Os problemas de saúde mental entre estudantes despertaram a atenção das universidades brasileiras, que têm criado uma série de serviços e programas de suporte a alunos e de prevenção ao suicídio. Essas iniciativas, no entanto, ainda são incipientes, em muitos casos, e se ressentem de estrutura insuficiente para dar conta de todas as demandas.
Maior instituição de Ensino Superior do Estado, a UFRGS criou em agosto de 2018 um grupo de trabalho de saúde mental do estudante. A coordenadora, Cristina Rolim Neumann, professora de Medicina, afirma que a iniciativa surgiu porque docentes das comissões de graduação começaram a relatar que não sabiam lidar com os muitos casos de alunos em sofrimento mental.
O papel do grupo de trabalho (GT) é justamente o de estabelecer diretrizes e orientar esses profissionais das unidades de ensino da instituição. Eles têm recebido treinamento para saber como acolher e encaminhar os estudantes. Desde que foi criado, o GT também realizou ações como uma campanha de prevenção ao suicídio durante o Setembro Amarelo e o lançamento do site Saúde Mental UFRGS, que oferece informações e alternativas para buscar auxílio.
– Não temos como fazer o atendimento de todos os que estão adoecidos, mas podemos ensinar o caminho. Inclusive já levamos muitos alunos até os serviços de saúde, porque às vezes eles não têm familiares em Porto Alegre – diz Cristina.
A professora entende que o sofrimento mental é uma questão social ampla, que não está relacionada apenas à universidade, mas considera que a academia tem características que contribuem para o fenômeno.
– Os fatores de risco são estar sozinho, ter uma doença grave, ter problemas econômicos ou estar em situação não normativa dentro da sociedade. Ter um círculo social é um fator de proteção – ela diz. – Hoje, com o aumento da mobilidade acadêmica, 25% dos alunos da UFRGS são de fora. E o que acontece com o aluno que vem de fora é que ele não tem círculo social aqui. São realmente os que geram maior preocupação, junto àqueles que já tinham história prévia de doença emocional. Outra preocupação é que vários auxílios que os alunos recebiam tiveram verba cortada, e isso é sério porque os cortes incidem fundamentalmente no aluno de baixa renda. Tu és pobre, aí ficas negativo no cartão de crédito. É uma coisa perigosa. E, se não tem a família perto para ajudar, complica. Precisamos de uma agenda positiva, que melhore a qualidade de vida, porque é melhor prevenir do que só tratar pessoas doentes – observa Cristina.
A UFSM também criou, em agosto do ano passado, um comitê de saúde mental, que está se estruturando e que terá como missão definir medidas de proteção. Entre os integrantes está a psiquiatra Martha Noal, que coordena um projeto de prevenção ao suicídio que funciona na estrutura do Hospital Universitário. Entre as iniciativas na UFSM, Martha cita também uma liga de alunos da área da saúde, que trabalham na proteção dos colegas, sob a coordenação de um professor.
– A universidade vem mobilizada com isso. O problema está com muito mais visibilidade. Não posso dizer em termos estatísticos, mas a impressão é de que os números estão aumentando. A população jovem está exposta. Não há pesquisas, então é difícil falar de um ponto de vista científico, mas seguramente há fatores estressores como pressões sociais, econômicas e políticas, além de situações como homofobia e racismo. Também me parece que essa nova geração não foi capacitada para lidar com frustração.
Os psicólogos da Unipampa se manifestaram por meio de um texto escrito em conjunto. São cinco profissionais, em atuação na instituição desde 2018, que se uniram para criar o Projeto Saúde Mental na Unipampa, que “visa informar, debater e sensibilizar as comunidades acadêmicas de cada campus a respeito das questões sobre qualidade de vida, saúde mental e do sofrimento psíquico”. Como parte do projeto, são realizadas reuniões, rodas de conversa e círculos de reflexão, “priorizando as atividades coletivas e que oportunizam o crescimento e desenvolvimento de forma global”.
A equipe da Unipampa acredita que a incidência de casos na instituição não é maior do que fora da universidade, o que “não apaga o fato de que o ambiente acadêmico seja potencialmente ansiogênico”.
Os profissionais chamam a atenção para o período da vida dos universitários: “A fase de idade da maioria dos discentes que chegam à universidade é indicativa ainda do período final da adolescência, o que implica que psicologicamente eles estão passando por um momento ainda não bem definido das suas personalidades. É um período em que se esperam vacilações e fragilidades”.