Embora muita gente seja capaz de falar da morte sem rodeios, ainda há muito que aprender sobre a forma de lidar sensatamente com sua consequência: o luto, ou a reação natural à perda de um ente querido. Não são muitos os que sabem o que dizer ou fazer e que seja realmente útil para um familiar, amigo ou conhecido enlutado. Na verdade, não são muitos os que sofreram uma perda dolorosa e sabem ajudar a si mesmos.
Dois livros novos, lançados nos Estados Unidos, de psicoterapeutas que já trabalharam extensivamente no campo da perda e do luto, estão repletos de histórias e orientações que podem ajudar tanto quem sofre quanto as pessoas à sua volta a evitar as armadilhas e mal-entendidos ligados à dor — ambos também tentam corrigir pressupostos falsos sobre sua forma e duração.
It's OK That You're Not OK (Tudo bem que você não esteja bem, em tradução livre), de Megan Devine, de Portland, Oregon, tem um subtítulo revelador: "Como reconhecer a perda e o luto em uma cultura que não os compreende". Ele é resultado da perda trágica do marido da autora, que se afogou aos 39 anos, quando o casal estava em férias. Grief Works: Stories of Life, Death and Surviving (Trabalho no luto: histórias de vida, morte e sobrevivência, em tradução livre), de Julia Samuel, que trabalha com famílias enlutadas em sua clínica particular e na rede pública de saúde inglesa, é especialmente esclarecedor por abordar a maneira como as pessoas lidam com tipos diferentes de perdas.
As duas obras têm em comum uma mensagem reveladora. Nas palavras de Julia, "não existe certo ou errado no luto; temos que aceitar qualquer que seja a forma que ele tome, em nós e nos outros". Reconhecendo que a perda é uma experiência universal, Megan acredita que "se conseguirmos começar a compreender a verdadeira natureza do luto, poderemos desenvolver uma cultura mais útil, amorosa e solidária".
Não há forma ou período "normal"
As duas autoras enfatizam que o luto não é um problema a ser resolvido ou solucionado. Pelo contrário, é um processo a ser zelado e vivido em qualquer forma que tome e por qualquer período de tempo.
"O processo não pode ser apressado por amigos ou familiares", por mais bem-intencionado que seja o desejo de aliviar a angústia da pessoa enlutada, escreveu Julia. "A recuperação e o ajuste podem levar muito mais tempo do que a maioria imagina."
Todo mundo pode se beneficiar aprendendo a como reagir de forma a não prolongar o luto, intensificá-lo ou rejeitá-lo. Da mesma forma, quem tenta ajudar precisa saber que a dor não pode ser encaixada em um período de tempo ou forma de expressão pré-estabelecidos. É comum a pessoa que sofre uma perda ser menosprezada porque seu pesar dura mais do que os outros consideram razoável ou porque se mantém contida, parecendo não sofrer.
Por exemplo, imagino que alguns tenham considerado "anormal" a reação impassível que tive à morte prematura da minha mãe, quando tinha 16 anos de idade. Na verdade, depois de cuidar dela um ano, durante o qual sofreu com um câncer irreversível, sua morte foi um alívio. Foi preciso outro ano para eu me livrar da armadura e chorar abertamente aquela perda incalculável. Contudo, 60 anos depois, ainda valorizo seu legado mais importante: viver cada dia como se o fosse último, mas também pensando no futuro caso não seja.
Da mesma forma, fiquei aliviada quando o sofrimento do meu marido terminou, um mês e meio depois do diagnóstico de um câncer incurável. Embora sinta muita saudade, dei a impressão de continuar vivendo como se quase nada tivesse mudado. Poucas pessoas além dos parentes mais próximos sabiam que eu estava atendendo seu último pedido, o de continuar a viver intensamente pelo meu próprio bem e dos nossos filhos e netos.
Assim como cada um ama de um jeito único, também sofremos nossas perdas de uma forma que não cabe nem uma dúzia de modelos pré-estabelecidos, quanto mais um só. No mês passado, James G. Robinson, diretor de análise global do New York Times, descreveu a viagem terapêutica de quase dez mil quilômetros e 37 dias que fez de carro com a família, após a morte do filho de cinco anos, recolhendo objetos simbólicos pelo caminho e dando a cada um a chance de expressar raiva e tristeza sobre a perda prematura.
Megan afirma que, na maioria das vezes, o apoio dado por profissionais e outras pessoas parte do princípio errado de encorajar a pessoa a deixar a dor de lado. Embora parentes e amigos naturalmente queiram que você se sinta melhor, "a dor proibida de se expressar se volta para si mesma e cria mais problemas. Inconfessa e desconhecida, não desaparece. A forma de sobreviver ao luto é permitir que ela exista, sem tentar escondê-la ou apressá-la", escreve.
Como uma mãe enlutada disse a Samuel: "A gente nunca supera, apenas aprende a conviver. Nunca 'deixa para lá', apenas segue adiante".
Uma dor sem cura
Megan afirma que ser "estimulado a 'superar' é uma das maiores causas do sofrimento dentro do luto". Em vez de tentar "curar" a dor, o objetivo deveria ser minimizar o sofrimento, o qual, segundo ela, "vem quando nos sentimos rejeitados ou desamparados na nossa dor, ao ouvir que existe algo errado no nosso sentimento".
Ela explica que o sofrimento não pode ser "curado" — que é a amizade, e não a correção, a melhor forma de lidar com o luto. E incentiva quem quer ajudar a se envolver no processo a oferecer afeição sem fazer perguntas especulativas ou dar conselhos não solicitados, amparar se for necessário e bem-vindo, e oferecer um ouvido amigo, não importa a frequência com que o enlutado queira contar sua história.
Para quem vive o luto, ela sugere encontrar uma maneira não destrutiva de expressá-lo. "Se não conseguir contar sua história a uma pessoa, tente encontrar outro canal: um diário, uma pintura, transforme a dor em história em quadrinhos com uma narrativa bem sombria. Ou vá para o mato e diga às árvores. É um alívio imenso poder contar sua história sem ter alguém para tentar consolá-lo."
Ela também sugere manter um registro das situações que intensifiquem ou aliviem o sofrimento. "Existe algum momento em que você se sente mais estável, mais pé no chão, mais capaz de encarar a perda de frente? Há alguma coisa — uma pessoa, um lugar, uma atividade — que melhore o seu nível de energia? Ao contrário, existem atividades ou ambientes que só pioram as coisas?". Sempre que possível, prefira se envolver com o que ajuda a diminuir o sofrimento e evitar o que o intensifique.
Por Jane E. Brody