O consumo habitual de mais de três xícaras de café de 50 ml por dia aumenta em até quatro vezes a chance de pessoas geneticamente predispostas apresentarem pressão arterial alta. A descoberta faz parte de um estudo desenvolvido na Universidade de São Paulo (USP) e publicado na revista Clinical Nutrition. Estudo anterior mostra, por outro lado, que o consumo moderado de café (de uma a três xícaras por dia) tem efeito benéfico sobre alguns fatores de risco cardiovascular — particularmente a pressão arterial.
A principal autora do estudo, Andreia Machado Miranda, pós-doutoranda no Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP (FSP-USP), explica que essa conclusão chama atenção para a importância da relação entre o consumo de café e a prevenção da pressão alta.
— Como a maior parte da população não tem ideia se é predisposta ou não para desenvolver a pressão alta, o ideal é que se faça um consumo moderado de café. Até onde nós sabemos, pelos nossos estudos e por outros já publicados, esse consumo moderado é benéfico para a saúde do coração — apontou.
A escolha do café para avaliar essa associação se deu por ser uma das bebidas mais consumidas entre os brasileiros. A pesquisa aponta que ele pode ser protetor para a saúde do coração se usado de forma moderada, mas também pode ser vilão para pessoas predispostas a hipertensão e em doses exageradas. Segundo Andreia, isso ocorre porque o café é uma mistura de mais de 2 mil compostos químicos.
— A hipótese do nosso estudo é que mais de três xícaras podem aumentar as chances (de pressão alta) pela presença da cafeína. A cafeína está associada com a resistência vascular, ou seja, a dificuldade com a passagem do fluxo nos vasos, e também provoca vasoconstrição, que é a contração a nível dos vasos sanguíneos, o que dificulta a passagem do fluxo e tudo isso faz com que haja um aumento da pressão arterial — explicou.
Os polifenóis, por sua vez, seriam os responsáveis pelas ações benéficas.
— São compostos de origem vegetal que não são sintetizados pelo organismo, então precisam ser obtidos pela dieta. Eles têm elevado poder antioxidante, têm uma ação antitrombótica, que significa que impedem a formação de trombos nos vasos e promovem uma melhoria da vasodilatação, ao contrário do efeito da cafeína — elencou a pesquisadora.
Como foi realizada a pesquisa
A pesquisa é baseada em dados de 533 pessoas entrevistadas no Inquérito de Saúde do Município de São Paulo (ISA), de 2008. O levantamento estadual obteve dados sociodemográficos e de estilo de vida, como idade, sexo, raça, renda familiar per capita, atividade física e tabagismo por meio de um questionário aplicado a mais de 3 mil participantes. Além disso, foram colhidas informações sobre consumo alimentar e feita coleta de sangue para análises bioquímicas e extração de DNA para genotipagem. Em visita domiciliar, foram medidos o peso, a altura e a pressão arterial dos voluntários. Para a pesquisa desenvolvida por Andreia, foi utilizada uma mostra representativa de adultos e idosos.
— Com todos esses dados, fizemos o estudo de associação entre pressão arterial, genética e influência do café. Foi aí que concluímos que indivíduos que tinham uma pontuação mais elevada no score, ou seja, que eram geneticamente predispostos (a pressão alta), e que consumiam mais de três xícaras de café por dia, tinham uma chance quatro vezes maior de ter pressão alta em relação a quem não tinha predisposição — explicou a pesquisadora.
A pesquisa, que tem apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), vai avaliar agora o efeito do consumo de café em pacientes com doença cardiovascular – particularmente a síndrome coronariana aguda, causada por obstrução na artéria coronária, que irriga o coração. Os pesquisadores vão avaliar, durante quatro anos, os dados de acompanhamento de 1.085 pacientes que sofreram infarto agudo do miocárdio ou angina instável e foram atendidos pelo Hospital Universitário da USP.