O som dos comentários bem-humorados e a flauta em dia de jogo do Grêmio não serão mais ouvidos pelos amigos e familiares de Daner Hernandez Silva, 45 anos. O técnico de som morreu na noite de segunda-feira (15), quando resgatava a esposa, a sogra e três enteados no bairro Coronel Aparício Borges, na zona leste de Porto Alegre, durante o temporal que atingiu o Rio Grande do Sul.
Daner foi arrastado pela força da água, junto à casa onde estavam, para dentro do Arroio Moinho, próximo à Rua da Represa. Após uma madrugada intensa de buscas, o corpo foi localizado por volta das 10h30min desta terça-feira (16), próximo ao Anfiteatro Pôr do Sol.
Morador de Canoas, onde passou o Dia dos Pais com suas três filhas e um filho do primeiro casamento, além da neta, ele havia retornado com a esposa, Alessandra Dornelles, para Porto Alegre na noite de domingo (14).
Ele estava sempre pensando nos outros. Deixava de comprar as coisas para ele para comprar para as filhas. Ele era a minha força. Eu perdi meu pai agora, no dia 24 de julho, e ele deixou de trabalhar para ficar do meu lado. Ele era o meu amor, era a minha vida. Tínhamos tantos planos
ALESSANDRA DORNELLES
Esposa de Daner
Alessandra conta que Daner havia trabalhado no domingo e passou a segunda-feira na casa dela. No fim do dia, levaram o carro dele ao mecânico juntos e, quando voltavam para casa, a chuva estava começando, mas a seguir se intensificou e já invadia o terreno logo após a chegada deles.
O casal se conhecia há 13 anos, mas eles começaram o relacionamento durante a pandemia. Alessandra o descreve como um “pai sensacional” e um “amigão”. Ela lembra que o marido sempre pensava no próximo e que era muito querido pelas pessoas.
Apoio da família
Nesta terça-feira, parentes e amigos de Alessandra se mobilizaram para apoiar a família. Enquanto alguns ajudavam na limpeza e reconstrução da casa, outros prestavam auxílio à mulher e às crianças. Todos são unânimes em tratar Daner como um herói.
A sobrinha de Alessandra, Esther Dornelles, 22, mora no mesmo bairro, mas em um local mais afastado do Arroio Moinhos. Ela conta que assim que a chuva de granizo parou, desceu correndo para ajudar a tia.
— Eu recebi a ligação da Mariana (uma das crianças resgatadas) dizendo que a água tinha levado o Daner. Quando cheguei, elas estavam todas sujas e disseram que não tinham mais visto o Daner — afirma.
Esther também ressalta que a atitude de Daner nunca será esquecida pela família.
— Ele foi um herói para nós, nunca esqueceremos disso. O Daner sempre tratou a minha tia como uma rainha e sempre cuidou das crianças também — destaca.
Quem reforça as ações positivas de Daner é Denilson Dornelles, cunhado da vítima. Segundo ele, Daner sempre esteve presente nos momentos bons e ruins da família.
— Nós perdemos nosso pai no mês passado, e o Daner nunca deixou de apoiar a Alessandra. Ele foi um guerreiro, salvou meus sobrinhos, mas é uma perda muito trágica, irreparável — lamentou.
Profissional e amigo querido
O empresário do ramo de eventos Marcelus Trois, 35, com quem Daner trabalhou durante 12 anos, lembra do amigo pela sua alegria e generosidade. Atuando na produção de eventos corporativos, eles viajavam por diversos locais do Estado. Daner era responsável por montar os equipamentos e operar a mesa de som. Algumas vezes, também trabalhava como DJ.
Trois comenta que Daner havia pedido folga para 3 de setembro porque teria a formatura de um afilhado em Porto Alegre. Ele lembra que, mesmo quando passou necessidades durante a pandemia de coronavírus, Daner seguiu participando das ações solidárias para ajudar as pessoas que mais precisavam. Por isso, o empresário considera que a forma como o amigo morreu traduz em atitude a pessoa que ele foi.
— Ele ter falecido salvando quatro pessoas não é algo que surpreenda porque ele era assim. Um cara de um coração gigante — sublinha.
Além da parceria nos eventos, Trois e Daner participavam do mesmo grupo de voluntários formado durante a pandemia para ajudar pessoas que precisavam de alimentos, roupas e até de empregos. Intitulado movimento Graxa RS, o grupo de voluntários se reuniu para arrecadar fundos para garantir um funeral digno ao amigo e auxiliar na reconstrução da moradia da família. Até as 19h30min desta terça-feira, o grupo já havia arrecadado mais de R$ 14 mil em doações.
Entre as muitas pessoas com quem interagiam nesses encontros estava o cantor e vocalista da banda Nenhum de Nós, Thedy Corrêa, que lamentou a morte de Daner e também ajudou na vaquinha feita pelos amigos.
— Era um cara muito competente, baita profissional e muito gente boa. Ele trabalhava eventualmente na operação de som nas minhas palestras, e sempre foi atencioso e dedicado. Uma tragédia perder um cara como ele dessa maneira. Com o passar do tempo, eu nem precisava olhar para o lado, pois ele já havia pego o tempo perfeito para entrar e sair com a trilha. A gente se divertia trabalhando juntos, pois ele gostava muito do que fazia — recorda Thedy.
Atos fúnebres
O funeral ocorrerá a partir das 3h desta quarta-feira, na capela ecumênica três, no Cemitério da Santa Casa de Misericórdia, na Avenida Professor Oscar Pereira, 423, no bairro Azenha. Inicialmente, o funeral seria na capela um, mas houve alteração para um local maior.
O cerimonial religioso de despedida está previsto para ocorrer às 10h30min, na mesma capela. O sepultamento deve ocorrer às 11h, no mesmo cemitério.