Aos 73 anos, Antônio Pacheco ainda se diverte trabalhando entre os clientes da Churrascaria Barranco, em Porto Alegre. O garçom mais antigo do restaurante da Avenida Protásio Alves, fundada em 1969, está lá desde 1984 e reúne memórias e um carinho especial pelos mais assíduos.
Em 38 anos trabalhando na churrascaria, Pacheco, como é conhecido, já atendeu nomes como Erasmo Carlos, Martinha e Wanderléa, além de políticos e jogadores de futebol. Mesmo assim, diz que não faz distinção entre famosos e anônimos, contando que conhece até os netos das pessoas que já vinham no passado e que seguem frequentando o espaço.
Revelando ser sua primeira entrevista, o simpático garçom revela que tem várias histórias dentro do restaurante. Uma delas foi um assalto há mais de 20 anos.
— Eu fiquei de refém por duas horas e meia na chuva com eles. E se tornou cômico porque os assaltantes disseram: "Pacheco, serve café para todos os teus colegas aí". E o meu chefe dizia que nunca na vida tinha tomado café com açúcar, e eu servi com açúcar e ele tomou. Depois ele contava que disse para os assaltantes: "Não são vocês que vão me fazer tomar café com açúcar". Mentira, tomou e nem sentiu! — relata Pacheco, entre risos.
O garçom lembra que os ladrões o colocaram, com mais cinco pessoas, dentro de um banheiro onde cabia apenas uma.
— Daí o Chico (Tasca, sócio do Barranco falecido em 2020) queria fazer o número dois no meio do assalto! Eu disse: "Não vai fazer, porque se nós não morrermos no assalto, vamos morrer sufocados aqui dentro!" — relembra Pacheco, em gargalhadas.
O funcionário diz ainda que já teve de acobertar muita gente comprometida das "incertas" dos cônjuges. Pacheco conta que há duas décadas era comum maridos e esposas serem flagrados com amantes dentro do Barranco.
— Pegavam no flagra e a gente tinha de escoltar e fazer barreira para tirar um e o outro não ver — confessa ele, dizendo que só acobertava para "evitar encrenca".
Hoje, Pacheco diz que a situação é mais calma e que a temporada de "caça" ficou no passado. Sobre as celebridades que passaram pelo Barranco, o garçom admite que queria tirar foto com uma pessoa: o cantor e ator Moacyr Franco, que um dia apareceu na casa.
— Só que eu não tinha celular, nem máquina na hora, então não consegui tirar a foto — diz ele, conformado.
Pacheco conta que havia um cachorro grande que costuma passar pelas mesas pedindo petiscos aos clientes. Segundo ele, o cão era tão persistente que até em dias de chuvas batia no vidro pedindo para entrar.
— Ele colocava as mãozinhas na mesa e pedia comida. Um dia, tinha uma senhora com um casaco de pele muito bonito, e ela não deu nada para ele. Daí ele deu a volta, levantou a perninha e fez xixi no casaco dela — comenta, rindo.
Dia do garçom
Pacheco lembra ainda que, anos atrás, passava trabalho no 11 de agosto, conhecido como o "dia do pendura". Na época, havia uma tradição nesta data, quando se comemora o dia do advogado. Restaurantes, como o Barranco, convidavam os profissionais para fazer suas refeições sem pagar, por serem os homenageados. Mas o costume se disseminou tanto e atraia tanta gente que, mais tarde, os proprietários de estabelecimentos preferiam fechar no dia. O dono da churrascaria, Elson Furini, 74 anos, lembra que a brincadeira virou um prejuízo dos grandes.
Então o Sindicato de Hospedagem e Alimentação de Porto Alegre e Região (Sindha) decidiu instituir o dia do garçom na mesma data. E assim criaram uma competição entre os funcionários de vários restaurantes de Porto Alegre. A Redenção virava palco de uma competição que decidia quem conseguia correr mais rápido carregando bandejas com copos cheios ou equilibrando ovos em colheres.
— Era uma disputa alegre e eram premiados os garçons que chegavam mais rápido até o final sem ter derrubado nada — comenta Furini.
Com o bom humor das histórias, o garçom mais antigo do Barranco se despede para se preparar para mais uma jornada de trabalho. Acompanhando a conversa , o proprietário Furini emenda um elogio:
— Ele é disputado entre os clientes.