Um caso recente e marcante de troca de denominações de logradouros em Porto Alegre é o do Largo Zumbi dos Palmares, na Cidade Baixa. O local era conhecido como Largo da Epatur, em função da presença da sede da antiga Empresa Porto-Alegrense de Turismo. A Lei 9035/02, de autoria do então vereador Raul Carrion, denominou oficialmente o espaço como Largo Zumbi dos Palmares, em homenagem ao líder quilombola brasileiro.
— Trata-se de um lugar que representa a afirmação da identidade brasileira. Coloca a etnia de origem africana no patamar das demais etnias que compõem o nosso mosaico cultural —observa o professor Maturino Luz, do curso de Arquitetura e Urbanismo da Escola Politécnica da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
A região, conhecida no passado como Emboscada, era coberta por denso matagal, onde os escravos fugitivos se escondiam dos perseguidores e organizavam, como o nome diz, emboscadas. Nos anos 1970, o lugar funcionou como ponto de encontro dos militantes da causa negra. Atualmente, abriga manifestações em períodos de eleições, comícios, feira livre e rodas de capoeira. Mas a antiga referência ainda é lembrada.
— Sempre conheci como Largo da Epatur. O Zumbi veio depois, não é muito antigo — comenta o servidor público Jorge Meier, 55 anos, que é natural de Santa Maria, mas mora nos arredores do Largo há 23 anos.
O morador da região cita as feiras que acontecem no espaço, os atos políticos e os encontros dos jovens.
— Aqui é o point. A concentração dos jovens acontece no Largo da Epatur.
O historiador Charles Monteiro, professor da PUCRS e autor do livro Breve História de Porto Alegre, explica o porquê de alguns lugares serem denominados de formas populares pela população, já que Largo da Epatur nunca foi um nome oficial:
— Existe uma relação entre o evento que deu o nome ao espaço, logradouro, praça ou rua, pelos nomes antigos ou expressões populares. Significa a existência de uma ligação com a memória coletiva. Ocorre um casamento do espaço com o significado que ele tem com o corpo coletivo.
A vereadora Laura Sito (PT) destaca a relevância do Largo Zumbi dos Palmares para a perpetuação da história negra na Capital:
— A importância é central na identidade da memória negra na cidade. O Largo Zumbi dos Palmares é um espaço de convergência cultural da cidade. A área, assim como outras e o Mercado Público, está muito identificada com o papel do negro no desenvolvimento econômico e social da Capital.
A vereadora Karen Santos (PSOL) também percebe o largo como um lugar de manifestações pela liberdade.
— O Largo Zumbi dos Palmares é referência para os movimentos sociais na resistência e na luta pela liberdade. Há 20 anos, recebeu o nome do líder quilombola em forma de homenagem, sendo também um local marcado pela histórica presença do povo negro nessa região. Povo que enfrentou um processo de expulsão, ainda hoje em execução, para as periferias da cidade, escancarando um projeto de cidade baseado na segregação. O espaço do largo é marcado por diversas manifestações de resistência, feiras ecológicas e espaços de cultura. Nesse sentido, é fundamental pensarmos a defesa de nossos territórios, a luta por nossos direitos e qual cidade queremos — reflete.
Lembranças anteriores à extinção
A ex-funcionária da Epatur Heloisa Leite Assis, 67, trabalhou durante 19 anos na empresa. Ficou lá até o ano 2000, quando a Epatur foi extinta. Na avaliação da atual profissional da área de licenciamento de eventos da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo (SMDET), as pessoas ainda se referem ao local pelo nome não oficial pela força da própria Epatur e pela área ser central, e sempre servir de ponto de concentração para diversos eventos realizados na cidade.
— O Largo da Epatur era chamado dessa maneira por ser em uma área central e ter carnaval forte, feiras, e havia até um projeto antigo para o Largo da Epatur ser um terminal turístico. Muitas atividades aconteciam naquela área, e a Epatur era o cartão de visitas de Porto Alegre — recorda.
Conforme salienta, a Epatur tinha um variado leque de funções. Por isso, tornou-se uma marca muito forte e que ainda persiste no imaginário da Capital.
— A Epatur recebia comitivas de outros lugares e países, presidentes, organizava apresentações, carnavais e eventos na cidade ou em hotéis. E tinha postos dentro da prefeitura para dar orientações sobre o turismo. As pessoas gostavam muito de trabalhar na empresa — conclui.