O sonho da casa própria está alguns meses mais longe para os moradores da Vila Valneri Antunes. A ocupação, na zona norte de Porto Alegre, fica numa área do Parque Chico Mendes, no bairro Mario Quintana. Conforme o Departamento Municipal de Habitação (Demhab), são 130 famílias cadastradas, além de seis edificações sem moradores, que estão sob análise para saber se há proprietário dos espaços e, consequentemente, mais famílias a serem transferidas.
Em setembro passado, o governo municipal iniciou o reassentamento, com a ideia de que o processo fosse concluído em pouco tempo. Entretanto, meio ano depois, somente 32 famílias já se mudaram para o novo lar, no loteamento Irmãos Maristas, a menos de dois quilômetros do parque. O empreendimento imobiliário é o mesmo que recebe as famílias da Vila Nazaré.
O grande problema na demora das mudanças é a condição dos locais que ficam para trás e das próprias residências que ainda estão sendo ocupadas. Há alguns anos, os moradores da Valneri Antunes têm conhecimento de que precisariam deixar a área. Por isso, investir no espaço tornou-se desperdício. Desde o anúncio oficial de que o reassentamento iniciaria, em setembro de 2020, os reparos cessaram de vez. Porém, as mudanças só iniciaram em dezembro e logo pararam.
Nessas idas e vindas, a porteira Ana Lúcia Carvalho Mendes, 28 anos, tem vivido um desafio diário. Ela mora em uma área da ocupação em que outras casas já foram retiradas. Os restos de imóveis, o mato crescendo e a dificuldade para manter a casa habitável representam risco para ela, que está grávida de dois meses, e o filho Maicon, oito anos. Próxima de um valo, a região também acaba sendo alvo do descarte irregular de lixo. Recentemente, uma cobra invadiu a residência.
– O Demhab me procurou em 2019. Ficaram de fazer uma vistoria na minha casa, mas eu trabalho todo dia, não consegui recebê-los da primeira vez. Desde então, parece que me descartaram, só mandam esperar – lamenta ela.
Em fevereiro, Ana diz que sua documentação foi reenviada para a Caixa Econômica Federal (CEF), que é quem libera os moradores para irem aos novos apartamentos via Minha Casa Minha Vida (MCMV). A ocupação do Irmãos Maristas ocorre em fases (I, II e III), cuja coordenação cabe ao Ministério do Desenvolvimento Regional e à Caixa. Conforme o Demhab, a responsabilidade do departamento é “apenas gerenciar quem vai ocupar qual imóvel após a liberação desses órgãos”.
A irmã de Ana passa por uma situação parecida. Dona de casa, Ana Paula Carvalho Mendes, 30 anos, divide espaço com o marido e quatro filhos. A família também espera um retorno do Demhab para conseguir se mudar e ocupar um dos apartamentos do Irmãos Maristas.
Grupo de moradores quer ficar no local
O Demhab explicou que documentação de Ana Paula está aprovada e ela será chamada para participar do sorteio da unidades do Irmãos Maristas no final deste mês.
Já em relação ao imbróglio vivido por Ana Lúcia, o departamento diz que ela não foi reconhecida como moradora do Parque Chico Mendes, em 2018. Segundo o departamento, ela compareceu, em dezembro de 2020, no CRIP (atualmente chamado de Prefeitura no Bairro) “para solicitar reconhecimento de uma edificação que foi considerada como desocupada pelo Demhab, mas da qual ela alega ser a titular”. Somente a partir desta data é que seu processo começou a tramitar.
Neste momento, a situação depende de análise da Caixa sobre adequação aos critérios do MCMV. Se for entendido que Ana é a dona da casa e de que tem direito ao apartamento no Irmãos Maristas, “o Demhab compromete-se a agilizar, dentro do possível, o processo de mudança dela”.
No dia 7 de abril, o secretário de Habitação e Regularização Fundiária, André Machado, e a adjunta, Simone Somensi, visitaram o Parque Chico Mendes e conversaram com moradores que vivem na área ocupada fora do parque. Eles solicitaram análise sobre a possibilidade de permanecerem na região e que seja feito um processo de regularização fundiária. O Demhab diz que “a questão está em análise internamente na prefeitura e envolve 23 famílias”. Será necessário um laudo técnico que ateste que não há risco para as famílias permanecerem no local.
Transferências a partir de maio
Segundo o Demhab, o processo de transferências foi retomado nesta semana, com 17 famílias tendo suas mudanças agendadas para o início de maio.
Mas qual a razão da demora? O Demhab explicou, em nota, que em 2020, quando houve o sorteio e escolha das unidades, a maioria das famílias do Parque Chico Mendes escolheu apartamentos da fase III do Irmãos Maristas – ou seja, a última que seria liberada para moradia. Conforme o departamento, a principal razão alegada pelos moradores foi que “os imóveis ficam mais distantes dos demais blocos, ocupados, em sua maioria, por moradores da Vila Nazaré”.
A ocupação dos imóveis da fase III só foi autorizada pelo MDR e pela Caixa em janeiro deste ano. O processo se iniciou pelas casas, que são destinadas a idosos e PCDs da Vila Nazaré.
Parte da fase III, os apartamentos da quadra H foram liberados para ocupação no mês passado. As mudanças, porém, só são realizadas quando a prefeitura se certifica de que as ligações de água e luz estão feitas. Por isso, em função dos trâmites internos para essas ligações, as mudanças foram retomadas somente nesta semana.
Conforme o Demhab, quem optou por imóveis das quadras A, B e E ainda terá que aguardar mais algumas semanas, pois falta a liberação da ocupação desses apartamentos.
Além das 17 famílias que já podem se mudar, outras que aceitaram alterar a escolha de imóvel e se mudarem para a quadra H, agilizando o processo, estão com sua transferência agendada. Outras 17 famílias, incluindo a de Ana Paula, já têm suas documentações aprovadas no Demhab e aguardam novo sorteio, que deve ocorrer até a semana que vem.