Três importantes entidades médicas do Rio Grande do Sul se mobilizaram para que seja revista a resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que libera a realização de consultas, diagnósticos e outros procedimentos de saúde a distância. Na tarde de segunda-feira, representantes do Conselho Regional de Medicina (Cremers), do Sindicato Médico (Simers) e da Associação Médica (Amrigs) se reuniram para discutir o assunto e produziram uma nota conjunta em que manifestam um ponto de vista crítico em relação ao documento do CFM.
Conforme a nota, as entidades “esclarecem e reiteram que não participaram da elaboração da medida e que têm inúmeras críticas e sugestões para a melhor incorporação dessa tecnologia à boa prática médica e para a saúde da população”. A expectativa é de que a resolução sobre telemedicina seja publicada nesta semana pelo CFM, liberando atividades que hoje estão vedadas, como consultas e diagnósticos pela internet.
Atualmente, o permitido são teleconsultorias, oferecidas por serviços como o TelessaúdeRS, em que médicos discutem casos com outros.
O objetivo das entidades médicas do Estado é frear o processo e ampliar o debate. Representantes serão enviados a Brasília, sede do CFM, para levar esse pleito.
— Esperamos que essa resolução seja rediscutida e modificada em muitos pontos. Reivindicamos que seja colocada em stand by para isso. Achamos que a sociedade civil tem de ser ouvida. A resolução foi lançada de cima para baixo. Não foi democrático e não houve discussão com quem mais interessa, que é o paciente, e quem atende esse paciente, os médicos — diz o presidente do Cremers, Eduardo Trindade.
Reivindicamos que seja colocada em stand by para isso. Achamos que a sociedade civil tem de ser ouvida. A resolução foi lançada de cima para baixo. Não foi democrático e não houve discussão com quem mais interessa, que é o paciente, e quem atende esse paciente, os médicos.
O presidente do Simers, Marcelo Matias, também critica a forma como o CFM elaborou as medidas, sem participação da categoria:
— Ninguém discute a importância e o futuro da telemedicina no atendimento à saúde da população. Não tem como ser contra a evolução. Entretanto, uma resolução que muda o atendimento médico dessa forma, inclusive terminando a relação médico-paciente, acabando com a possibilidade do exame físico, não poderia ter sido elaborada sem uma ampla discussão com a categoria. Criaram uma resolução que carece completamente de democracia, carece um pouco de lógica e carece integralmente de discussão. Temos obrigação de fazer a crítica e de chamar a atenção do CFM. Minha suspeita é de que essa resolução vai ser suspensa, porque foi feita de maneira extremamente inadequada.
Matias identifica acertos, mas considera que a resolução também traz muitos erros:
— A resolução tem coisas absolutamente corretas, como a possibilidade de conferências médicas, que é algo que sempre fizemos.
Da mesma maneira, a realização de exames remotos já está pacificada e não vejo problema nisso. Mas a resolução também possibilita que sejam feitas cirurgias apenas com um cirurgião em campo e outro remotamente, o que é um problema. Entendo o objetivo de economia, mas, se sou paciente e vou ter só um médico na sala, não me sinto seguro, porque se acontecer qualquer coisa com esse médico, não há a possibilidade de um backup imediato. É uma economia que aumenta o risco.
O presidente do Cremers lembra outros pontos de preocupação:
— Somos favoráveis à incorporação de novas tecnologias no tratamento médico, mas acreditamos na importância do exame físico. Vemos com muitas ressalvas a possibilidade de fazer consulta sem presença do profissional médico. Nos moldes em que foi feita, a resolução dá margem para a centralização de atendimentos médicos a distância, sem nunca o paciente ter sido visto, colocando em risco a saúde dele. A mesma coisa vale para o diagnóstico. A gente não pode fazer experimentação com paciente. Depois, se dá errado, não é simplesmente passar uma borracha, porque alguém morreu ou teve uma sequela permanente.
GaúchaZH contatou o Conselho Federal de Medicina, buscando uma posição sobre as críticas e sobre a possibilidade de a resolução ser suspensa e rediscutida, mas não recebeu retorno até o início da noite.
O que prevê a resolução
- Permite a prática de teleconsulta e estabelece regras, como a necessidade de que o primeiro atendimento seja presencial. Determina ainda intervalo de no máximo quatro meses para consultas presenciais, no caso de pacientes crônicos, por exemplo.
- A exceção são comunidades remotas, como áreas próximas a florestas, em que o primeiro atendimento também pode ser virtual. Para isso, o paciente precisa estar acompanhado de outro profissional de saúde.
- Estabelece que o atendimento seja gravado e armazenado, com proteção garantida para sigilo. Caso o paciente não concorde com a gravação, a consulta não pode ser realizada.
- Caso o médico prescreva exames e medicamentos, o documento deve conter dados de identificação, registro de data e hora e assinatura digital do médico.
- No caso do telediagnóstico, o documento do CFM permite que médicos avaliem exames e elaborem laudos a distância, desde que haja um profissional de saúde ao lado do paciente para ajudá-lo e manejar equipamentos específicos.
- Na telecirurgia, os procedimentos devem ocorrer em espaços com infraestrutura, com um médico que opere equipamento robótico a distância e outro que acompanhe o paciente no local, para evitar problemas e falhas – em casos de queda de energia, por exemplo.