Enquanto na Rua Dom Pedro II , point da década de 1990 em Porto Alegre, as casas noturnas cresceram surfando, principalmente, em sucessos musicais, a poucos metros dali, um vizinho igualmente famoso virou referência na região explorando um universo nada mainstream. Inaugurado no fim dos anos 1980, o Fim de Século, na Avenida Plínio Brasil Milano, reunia diferentes tribos em torno da cultura underground.
— Era um bar alternativo. Na época, tocava Bauhaus (banda inglesa gótica), que ninguém sabia o que era. Os DJs entendiam muito de música. Conseguiam discos com amigos que traziam de fora, coisas demoravam pra chegar no Brasil — recorda Roberto Nami, o Batata, um dos sócios do local.
O clima descontraído do lugar colaborava para deixar quase qualquer um à vontade. Todos os funcionários eram amigos dos sócios, e curtiam o expediente também como lazer. Punks e góticos (vários deles habitués dos bares na Avenida Osvaldo Aranha) estavam entre os principais clientes. Mas, por ficar aberto até de manhã, o Fim de Século também “herdava” com frequência o público do Bar Ocidente e os “mauricinhos e patricinhas” das baladas da Dom Pedro II.
O que é o jornalismo de engajamento, presente nesta reportagem?
É uma prática jornalística que coloca o público como protagonista da notícia, criando uma troca positiva e impactante na comunidade. Queremos abrir ainda mais espaço para que você, leitor, possa participar da construção do nosso conteúdo desde a concepção até o feedback após a publicação.
Como engajamos o público?
Convidamos nossos leitores a participarem da construção do conteúdo pelas redes sociais, monitoramos o que é discutido nos comentários das matérias e publicamos formulários que dão espaço a dúvidas e sugestões.
Diferentemente de outras casas, que impunham regras de vestuário, não havia traje adequado para ir às festas, tampouco preconceito contra qualquer tipo de manifestação de afeto.
— Eu sempre gostei de dançar, de música, mas nasci em Alvorada, vinha de um mundo diferente. Sempre digo que no Fim de Século todo mundo falava a mesma língua, que era a língua da diversão. Foi o primeiro lugar que eu vi o público gay, e era uma coisa natural — conta o DJ Lê Araújo, que comandou as noites do Fim de Século entre 1991 e 1993.
Araújo atuou como atendente no bar antes de se tornar DJ. Já animava a noite dos frequentadores. No primeiro dia de trabalho, subiu em um freezer para mostrar suas habilidades como dançarino. O público curtiu, e, em uma ausência do DJ oficial, ele foi convidado a assumir o som mecânico.
Na década de 1990, o Fim de Século também se tornou uma casa de shows alternativos. O primeiro deles, do roqueiro Julio Reny, atraiu público a ponto de os sócios terem de impedir o acesso. Passariam por lá nomes como Bebeto Alves, De Falla, Cascavelletes, Maria do Relento, TNT, Ultramen e Graforreia Xilarmônica.
Aos poucos, no entanto, o local foi adotando uma vertente mais popular. Chegou a funcionar como um bar de samba e pagode, o Kizomba, e, já nos anos 2000, deu lugar a Neo — hoje, o imóvel abriga uma escola de balé. Para Batata, que hoje vive em Camboriú, a pá de cal na noite da Plínio foram menos as mudanças de perfil da noite do que da própria cidade. Com as ruas mais inseguras, cada vez menos pessoas se dispunham a circular de madrugada, migrando de uma casa noturna para outra.
— Acho que o acabou mesmo (com o bar) foi a violência. Naquela época, as pessoas andavam a pé, saíam do Bom Fim e iam até o Fim de Século. Depois começaram a surgir gangues, assaltos. As pessoas não queriam mais se expor — diz.