Porto Alegre conta com 24 quilômetros de diques externos, incluindo a BR-290 (Freeway) e a Avenida Beira-Rio, e outros 44 internos, situados às margens de arroios. Trata-se de importante barreira integrante do sistema de proteção contra cheias da cidade. Os diques têm o papel de conter a água, minimizar o impacto ambiental e garantir a segurança das populações locais. Toda a área protegida pelos diques é chamada de pôlder.
A região do bairro Sarandi, na Zona Norte, conta com dois diques, separados por uma vala central, pela qual escoa o Arroio Sarandi (também conhecido como Arroio Passo das Pedras).
Esses diques internos seguem até o final no entroncamento com o dique externo da BR-290. Mais na divisa com Alvorada, na Região Metropolitana, ainda está localizado o Arroio Feijó. Quando diques e arroios extravasam, como no caso da cheia atual do lago Guaíba e de outros rios, as áreas do entorno sofrem com inundações.
A reportagem de Zero Hora esteve no dique do Sarandi na manhã desta terça-feira (21) e verificou os dois pontos danificados. Um deles apresenta uma fenda com cerca de 10 metros de extensão. Não há ligação entre um lado e o outro. Algumas residências localizadas ao lado da parte que caiu foram totalmente destruídas.
Após baixar a água, moradores se surpreenderam com o que viram. Marcos Everaldo Moreira vive há cinco décadas na região e demorou para acreditar que a estrutura havia desabado.
— Aconteceu o que a gente nunca tinha visto. Faz 50 anos que eu moro aqui. Eu sempre morei na encosta aí. A gente duvidava, achava que jamais ia acontecer isso aqui. Para mim foi surpreendente.
Alguns metros antes, outra falha formada na enchente foi registrada. Ela tem cerca de cinco metros. Uma tábua de madeira foi colocada para garantir a travessia dos moradores.
As duas falhas nos diques resultaram em grave inundação do bairro situado na Zona Norte.
O professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) Fernando Dornelles, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), explica como está o cenário neste momento no Sarandi.
— A casa de bombas do Dmae (Departamento Municipal de Água e Esgotos) ficou inundada e não conseguiram reativar. A maneira como a água está saindo deve ser por gravidade e apenas pelas bombas flutuantes que estão instalando. Vai demorar algum tempo para a água sair, porque isso depende da capacidade delas de expulsar essa água do pôlder — detalha.
Emprestada pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), a bomba flutuante foi acionada no domingo (19). O equipamento foi instalado ao lado da Estação de Bombeamento de Água Pluvial (Ebap) número 9, que fica às margens da Freeway. Uma segunda está sendo instalada na mesma localidade. Ela possui capacidade para drenar 2 mil litros de água por segundo.
O docente do IPH ressalta o porquê de a água ainda estar estagnada dentro do Sarandi, ao contrário do que se verifica na parte central da cidade.
— Se tivéssemos alguma comporta ali seria possível abrir para esvaziar como está sendo feito no Centro de Porto Alegre. Mas no Sarandi não temos comportas para abrir e liberar a água para o Rio Gravataí.
Prefeitura diz que não houve rompimento, mas sim extravasamento
Na noite de segunda-feira (20), a prefeitura afirmou, por meio da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SMSUrb), que houve rompimento em dois pontos do dique do Arroio Sarandi. Os dois trechos estão situados na Vila Nova Brasília, uma das regiões mais afetadas no bairro da Zona Norte.
Nesta terça, o secretário da pasta, Assis Arrojo, negou que tenha falado em "rompimento".
— No dique da Fiergs (Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul), estamos recompondo onde tinha extravasado em três pontos. No dique do Sarandi está saindo água em dois pontos — menciona, dizendo que a água já estaria inclusive voltando pelo mesmo caminho para o próprio dique do Sarandi.
— Para nós, os diques extravasaram, tanto o da Fiergs quanto o do Sarandi — diz.
A Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SMSUrb) ainda enviou uma nota sobre a situação:
"A Secretaria Municipal de Serviços Urbanos explica que não houve rompimento do dique do Sarandi. A estrutura extravasou em dois pontos devido à elevação e força da água. Durante o período de cheia, não foi possível identificar a profundidade e largura do dano na estrutura. Técnicos da prefeitura seguem monitorando constantemente o local."