Duas microrregiões de Porto Alegre foram atingidas pela enchente de maio, fazendo com que os registros de mais de 16 mil famílias fossem totalmente perdidos, porque não estavam digitalizados e eram mantidos apenas de forma impressa.
As duas sedes, microrregião 1 e 2, foram totalmente atingidas pela enchente. Nós perdemos expedientes, porque a gente ainda trabalha com papel em Porto Alegre. É gravíssimo, a gente perder toda a história de famílias inteiras, porque a gente ainda não trabalha com um sistema para ter os dados das famílias atendidas
MARIA ALICE GOULART SILVA DA SILVA
Coordenadora geral do Conselho Tutelar de Porto Alegre
Foram mais de 4 mil registros danificados na Microrregião 1, que acompanha as ilhas e os bairros Humaitá e Navegantes. Conforme o conselheiro Átila Silveira, antes da enchente, a sede tinha 4.393 expedientes abertos e ativos no arquivo. Hoje, são 4.510 em andamento e apenas 125 em no arquivo, correspondendo a apenas 2,77%.
— Isso nos afeta muito, porque dentro dos expedientes ali tinha o histórico das famílias, tinham os encaminhamentos que nós havíamos feito, tinham diversas questões que hoje a gente não consegue acessar. A grande maioria ainda não havia sido digitalizada. Então, tem afetado muito nosso dia a dia, nós temos que agora ir atrás de informações que já tínhamos aqui no Conselho — salienta Átila.
Na Microrregião 2, que engloba bairros do Norte e Noroeste da Capital, como Sarandi, mais de 12 mil expedientes foram destruídos, além de o prédio seguir sem condições de retorno.
— Isso são expedientes de famílias, o que não significa uma criança ou adolescente, porque têm famílias que têm dez crianças nesse expediente — explica Maria Alice.
Apesar de lidar com casos de violência e abusos, a atuação do Conselho Tutelar tem um papel muito mais administrativo e de cobrança de outros entes públicos.
Em casos de emergência, como uma agressão que está ocorrendo naquele instante, a orientação dos conselheiros é acionar a Brigada Militar para uma intervenção imediata. No local, a autoridade policial poderá requisitar a presença do Conselho. Já em cenários que envolvem trabalho infantil ou crianças em situação de rua, o conselheiro tutelar da microrregião 2, Cléo Teixeira, explica que é preciso buscar um atendimento específico.
— A prefeitura tem um serviço pelo 156, que é de abordagem de rua. Ele se dá pelo Ação Rua. Tu vai passar as informações, o local onde a criança está, as características. Esse serviço faz uma abordagem — esclarece Teixeira, acrescentando que muitas crianças nestas condições estão acompanhando os pais porque não conseguem vagas nas escolas.
Entre os conselheiros, também é preciso compreender que o atendimento não é imediato e depende de uma rede de órgãos públicos e do contexto social.
— É um trabalho mais burocrático do que as pessoas imaginam. É com muito papel. A gente tem momentos de averiguação, de visitas domiciliares, mas a maior parte do nosso trabalho é administrativa — explica a conselheira tutelar da microrregião 8 Vitória Sant’Anna.
Inspirada na mãe, que também atuou no Conselho Tutelar, Vitória recebeu a maior quantidade de votos na última eleição (5.066) e está na primeira gestão. Ela comenta, no entanto, que não recebeu nenhuma capacitação ou treinamento específico desde que tomou posse no começo do ano.
— Não tive nenhum tipo de capacitação desde o dia 10 de janeiro quando eu assumi. O que me auxiliou muito foi o trabalho coletivo com as minhas colegas que já foram conselheiras na gestão passada. Não teve nenhuma capacitação formal — afirma ela, no começo de setembro.
O problema foi para todos os novos conselheiros dessa gestão. Segundo a presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Porto Alegre (CMDCA), Carolina Aguirre da Silva, a formação é realizada pela entidade, além da Câmara de Vereadores e da prefeitura. Após atraso devido a enchente, Carolina diz que o CMDCA está se preparado para iniciar a capacitação no final de outubro.