Sob pressão de entidades médicas, o Conselho Federal de Medicina (CFM) cedeu mais uma vez e anunciou ter revogado a resolução que liberaria, a partir de maio, a realização de consultas, diagnósticos e outros procedimentos a distância – via internet, por exemplo.
No começo deste mês, depois de um levante dos conselhos regionais, o CFM já havia recuado, abrindo um prazo de 60 dias para que fossem apresentadas sugestões para aprimorar a resolução. Entidades da área, no entanto, consideraram a medida insuficiente. Na terça-feira (19), em assembleia conjunta do Conselho Regional de Medicina (Cremers), do Sindicato Médico (Simers) e da Associação Médica (Amrigs), os médicos gaúchos decidiram encaminhar ao CFM um pedido de revogação completa. Iniciativas semelhantes vinham se multiplicando país afora.
Nesta sexta-feira (22), o CFM comunicou oficialmente que seus conselheiros, "sensíveis às manifestações dos médicos brasileiros e das entidades representativas da classe", decidiram revogar a medida.
Uma das principais críticas dizia respeito à forma como a resolução foi elaborada. As normas foram divulgadas de surpresa, sem debates com a classe médica ou a sociedade. O teor também assustou. A chamada resolução da telemedicina parecia inaugurar uma era em que pacientes veriam os médicos apenas pelo Skype e seriam operados remotamente, por meio de um robô.
Na ocasião, o presidente do Cremers, Eduardo Trindade, disse temer "uma situação em que o médico não tem mais contato com o paciente, em que a relação é impessoal" e defendeu a necessidade de "resguardar o exame físico, a relação médico-paciente seriada, em que não apareça cada vez um médico diferente na tela":
— Não queremos ser reféns de uma nova estrutura que vai surgir entre o médico e o paciente. Pela resolução, o médico não incorpora a tecnologia, ele acaba virando refém de um sistema.
Ontem, Trindade saudou a decisão do CFM, que permitirá construir uma nova resolução a partir do zero, com discussões na categoria médica e na sociedade.
— A decisão do CFM não nos surpreendeu, porque foi muito grande a revolta. Poucas questões uniram tanto a classe médica como a contrariedade com essa resolução, que estava muito mal feita. Era fundamental promover uma discussão ampla, que é o que vamos fazer a partir de agora.
Segundo Trindade, os debates que estavam programados para levantar sugestões de mudanças na resolução publicada pelo CFM serão mantidos, agora com a finalidade de subsidiar a construção de um texto novo.
Entenda o atendimento médico a distância
Como era/é até então
- Telemedicina era realizada apenas entre médicos, como uma segunda opinião.
- Alguns hospitais universitários já usavam a modalidade, mas em caráter experimental.
O que mudaria com a nova regra
- Nova resolução define a prática de teleconsulta e estabelece regras, como necessidade de que o primeiro atendimento seja presencial. Estabelece ainda intervalo de no máximo quatro meses para consultas presenciais — no caso de pacientes crônicos, por exemplo.
- Também prevê que atendimento seja gravado e armazenado seguindo critérios, com proteção garantida para sigilo. Caso paciente não concorde com a gravação, consulta não pode ser realizada.
- Caso o médico prescreva exames e medicamentos, documento deve conter dados de identificação, registro de data e hora e assinatura digital do médico.
- Na telecirurgia, os procedimentos devem ocorrer em espaços com infraestrutura, com médico que opere equipamento robótico e outro que acompanhe o paciente no local.
Glossário da telemedicina
Telemedicina
Termo usado para definir o exercício da medicina mediado por tecnologias para fins de assistência, educação, pesquisa, prevenção de doenças e lesões e promoção de saúde.
Teleconsulta
É a consulta médica mediada por tecnologias, com médico e paciente em diferentes locais.
Teleinterconsulta
Ocorre quando há troca de informações e opiniões entre médicos para auxílio diagnóstico ou terapêutico, clínico ou cirúrgico.
Telediagnóstico
Consiste na emissão de laudo ou parecer de exames pela internet.
Telecirurgia
É um procedimento feito por um robô ou outra tecnologia manipulada por um médico que está em outro local, desde que com presença de outro médico, com a mesma habilitação do cirurgião remoto, que possa atuar no caso de intercorrências.
Teleconferência cirúrgica
Feita por videotransmissão, é permitida desde que o grupo receptor das imagens, dados e áudios seja formado por médicos.
Teletriagem médica
Ocorre quando o médico faz uma avaliação, a distância, dos sintomas para a definição e direcionamento do paciente ao tipo adequado de assistência necessária.
Telemonitoramento
Permite que um médico avalie a distância as condições de saúde dos pacientes. Pode ser usada em casas de repouso para idosos ou em comunidades terapêuticas.
Teleorientação
Preenchimento a distância, pelo médico, de declaração de saúde para a contratação ou adesão a um plano de saúde
Teleconsultoria
Permite troca de informações entre médicos, gestores e profissionais de saúde sobre procedimentos e ações de saúde
Fontes: resolução 1.643/2002 e resolução 2.227/2018