Das 684 praças urbanizadas de Porto Alegre, 40 são cuidadas de perto por cidadãos que se propuseram a melhorar o espaço público de lazer e convivência. O projeto de parcerias da gestão municipal que nomeou prefeitos voluntários completa seis meses nesta sexta-feira (17). Da extensa e tradicional Redenção à acanhada e discreta Praça Walter Shultz, vizinhos mobilizam redes de apoio aos recantos verdes da Capital.
Conhecedor dos 40 hectares do Parque Farroupilha há 64 anos, o economista aposentado Roberto Jakubaszko, 71, não passa um dia sem correr ou caminhar pelo local. Ele é um dos fundadores do Conselho de Usuários da Redenção, que em 2022 comemora 50 anos e junta cerca de 200 membros, segundo Jakubaszko.
— Se algo grave acontece durante a madrugada, pela manhã algum frequentador ou vizinho do parque me liga para contar. A rede de comunicação é muito atuante — garante, complementando: — A gente já trabalha assim pelo bem deste parque há anos, agora temos a responsabilidade da prefeitura conosco.
Entre saudações de amigos corredores que passam por ele e comentários sobre a evolução da flora do parque ao longo das décadas, Jakubaszko enaltece a busca da atual gestão municipal ao diálogo e presença na comunidade.
A reportagem de GZH acompanhou o prefeito da Redenção na sua caminhada matinal nesta sexta (17). Ele relembra os anos 2000 como a melhor época do parque, quando famílias ocupavam os gramados com mais segurança do que atualmente. A fala vai ao encontro do relato da secretária municipal de Parcerias, Ana Pellini, que avalia positivamente os seis primeiros meses do programa da gestão de Sebastião Melo na Capital.
— O caminho para melhorarmos o espaço público é transformar a comunidade em dona dele. Já estamos vendo que, onde há prefeito das praças, o lugar está melhorando — comenta Ana, destacando a dificuldade de manter os espaços imunes ao vandalismo.
O tradicional conselheiro da Redenção nomeado prefeito em junho de 2021 lamenta as pichações no Recanto Europeu e comenta a desigualdade social que leva pessoas a dormirem nos espaços cobertos da Redenção, sempre se posicionando contra o cercamento físico da área.
— Estão buscando um abrigo. Ao mesmo tempo, a prefeitura também oferece o que pode, mas não consegue impedir que eles abusem deste espaço público. É um tema em que há carências dos dois lados — pondera Jakubaszko.
O diretor de parcerias comunitárias da secretaria, Pedro Meneguzzi, explica que a ideia é devolver o sentimento de cidadania e pertencimento das pessoas aos locais de lazer. Além, é claro, de diminuir o custo empregado pela gestão municipal na manutenção de parques e praças.
— Percebemos que se estava perdendo o sentimento de pertencimento das pessoas com a cidade. A manutenção desses espaços é um trabalho da prefeitura, sim, mas facilitar a adoção ajuda as pessoas a entenderem que isso é de todo mundo. Os prefeitos são cidadãos que sempre foram engajados na comunidade e cobram ações da prefeitura — diz o diretor.
Novas cores
No bairro Vila Ipiranga, a Praça Walter Shultz é outra que recebe a ajuda dos moradores desde antes do programa de prefeituras ser oficializado pela gestão municipal. A advogada Lisiane Maia Camargo, 41 anos, se mudou para a região há dois anos e meio. Na pandemia, viu que a filha de 11 e o filho de cinco precisavam do espaço para brincar. Ela e o marido começaram a tentar melhorar a estrutura por conta própria.
— Desde a gestão passada, do prefeito Nelson Marchezan, tento autorização para pintar e fazer melhorias. Não me responderam. Com a nova gestão segui insistindo, e me retornaram em alguns meses — conta Lisiane.
O investimento em pintura e jardinagem é feito do próprio bolso, enquanto serviços de capina geral, iluminação e coleta de lixo são pedidos por ela e atendidos por equipes da prefeitura com agilidade, diz:
— Este bom exemplo de não esperar as coisas acontecerem e ir fazer por si é o melhor legado que podemos deixar para nossos filhos.
Lisiane foi uma das últimas prefeitas voluntárias que tomou posse, no dia 11, e comemorou o cargo simbólico pintando a praça. Ela conta que depois de cerimônia na Praça 20 de Maio, no mesmo bairro, recebeu a visita do prefeito Sebastião Melo enquanto finalizava a aplicação de tinta nos brinquedos e canteiros de planta da área administrada. A advogada quer fazer um natal comunitário na praça, mas lamenta a pouca adesão dos vizinhos.
A secretária Ana Pellini espera que, com os bons exemplos como o de Lisiane, os porto-alegrenses se sintam cada vez mais motivados a seguirem como prefeitos. A parceria entre prefeitura e voluntários tende a aumentar em 2022: segundo ela, dezembro se encerra com cerca de 60 candidatos a prefeituras de praças que ainda não foram incluídas no programa. Para o próximo ano, haverá a contratação de um servidor específico para organizar um cronograma de acompanhamento mensal de cada praça com prefeito.
— Fazemos reuniões de acompanhamento e são inúmeras as dificuldades encontradas. Estamos planejando para o primeiro semestre de 2022 um cronograma bimensal de visitas para as praças, mostrando que o poder público segue acompanhando os prefeitos das praças — projeta a secretária.
Diferentes níveis de engajamento
Marivane Anhana, 58 anos, administradora aposentada, se mudou para o Centro Histórico quando o filho nasceu, há 26 anos. Desde então, frequenta a Praça Brigadeiro Sampaio, no final da Rua dos Andradas, e atua pela conservação do local que serviu de pátio para as brincadeiras em família.
Ela conta que já organizou obras nas calçadas e não esconde a frustração com a dificuldade de fazer a correta manutenção do espaço, mesmo com o apoio da gestão municipal como prefeita voluntária.
— Pintamos os brinquedos e eles são pichados. Plantamos várias mudinhas e roubam. Precisamos de uma mudança cultural urgente. Tentamos pedir para a prefeitura e governo campanhas de conscientização neste sentido, mas elas não aconteceram — relata.
— Nós, moradores do Centro Histórico, raramente temos pátio, então a praça acaba sendo nosso espaço de lazer. Aos finais de semana, no entanto, várias tribos acabam vindo aproveitar, mas nem sempre com a mesma ideia de lazer, e aí acabamos tendo problema com sujeira ou som muito alto, por exemplo — complementa.