Um ano e mais de sete meses do nascimento prematuro de Bianca Vitória Silbershlach Cézar, no Hospital Universitário de Santa Maria (Husm), ainda há muitas dúvidas sobre como a menina foi declarada morta e, seis horas depois do atestado de óbito, foi constatado que ela estava viva. Isso porque nenhum dos seis procedimentos investigativos abertos, nas esferas administrativa, criminal e cível, foi finalizado ou está perto de ser concluído.
Até hoje, os profissionais envolvidos no parto não foram ouvidos, em nenhuma instância. O primeiro depoimento deles deve ser tomado nesta quinta-feira (11) pela Comissão de Análise de Óbitos e Biópsias e pelo Comitê de Ética do Husm.
Bianca nasceu em uma cesariana de urgência. A sua mãe era gestante sob risco (estava com pressão alta mórbida, chamada de eclâmpsia). A bebê foi declarada morta ao nascer pelo obstetra Marcelo Lorensi Feltrin. Pediatras tentaram reanimá-la durante 20 minutos (o dobro do tempo usual). Após o atestado de óbito, ela foi levada a uma sala chamada expurgo (ou descarte), onde ficam bebês mortos no setor obstétrico do hospital. Seis horas depois, uma enfermeira percebeu que a menina respirava. Médicos foram mobilizados e confirmaram que Bianca estava viva. Até hoje não se sabe que técnicas foram usadas para registrar o óbito e nem as usadas na reanimação.
Bebê segue internada em Porto Alegre
Filha da dona de casa Tieli Martins Silbershlach e do borracheiro Marcos Renato dos Santos Cézar, Bianca sofre de microcefalia (o cérebro é menor do que o normal) e hidrocefalia (há acúmulo de líquido no crânio, impedindo o desenvolvimento cerebral). Ela já passou por 25 cirurgias e está internada na UTI pediátrica do Hospital da Criança Santo Antônio, em Porto Alegre, “sendo avaliada diariamente quanto à necessidade de novos procedimentos”, segundo a assessoria de imprensa da instituição.
Confira como estão os procedimentos:
Hospital Universitário de Santa Maria (Husm)
O hospital instaurou sindicância para apurar possível erro médico na semana em que Bianca nasceu. O procedimento prossegue e está sob sigilo. É aguardada perícia das condições do parto, ainda não realizada. Os envolvidos na cirurgia ainda não foram ouvidos.
Uma outra investigação foi aberta pelo Comitê de Ética e pela Comissão de Análise de Óbitos e Biópsias do Husm. O setor não foi avisado da existência de queixa de negligência pós-parto, notificação prevista nos regulamentos do hospital. Integrantes do comitê analisaram, na semana passada, os prontuários do caso. Está prevista para esta quinta-feira a coleta de depoimentos de médicos obstetras, pediatras e enfermeiros envolvidos no parto de Bianca.
Polícia Civil
Inquérito por lesão corporal gravíssima em Bianca foi instaurado pela 4ª Delegacia de Polícia Civil de Santa Maria em fevereiro de 2017, logo após o nascimento da menina. Os pais dela foram ouvidos no início da investigação. Desde então, praticamente não houve avanço. Os policiais alegam que faltaram diversos documentos necessários à investigação, como prontuários do bebê e da mãe dela. O hospital argumenta que enviou em julho e agosto de 2017 os documentos, mas outros teriam se perdido em decorrência de um e-mail mal preenchido. A Polícia Civil encaminhou semana passada todo o material coletado para a Polícia Federal, porque o caso ocorreu numa repartição federal (o Husm).
Polícia Federal
Instalou inquérito em agosto. Aguarda documentos dos procedimentos feitos pela Polícia Civil, para evitar duplicação de esforços. Ainda não colheu depoimentos. Conforme o advogado do obstetra Marcelo Feltrin, está previsto interrogatório dele para a próxima semana.
Conselho Regional de Medicina (Cremers)
Declarou que soube do caso pela imprensa, um ano e meio após o ocorrido. Aguarda resultado das sindicâncias no hospital para abrir investigação.
Justiça
Foi aberta ação cível, de indenização por danos morais e materiais, no fórum de Santa Maria. O processo é movido pelos pais de Bianca, a dona de casa Tieli Martins Silbershlach e o borracheiro Marcos Renato dos Santos Cézar. Está na fase de coleta de documentos, como o prontuário e a lista de envolvidos no fato. Há um pedido de perícia, que ainda não foi feita. A equipe médica ainda não foi ouvida, nem os familiares da vítima.