Se moradores de casas irregulares em áreas de risco do Morro da Polícia, no bairro Aparício Borges, zona leste de Porto Alegre, não deixarem os imóveis imediatamente, correm risco de morrer em eventuais deslizamentos de terra, como o que aconteceu na última sexta-feira (16). Esta era a mensagem levada por funcionários do Departamento Municipal de Habitação (Demhab) na manhã desta quarta (21) à região do Beco Guajuviras, onde os escombros de um imóvel de madeira derrubado pela chuva, cobertos por terra e pedras, seguem fazendo pressão sobre casas vizinhas.
O cenário é de preocupação. Se, por um lado, a prefeitura oferece ajuda de R$ 600 por mês para que cada família alugue outro imóvel em algum lugar seguro, não havia tempo suficiente para que isso fosse feito antes de voltar a chover — os primeiros pingos começaram a cair por volta das 14h desta quarta (21).
A alternativa mais realista é ir para a casa de parentes ou amigos. Há, ainda, quem permaneça em suas casas, ignorando a avaliação do engenheiro do Demhab que visitou a região nesta manhã. A ação desta quarta foi pontual, nos locais onde há risco considerado iminente de desabamento.
— O pedido é para que não durmam nessas zonas de risco hoje (quarta-feira). A previsão é de 60 milímetros (de chuva) nos próximos três dias. Precisamos evitar mortes em Porto Alegre — explica o titular do Demhab, André Machado.
A reportagem de GZH acompanhou visitas de servidores do departamento a cinco imóveis nesta manhã. Apenas uma moradora conversou com o engenheiro e a assistente social. Ela ouviu explicações sobre os riscos de desabamento da casa onde vive e alternativas oferecidas pela prefeitura, assinando um termo em que rejeita a ajuda do Executivo municipal neste momento.
Em outras três casas com sinais de desabamento iminente, os moradores não atenderam aos chamados, com palmas, feitos pelos servidores do Demhab.
— Tem que fazer um caminho pra água descer, porque cada chuva faz uma cachoeira aqui — dizem trabalhadores que abordaram a reportagem na Rua Claudionor Morais, apontando para vielas com chão coberto de terra e degraus improvisados com pedras.
Eventuais obras de drenagem não são mencionadas pela prefeitura neste momento. Os destroços das casas que caíram na madrugada de sexta-feira seguem no mesmo lugar, piorando o risco de desabamento sobre o Beco Guajuviras, pois não há condição de acesso por máquinas.
Segundo o Demhab, os escombros terão de ser retirados manualmente. Ainda não há, no entanto, contrato de trabalho para a realização deste trabalho, que é responsabilidade da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SMSUrb).
Moradores querem receber auxílio, mas têm dificuldade para encontrar novas casas
José Luis Rodrigues, 31 anos, foi dormir com o barulho da chuva no telhado na noite de sexta. Dividia a cama de casal com a esposa e dois filhos, um menino de três anos e uma bebê de um ano e meio. Acordou com as paredes de madeira da casa se quebrando, cedendo à força da terra, e um imóvel vizinho caído.
— Foi um pânico, mas ainda bem que não paralisei e conseguimos sair. Seguimos a luz que vinha da rua, porque estava tudo escuro, sem energia dentro de casa — conta Rodrigues, que precisou quebrar outras paredes internas para sair do local com a esposa.
Desde então, eles estão abrigados na casa de parentes, na rua ao lado. Estudam a possibilidade de alugar algum imóvel e receber os R$ 600 oferecidos pela prefeitura, mas ainda não encontraram nada na região.
— Trabalho com construção civil e me criei aqui nesta casa, é o bairro onde nos conhecem e vivemos desde sempre. Difícil encontrar um lugar — comenta.
Tatiane Oliveira, 34, é vizinha de Rodrigues e conta que acordou com estrondos e gritos na madrugada chuvosa de sexta. Ela, o esposo e a filha de nove anos já decidiram ingressar no programa do aluguel social da prefeitura, mas ainda não acharam um imóvel. Até lá, eles seguem em casa, em uma moradia que, na avaliação do Demhab, corre risco de desabar.
Com caderno e caneta na mão, Tatiane anotava tudo que ouvia dos servidores da prefeitura na manhã desta quarta. Era possível ver no rosto dela o dilema de deixar a própria casa para trás.
— Desde o ano passado, quando uma árvore caiu sobre o telhado, pensamos em sair, mas gastamos muito na reforma. Agora estou pensando em sair mais rápido, alugar por conta própria e depois pedir o auxílio da prefeitura. Nunca pensei que fosse tão difícil encontrar casa para alugar — diz.
Ao ser comunicada que, depois de desocupadas, as casas em áreas irregular são demolidas, o semblante dela muda.
— Dá uma dor no coração pensar nisso, né? — desabafa.
— Mas a dor maior seria ver minha filha morrer aqui — complementa.
Como pedir o auxílio
O Demhab oferece R$ 600 por mês a até 150 famílias que tenham a casa impactada pelas chuvas e deslizamentos dos últimos dias. O benefício não é dado à família, mas pago diretamente ao proprietário do imóvel que a família alugar, mediante documentação comprobatória.
Quem estiver nessas condições precisa pedir o benefício presencialmente na sede do departamento, na Avenida Princesa Isabel, 1.115. Dúvidas podem ser sanadas pelo telefone (51) 3289-7210. Quem não consegue se deslocar até o departamento pode telefonar e pedir uma visita.
De acordo com o levantamento das equipes, foram cadastradas 31 famílias da Travessa São Luís, no Partenon, 18 na Cascata e 10 no Beco Guajuviras, no bairro Aparício Borges. Nesta quarta (21), as equipes do Demhab circulam no Morro da Polícia e no bairro Cascata, regiões que inspiram cuidado emergencial devido ao perigo de desmoronamento.
— Nossa preocupação neste momento é com as vidas. O patrimônio fica para um segundo momento. O ginásio (do Demhab, na Santana, que foi utilizado no final de semana), só voltará a ser aberto em caso de necessidade. As próprias famílias que moram em áreas de risco preferem ir para a casa de parentes ou amigos — resume Machado.