A Polícia Civil abriu um inquérito para apurar as circunstâncias envolvidas na morte de Luiz Antônio dos Santos Nascimento, um menino autista de 8 anos, ao cair em um córrego no bairro Coronel Aparício Borges, na zona leste de Porto Alegre. O valão, localizado nos fundos do terreno da família, havia transbordado devido às fortes chuvas.
A investigação é conduzida pela delegada Elisa Ferreira de Souza. O trabalho se encontra na fase de coleta de depoimentos e de aguardo do laudo pericial por parte do Departamento Médico Legal.
Nesta sexta-feira (1º), a morte do garoto completa uma semana. O tio da vítima, Arleu Nascimento, acredita que, por gostar bastante da praia do Lami, Luiz Antônio pode ter achado que se tratava de uma. Ele destaca que o sobrinho não costumava sair de casa sozinho — o que aconteceu naquela data.
— Ele vinha no pátio, brincava, mas sempre acompanhado. Aquele dia, escapou e foi direto (para o córrego). Só que não teve volta. O policial que retirou ele de dentro disse que não é só água, tem um lamaçal.
A mãe Nilza dos Santos Nascimento ainda custa a acreditar que a perda do filho seja verdade.
— Tá muito difícil. Eu tenho que tomar remédio pra ajudar. A mente tá bloqueada. Acompanhei todo preparativo do sepultamento, eu vi ele no Hospital de Pronto-Socorro, mas, para mim, é um pesadelo — lamenta.
Dmae admite falha em procedimento
Uma semana antes do dia 24, um vizinho entrou em contato com o Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) para pedir a limpeza emergencial da tubulação e das galerias pluviais da região. Conhecedor do valão, Joselito Prestes se deu conta de que havia algo de errado com o córrego.
— Por morar aqui há mais de 30 anos, eu conheço o riacho, que depois da chuva tem que descer rápido. Eu percebi que não estava descendo. No dia 17, comecei a ligar para o 156, abri protocolos para que viessem aqui. Choveu mais um pouco, subiu a água na minha casa, abri mais protocolos sobre isso — relembra o eletricista com os números dos protocolos abertos em mãos.
No entanto, nenhum serviço foi realizado. A desconfiança do morador fazia sentido: uma galeria em um terreno das proximidades havia desmoronado, dificultando o escoamento. O fato foi confirmado pelo Dmae.
— Aquele é um ponto aberto de um córrego, de um arroio, e daquele ponto em diante o trecho é formado por antigas galerias que passam por dentro de um antigo CTG da Polícia Civil e, mais a frente, pela Escola da Brigada Militar (BM). Dentro da área da BM, uma galeria de difícil manutenção cedeu, obstruindo o canal onde o córrego passa, represando mais para trás — explica o diretor-geral do órgãos, Maurício Loss.
O diretor confirma que vários protocolos foram abertos pela comunidade para limpeza do local, mas lamenta não ter sido possível chegar a esse ponto no bairro Coronel Aparício Borges a tempo.
Apesar do bairro estar localizado na Zona Leste e da família do menino morar ao lado de Joselito, o endereço do vizinho constava, nos sistemas do Dmae, como pertencendo à área de atendimento da Zona Sul.
— O trecho onde houve a fatalidade fica na divisa de duas distritais. Os protocolos eram abertos pelo vizinho, seu Joselito, que mora na Rua Patrimônio. Essa rua era atendida pela distrital Sul. E a Rua Maria Luiza Peres, que era onde morava o menino, ficava na distrital Leste. Então, tivemos um erro de tramitação interna, em que os protocolos da Patrimônio nunca foram destinados à distrital Leste para que fossem atendidos — relata Loss.
Família buscará responsabilização
A área onde vive a família de Luiz Antônio é considerada de altíssimo risco. A própria residência dá sinais de instabilidade do terreno. Rachaduras, em uma das paredes da casa, podem ser percebidas pelos moradores.
— Nós estamos aqui desde 2006, quando a minha mãe, agora falecida, conseguiu comprar essa casa. A gente paga imposto, paga tudo. A gente sabia que era perigoso por causa do valão, mas que era de risco tão alto assim como eles falaram, não — diz Nascimento.
O tio do menino acrescenta que o município prometeu, nos últimos dias, tirá-los dali, fazendo a remoção para um lugar mais seguro. Porém, na visão dele, essa ajuda chegou tarde demais. A irmã, Nilza, e mãe da vítima, garante que buscará a responsabilização do poder público.
— Ele não pode ter morrido em vão. Tem que ter justiça — conclui.
Município promove assistência
A direção do Dmae informou que está preparando a realização de conserto da galeria para que o canal seja desobstruído. A previsão é de que as máquinas sejam deslocadas para o terreno da Brigada Militar ainda nesta semana.
De acordo com o diretor Maurício Loss, a prefeitura está dando toda assistência necessária à família, de suporte psicossocial a auxílio funeral.
Durante a quarta-feira (29), equipes da Fundação de Assistência Social e Cidadania e da Defesa Civil estiveram no endereço. Um relatório está sendo elaborado pela Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) e pelo Departamento Municipal de Habitação (Demhab).