao rosto;
- A recomendação é de uso individual por até duas horas. Após a utilização, o produto deve ser higienizado com sabão neutro.