O prefeito de Porto Alegre Sebastião Melo compareceu à sessão ordinária desta segunda-feira (31) da Câmara Municipal para defender, frente aos vereadores, o projeto de emenda à Lei Orgânica que reforma a previdência dos servidores municipais. Porém, os atos e falas dos integrantes do governo demonstravam, desde o início, que o Executivo não tinha os 24 votos necessários para aprová-la.
A começar pela primeira ação do líder do governo Idenir Cecchim (MDB), que protocolou o projeto que aumenta as alíquotas previdenciárias de 14% para até um teto de 22% e incluir servidores inativos. Tratava-se do plano B do governo Melo caso o projeto de reforma naufragasse. Para aumentar a alíquota, são necessários 19 votos, margem mais confortável para o governo.
O prefeito abriu sua fala citando governos do PT que fizeram a reforma da previdência – da Bahia e do Piauí – para argumentar que não se trata de uma medida ideológica. Em seguida, citou as reformas prévias nas esferas federal e municipal e comparou obras públicas aos gastos do Tesouro Municipal para cobrir o déficit. Pelos cálculos da prefeitura, a previdência custa R$ 3,5 milhões ao dia ao caixa municipal.
Melo fez ainda questão de citar nominalmente os vereadores Airto Ferronato (PSB), Cláudia Araújo (PSD) e a bancada do PDT – composta pelos vereadores Mauro Zacher e Márcio Bins Ely – como decisivos para que o projeto tivesse emendas com mudanças para tornar a transição dos servidores do antigo regime para o nome mais suave. Seriam quatro votos ainda relutantes e decisivos para o governo aprovar o projeto.
— Foram-se os anéis, foram-se os dedos. E a reforma, se for mais do que isso, seria o que muitas entidades querem: reformar para não reformar — declarou Melo.
Frente ao projeto inicial, o governo estendeu benefícios da reforma para servidores ingressos até 2003 que inicialmente, seriam para ingressos até 1998 e passou a calcular a aposentadoria como a média da 90% das contribuições em vez de 100%. Outro ajuste diminuiu, conforme a proximidade da aposentadoria, o chamado “pedágio” dos servidores: o tempo que eles que teriam de trabalhar além da idade mínima para poder se aposentar.
Na tribuna, Cláudia declarou apoio ao projeto. Sem o PDT, Ferronato seria o voto de minerva. O vereador, que participava da sessão por vídeo, foi o último a se manifestar e fez uma fala curiosa. Apresentou um vídeo mostrando as evoluções do projeto após a negociação das emendas, mas ao final declarou que votaria contrário por orientação das entidades dos servidores públicos.
— A vereadora Cláudia disse que temos a obrigação de aprovar o projeto. Tenho a obrigação é de não ser traidor de uma causa que eu luto e apoio há 32 anos na Câmara. Não seríamos o 24º voto, portanto meu voto será não – manifestou Ferronato.
A fala levou o líder do governo, vereador Cecchim, de volta à tribuna para acusar Ferronato de “homofobia em relação ao número 24” e dizer que apresentaria o contracheque do colega como ex-funcionário da Fazenda. Deu-se um bate-boca até que Melo voltou à tribuna. O prefeito tentou contemporizar. Declarou respeitar a democracia e prometeu empenho no projeto para aumentar as alíquotas. Como já fizera anteriormente, falou ainda que salários poderão ser parcelados a partir de outubro se nenhum projeto for aprovado.
Como o projeto não chegou a ser votado, o governo Melo tem dois caminhos: voltar à mesa de negociações, sobretudo com os vereadores do PDT, ou buscar uma vitória mais tranquila no aumento das alíquotas, que também enfrenta rejeição dos servidores por incidir sobre os atuais rendimentos. Uma aposta é que, ao perceber que o remédio provisório contra o déficit é pior do que a reforma em si, que os vereadores voltem a considerar o projeto que muda o regime de previdência em definitivo.
Manifestação
Enquanto Melo discursava no plenário Otávio Rocha, municipários contrários às mudanças na previdência realizaram um protesto em frente à Câmara Municipal. As galerias do plenário estão fechadas em razão da pandemia. No início da tarde, o grupo se concentrou próximo ao portão de acesso ao estacionamento do local, na Loureiro da Silva.
Cartazes e faixas criticavam o prefeito e alguns vereadores. O grupo também usava um carro de som e instrumentos de percussão para proferir cânticos contra Melo. Além disso, quando um parlamentar contrário aos municipários passava pelo grupo, era vaiado. Já outros eram aplaudidos e saudados.
— Desde o ano passado estamos criticando isso, inclusive na Justiça. Hoje é um dia importante porque ele (Melo) está aí, e ainda não tem total apoio dos vereadores — declarou a servidora Luciane Pereira, integrante da diretoria do Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (Simpa).
Logo após, o grupo deixou o acesso ao estacionamento e se deslocou até ao pórtico de entrada do pátio da Câmara. A Brigada Militar e a Guarda Municipal acompanham o ato.