Minutos antes de o caixão com o corpo de Daner Hernandez Silva deixar a capela 3, onde estava sendo velado, para ser conduzido até a sepultura no Cemitério da Santa Casa de Misericórdia, no bairro Azenha, em Porto Alegre, uma salva de palmas tomou conta do local. Foi uma homenagem prolongada, intensa e marcante. O som de mãos batendo com força umas contra as outras ecoou pelos corredores e galerias do lugar.
A cerimônia de despedida do técnico de som — que morreu afogado aos 45 anos durante o temporal da última segunda-feira (15), após salvar a esposa, a sogra e três enteados da fúria das águas do Arroio Moinho, no bairro Aparício Borges — foi marcada por lágrimas e doces lembranças de dezenas de pessoas. Todos foram unânimes em definir o morador de Canoas, na Região Metropolitana, como alguém que “ajudava todo mundo.”
A irmã e funcionária pública Paola Hernandez, 40, estava incrédula com a forma como o irmão perdeu a vida. Nas lembranças, tentava amenizar a dor da perda.
— Este ato de heroísmo foi característico dele — reflete, com os olhos marejados.
A irmã conta que, quando o irmão ainda era criança, ia para a escola “para fazer festa e jogo de luz.”
— Era uma pessoa que gostava de estar rodeada pelos amigos e tinha muitos círculos de amizade — cita. — Sempre tirou do bolso para ajudar os outros, especialmente durante a pandemia.
Questionada sobre o legado do irmão, Paola destaca a solidariedade como principal característica dele:
— Sempre estendeu a mão ao próximo.
Sentimento semelhante é compartilhado pelos demais parentes.
— Era irmão de todos e não via maldade em nada. Tenho certeza que ele estava lá (local da tragédia) porque queria ajudar. Era humanitário — recorda a tia e microempresária Carla Hernandez, 50.
A prima e também microempresária Liviam Bueno, 42, estava bastante emocionada no velório. E revela o apoio que recebeu há muitos anos do primo.
— Tive depressão, e ele me ligava todos os dias. Era uma pessoa brilhante e tirava dele próprio para dar para os outros — lembra.
A ex-esposa e analista de recursos humanos Daniela Rodrigues, 41, com quem Daner teve duas filhas, também enaltece as virtudes do ex-marido:
— Sempre ajudava todo mundo.
Daner acabou arrastado pela água, junto à casa onde estava com outros familiares, para dentro do Arroio Moinho, próximo à Rua da Represa. O corpo foi localizado na manhã da terça-feira (16), próximo ao Anfiteatro Pôr do Sol. Seu gesto de amor e solidariedade o transformou em herói.
Conforme relatos dos familiares, os filhos (sete, somados os enteados) e a profissão eram suas grandes paixões. Desde pequeno, imitava DJs e estar reunido com os amigos era uma constante. Gremista apaixonado, Daner gostava de tocar flauta nos colorados pelas redes sociais. Muitos dos presentes na despedida desta quarta-feira (17) atuaram com ele no ramo de eventos e shows na Capital.
— Era uma pessoa muito ativa nas redes sociais. A gente debatia política e pensávamos diferente, mas o Daner sempre era respeitoso e inteligente — elogia o relações públicas Albano Gaddo, 45, que trabalhava com o colega em eventos, bares e festas.
Para Gaddo, o amigo era “alegre, brincalhão e muito aglutinador.”
O empresário de eventos Marcelus Trois, 35, não escondia as lágrimas nos olhos. Daner trabalhava como freelancer para Trois, que tinha agendado para o técnico em som um evento em Gramado nos próximos dias.
— Tinha um coração gigante — diz. — Durante a pandemia, encabeçou o movimento Graxa RS para ajudar as pessoas com doações de alimentos, roupas e até empregos. E ele mesmo não tinha comida, gás e móveis em casa — salienta Trois, dizendo que doou botijão de gás para o amigo naquela época.
A cantora Stephanie D’Agostin, 36, recorda que Daner a ajudou na carreira.
— Por eu ser mulher no meio de eventos, ele sempre trouxe amigos para perto e me protegeu. Sempre torceu muito por mim — relembra com carinho.
O herói Daner deixou inúmeros parentes e foi casado quatro vezes — todas as ex-esposas compareceram ao velório. Além da atual companheira, Alessandra Dornelles, deixou filhos, uma neta, a mãe, cinco irmãos, além de tios, primos e outros familiares. O pai já é falecido.