A enfermeira Liziane Vendruscolo, 50 anos, estacionou o carro em frente a uma das megalojas de móveis da Avenida Ipiranga, na esquina com a Frei Germano, em Porto Alegre. Precisava comprar uma escrivaninha e não pensou em outro lugar para essa missão.
— Já comprei cadeiras aqui outras vezes, do outro lado da rua. Sei que, por aqui, você vai encontrar o que procura — justifica.
Porto Alegre ano 250
Porto Alegre completa 249 anos neste 26 de março ainda sob impacto da pandemia do coronavírus. Para o Grupo RBS, a data também marca o início da contagem regressiva para os 250 anos que serão completados no ano que vem. Assim, mensalmente, até o aniversário de quarto de milênio da Capital, publicaremos em Zero Hora e GZH conteúdos que abordarão aspectos fundamentais na tentativa de entender a formação de uma identidade porto-alegrense. As reportagens vão tratar a Porto Alegre das ruas, das pessoas, do futuro, da cultura, do empreendedorismo e das paixões. Esses conteúdos vão lançar um olhar para trás, como forma de compreender o que nos trouxe até aqui, retratar o presente e projetar o amanhã da Capital, sempre com foco voltado a aproximar nosso público da cidade que escolheu viver.
Móveis estão para a Ipiranga assim como os carros estão para a Sertório, os armarinhos, para a Pinto Bandeira e os cemitérios, para a Oscar Pereira. Na Rua Professor Freitas e Castro, bairro Azenha, há quase 20 lojas dedicadas ao conserto de veículos.
— Se a gente não tem aqui, indica o vizinho. Tem que se ajudar — diz Paulo Martins, 73 anos, gerente de uma loja de autopeças que tem mais de 50 anos.
São ruas especializadas da Capital, conhecidas por determinado serviço ou comércio. Não é coisa nova. Na verdade, já esteve mais em voga, explica o fundador e conselheiro da Associação Gaúcha para o Desenvolvimento do Varejo (AGV) e ex-presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) Vilson Noer.
A concentração de um segmento em ruas específicas, chamada de cluster (“agrupar”, em inglês) era mais forte antes do surgimento dos shoppings centers, conta Noer. As ruas especializadas que a gente vê hoje em Porto Alegre são as remanescentes.
— Muitas lojas dos clusters migraram para os shoppings, enfraquecendo esse tipo de comércio — relata.
A Riachuelo, no Centro Histórico, já teve mais livrarias, e a Xuvisko, com seus 51 anos, é uma sobrevivente da Rua da Pizza, como era conhecida a Avenida Cristóvão Colombo nos anos 1990. Se hoje o final da Ipiranga é referência para móveis em razão dos grandes galpões, essa alcunha já pertenceu à Osvaldo Aranha há umas três décadas, lembra Noer.
A concorrência é a chave do sucesso para as ruas especializadas, e é o que faz mais comerciantes se juntarem aos polos. Para que o cliente tenha a garantia de que, se não encontrar o que quer na loja dele, sem precisar caminhar muito, vai encontrar no comércio ao lado – e vice-versa.
Proprietário de um comércio de instrumentos musicais da Coronel Vicente, Dalton Dorneles Guerra viu com preocupação o fechamento recente de lojas na região. Especialmente a mais antiga de todas, a Mil Sons, que tinha a última unidade na loja acima da sua. Cogitou até sair se houvesse mais encerramentos de lojas do segmento.
Pior do que perder a venda, diz ele, é o cliente ir até o centro de Porto Alegre especialmente para comprar seu instrumento e voltar para casa de mãos abanando.
— Para mim, quanto mais concorrente aqui, melhor — diz Dalton.
Conheça quatro ruas temáticas da Capital: