A cena do homem caminhando por bairros centrais de Porto Alegre acompanhado de até oito cães — todos muito bem comportados — chama atenção de quem passa por Tarlison Suello, 43 anos. Algumas pessoas pensam que ele é o tutor de todos os cães, tamanha a obediência dos bichos, que caminham lado a lado, fazem brincadeiras e eventualmente ganham biscoitos, que devoram rapidamente. Mas, na verdade, as caminhadas com os caninos são o ofício e o ganha pão dele. Tarlison é um passeador de cães.
A paixão pela profissão surgiu num dos momentos mais difíceis da vida dele. Após 13 anos trabalhando em uma multinacional, tendo ocupado vários cargos, ele estava cansado da sua rotina. Saía cedo para o escritório e voltava tarde, sem conseguir dar a devida atenção ao seu cão, Jimi Hendrix. O linguicinha só passeava antes de o dono ir para o seu trabalho e uns minutinhos depois.
— Chegou uma época em que era tanto estresse que eu já não estava conseguindo levantar da cama para trabalhar. Segundo o psicólogo que eu procurei na época, era um início de depressão, e eu deveria mudar a minha vida. Foi então que me caiu a ficha de que eu precisava mudar. Ter mais qualidade de vida, e que o Jimi fosse beneficiado também, pois ele passeava 30 minutos antes de eu ir trabalhar logo cedo e à noite, após eu voltar para a faculdade. Era muito tempo para um cão ficar sozinho — recordou.
Em uma viagem para a Argentina, o rapaz viu um paseador de perros em uma praça em Buenos Aires e se encantou. Mas o desejo só saiu do papel quando um professor da faculdade sugeriu um exercício em que os alunos deveriam abrir uma empresa e, casualmente, citou os passeadores. Era o empurrão que faltava para ele deixar a vida antiga.
Com pouco dinheiro e muita coragem, Tarlison pediu as contas, fez cursos de qualificação para passeador e adestrador em São Paulo e abriu a sua empresa, a Patas na Rua. O início foi difícil. Era verão e o serviço mais procurado, à época, era o de hospedagem. Mas ele persistiu e, em seguida, conseguiu seus primeiros clientes. Hoje ele cuida de 34 cães e já atua na área há quase oito anos.
Atualmente, Tarlison tem uma rotina puxada, mas já não se sente estressado psicologicamente. Começa às 6h30min e para de trabalhar só por volta das 20h, depois de caminhar cerca de 30 quilômetros por dia com os cães dos clientes, além de cuidar dos seus próprios.
— Sofri muito preconceito porque me diziam que eu iria trabalhar juntando fezes de cães. Percebi a besteira que falavam quando a grana começou a entrar, a qualidade de vida melhorar e só felicidade vir. Já passaram por mim mais de cem cães, sem nunca, mas nunca mesmo, perder um sequer, exceto por necessidade de mudança de endereço deles ou por falecimento dos peludos — garantiu.
No último domingo (21), o seu grande amigo Jimi morreu. Além de muito amor ao longo de 13 anos juntos, foi ele quem fez seu tutor despertar para uma mudança de vida, que se tornou mais saudável. Tarlison recorda com carinho dos momentos que viveram juntos e faz uma promessa:
— A relação foi muito boa. Foi um baita incentivador meu. Foi por ele que eu conheci a profissão. Foi por ele que eu me dediquei esses anos todos. E é por ele e por todos os novos cães que eu vou continuar com a minha atividade.
Ouça a entrevista de Tarlison ao Gaúcha Hoje, da Rádio Gaúcha: